Prof. Ronaldo, gostaria de tirar umas dúvidas.
Ontem a noite estava atendendo meu último paciente do dia quando surgiram umas dúvidas.
Em casos de lesão periapical extensa já é sabido que não há a necessidade de se fazer trocas e mais trocas de medicação intracanal por meses até que se observe radiograficamente regressão da lesão. Quando não tiver mais sinais de infecção como dor espontânea, presença de exsudato purulento, fístula ativa, aumento de volume e dor à percussão ou palpação, podemos realizar a obturação.
Pois bem. Estou tratando o dente 11 de um paciente cuja lesão periapical é extensa, sem sintomatologia espontânea, à percussão ou palpação e sem aumento de volume. Na primeira sessão, no dia 27 de agosto, realizei o acesso, penetração desinfetante, determinação do comprimento de trabalho pelo localizador apical eletrônico e instrumentação(#80;20,5mm) com posterior limpeza de forame(#55;23mm). Não fiz medicação intracanal pois fiquei com receio dele sentir dores devido ao exsudato persistente que não teria pra onde ser drenado, a não ser para dentro do canal. No dia seguinte instrumentei até a lima #90, fiz remoção de camada residual e, mesmo assim não consegui secar o canal para realizar a medicação por causa do exsudato purulento persistente. Sei que não é uma conduta preconizada por você (eu também não concordo e não faço como rotina), mas deixei o dente aberto apenas com uma bolinha de algodão na entrada do canal. No dia seguinte (29 de agosto) fiz nova remoção de camada residual e finalmente a medicação intracanal. Ontem realizei a troca de medicação. Não havia dor espontânea, à percussão ou palpação e nem aumento de volume. Removi a medicação e, quando sequei não observei exsudato. Mas aí surgiu uma curiosidade: como existia a possibilidade da medicação ter obliterado o forame, lógico que não haveria drenagem para dentro do canal. Então fui no forame mais uma vez com a mesma lima e medida da primeira vez(#55;23mm). Quando me deparei com uma drenagem abundante de exsudato. Tentei secar, mas não consegui. Coloquei a agulha de irrigação aspirando dentro da lesão e, mesmo assim não consegui secar. Então instrumentei o forame até a lima #90 em 23,5mm (lembrando que o comprimento de trabalho está em 20,5mm). Observei uma diminuição da drenagem do exsudato. Foi quando inseri a medicação.
Minhas dúvidas são as seguintes:
– Como não observei sinal ou sintoma de infecção ao remover a medicação, poderia muito bem ter obturado. Não faço isso, pois prefiro fazer mais trocas nestes casos de lesão extensa. Se eu tivesse feito a obturação do canal, com quase certeza não obteria sucesso nesse caso. E nos casos onde não voltamos nos forames com as limas que realizaram a limpeza do mesmo?
– E, se nesses casos o exsudato persistir e não conseguimos observar, já que a medicação obliterou o forame?
– Existe a possibilidade desse caso ser de cisto periapical? (Radiograficamente não me parece ser).
Aproveitando a oportunidade, parabéns pelo sucesso do site. Coloquei como página inicial do meu computador para todos os dias aprender mais sobre endodontia.
Sei que o seu tempo é curto, mas vou aguardar resposta.
Um abraço.
Hugo Bastos
Hugo, vamos por etapa.
Como sempre conversamos em aula, em ciência não existe sempre ou nunca, mas, de fato, deve-se evitar deixar o canal aberto ao meio bucal. Acho que você pode e deve fazer a medicação intracanal na primeira consulta com o cuidado que sempre colocamos, isto é, não fazer uma condensação tão vigorosa que extravase o hidróxido de cálcio. Assim, haveria algum espaço no canal para a migração do exsudato, preocupação que você relatou, porém, lembre que o exsudato já existia e nem por isso havia dor, pois como você disse a “lesão periapical é extensa, sem sintomatologia espontânea, à percussão ou palpação e sem aumento de volume.” Não havia dor porque a lesão periapical proporciona o espaço para a acomodação do exsudato. Observe que mais adiante você relata “fui no forame mais uma vez com a mesma lima e medida da primeira vez(#55;23mm). Quando me deparei com uma drenagem abundante de exsudato. Tentei secar, mas não consegui”, ou seja, essa quantidade tão grande não provocou dor; a lesão periapical acomoda o exsudato. Você fez então uma limpeza mais ativa do forame, como preconizo, observou uma diminuição do exsudato e aí colocou a medicação. Correto.
Você faz então três ponderações.
1. “E nos casos onde não voltamos nos forames com as limas que realizaram a limpeza do mesmo?”
R. O comum é que se consiga voltar ao forame após a sua limpeza em consulta anterior. Não se deve esperar que a medicação intracanal com hidróxido de cálcio venha a impedir isso, pois com a lima ele seria removido e além disso é nesse local que ele é inicialmente absorvido pela ação do próprio exsudato. Não voltar ao forame seria em função da formação do tampão apical de raspas de dentina, o que também não deve ocorrer quando se faz patência e limpeza do forame.
2. E, se nesses casos o exsudato persistir e não conseguimos observar, já que a medicação obliterou o forame?
R. Já falamos sobre isso na resposta anterior. Pode ocorrer, isso sim, não remover toda a medicação, não voltar ao forame e portanto não perceber que ainda há exsudato; ele fica “acomodado” na lesão periapical. A presença dele pode ser um indício de que a infecção ainda não foi controlada, o que levaria a um novo preparo com limpeza do forame e medicação intracanal.
3. Existe a possibilidade desse caso ser de cisto periapical? (Radiograficamente não me parece ser).
R. Pode ser um cisto abscedado.
Observe que em nenhum momento houve dor, mas sim sinais clínicos (persistência do exsudato purulento) de que não teria havido controle de infecção. Deixo duas perguntas no ar.
1. Se tivesse sido feito em sessão única, como você tomaria conhecimento dessas ocorrências?
2. Sem o devido controle de infecção (persistência do exsudato purulento), quais são as reais chances de haver reparo?