Onde Joaquim Barbosa fracassou

Por Fernando Brito, no Tijolaço

Paulo Nogueira, em seu Diário do Centro do Mundo, traça um diagnóstico demolidor sobre o porquê de, com todo esforço da mídia a promovê-lo, o Ministro Joaquim Barbosa não se tornou um “herói do povo”. Ao que ele descreve, apenas uma coisa tenho a acrescentar: o menino pobre perdeu – se é que o teve tão forte – o amor pelas suas origens e atribuiu exclusivamente a si o sucesso que obteve.

Nenhum de nós tem esse poder. Somos todos frutos de circunstâncias, de oportunidades e, quando as minimizamos e passamos ver apenas em nossas pretensas virtudes a razão de nossa eventual ascensão, tornamo-nos mesquinhos e doentiamente vaidosos.

Joaquim Barbosa, por quem todos um dia nutrimos a simpatia natural em ver um de nossos irmãos negros ascender à mais alta Corte do país, embebeu-se do mesmo espírito excludente que impediu negros, pobres e nordestinos, tantas vezes, de terem a mesma oportunidade: o considerar-se superior aos demais, raiz e fonte do elitismo.

A generosidade é própria dos homens grandes, dos quais um dos maiores, gigante mesmo, agora está lutando contra a morte: Nelson Mandela. Um quarto de século enjaulado, uma sociedade racista pior, muito pior do que o racismo sobrevive hoje aqui, a morte brutal de amigos e companheiros, nada disso o tornou um homem transtornado pelo ódio.

Apenas humanidade, a força que o manteve vivo e ainda o mantém e, quando for a hora, ainda assim o manterá na memória histórica.

É por isso, essencialmente por isso, que Joaquim Barbosa derrotou a si mesmo.

Onde Joaquim Barbosa fracassou

Por Paulo Nogueira, no Diário do Centro do Mundo

E eis que o caso do Mensalão chega a seu clímax. De todos os personagens da trama, o mais extraordinário é, por razões óbvias, Joaquim Barbosa. 

Com seu jeito bruto e tosco, com suas palavras duras e inclementes contra os réus, ele rapidamente se converteu num heroi do 1% — o diminuto grupo de privilegiados que tem sua voz nas grandes empresas de mídia. 

O maior esforço das empresas de mídia, em relação a JB, foi tentar convencer as pessoas de que elas genuinamente admiravam o “menino pobre que mudou o Brasil”. Ou, numa expressão, o “homem justo”. 

Não foram bem sucedidas nisso: a sensação que ficou, com o correr dos dias, é que aquela admiração é fingida. Joaquim Barbosa foi e é conveniente para o 1%, mas as informações que foram surgindo sobre ele tornam difícil qualquer tipo de admiração que não seja simulada. 

Fora da fantasia do “homem justo”, não é fácil admirá-lo na vida real. JB não tem notório saber, não se expressa com charme e clareza, não escreveu livros ou artigos dignos de nota. 

Também não é fácil admirar um alpinista profissional que é capaz de abordar – aborrecer, na verdade — alguém num aeroporto para tentar cavar uma promoção. 

E nem parece digno de aplausos quem, numa entrevista, cita um episódio ocorrido há quase quarenta anos – a reprovação no Itamaraty — com a raiva desagradável que temos de alguma coisa ocorrida há dias. 

O 1% triunfou no uso de Joaquim Barbosa para que defendesse seus interesses no julgamento do mensalão. Ele se revelou excepcio
nalmente suscetível à adulação da mídia. Ninguém parece ter acreditado tanto na admiração da mídia por JB quanto o próprio JB.
 

O fracasso do 1% foi na tentativa de fazer de JB um “heroi do povo”, alguém capaz de conquistar a presidência da república nas urnas e zelar pela manutenção de seus privilégios com o uniforme de “menino pobre”. 

Este fracasso se deu, em grande parte, por força da internet. Nos sites independentes, as informações sobre o real Joaquim Barbosa permitiram compor um perfil bem diferente daquele difundido pelas companhias jornalísticas. 

A relação promíscua com a mídia (notadamente com a Globo, que deu emprego a seu filho não por filantropia, naturalmente), o apartamento comprado em Miami com o uso de uma pequena trapaça para evitar impostos – coisas assim acabaram desconstruindo o perfil montado por jornais e revistas, ao se tornarem públicas pela internet. 

Nas pesquisas presidenciais, seu nome aparece com números acachapantemente baixos e decepcionantes para quem tem sido tão promovido. 

Se Joaquim Barbosa estivesse nos corações e nas mentes dos chamados 99%, ele estaria brilhando nas pesquisas. Seria um contendor poderoso para 2014, na pele do “homem que acabou com a corrupção”. 

Mas não.

Por mais que a mídia tenha se esforçado para fazer de JB um “heroi do povo”, ele já é amplamente reconhecido como um representante daquele grupo predador que fez do Brasil um recordista mundial em desigualdade – o 1%.