Por Ronaldo Souza
Nada melhor do que um acarajé quentinho com pimenta e vatapá.
Como tira gosto, cortado em pequenos pedaços, com a pimenta e o vatapá do lado e uma cerveja bem gelada é o manjar dos deuses.
De dar água na boca.
Pelo menos aos baianos.
Para muitos deles, entretanto, o acarajé não é uma simples iguaria, vai muito além disso.
Se para muitos comer um acarajé representa um momento de puro prazer, para outros não é só isso. Há sentimentos maiores por trás desse patrimônio da Bahia.
A Bahia, tão rica em artes de um modo geral e no seu folclore, possui manifestações de grande riqueza e diversidade e todas elas guardam em si profundas ligações com o que há de mais sagrado nas pessoas; a religiosidade e a fé.
Dessa grande riqueza fazem parte hábitos e costumes que vieram da África e aqui encontraram o terreno mais próprio e fértil para se estabelecerem.
A Bahia é o maior pedaço da África fora daquele continente.
Isso a torna uma terra única.
É daí que vem, entre outras coisas, a nossa força musical, o nosso talento para as artes.
Por essas razões não posso deixar de lançar o meu protesto à matéria de capa da revista Época (Globo).
Ainda que a insensatez tenha se tornado uma das maiores características da Rede Globo nos últimos tempos, há de se ter um limite.
A Globo jamais poderia fazer qualquer tipo de associação entre o patrimônio cultural de um estado e seu povo e a sujeira que se vê em diversos segmentos sociais e políticos do país, entre os quais se encontram alguns dos órgãos de comunicação, com relevante participação dela própria, Globo.
A Bahia foi desrespeitada.
O seu povo foi tremendamente insultado, particularmente os descendentes mais diretos dos povos africanos, que cultuam seus hábitos religiosos.
Para estes, o acarajé não é somente uma iguaria, um quitute.
Ele faz parte do ritual de homenagens à Iansã.
Não importam os motivos que levaram a maior rede de comunicação do Brasil a cometer tamanho desatino
A necessidade de armar um grande circo para alcançar os seus objetivos, sejam eles quais forem, não dá a quem quer que seja o direito de agir de forma tão desrespeitosa com um povo.
Nem mesmo à Globo, que não pode se colocar acima do bem e do mal porque lhe faltam os mínimos predicados para isso.
A Bahia repudia esse lamentável episódio, que em nada a diminui e ao seu povo, mas ratifica o absoluto descompromisso e desprezo da Globo por um estado, um país e seu povo.