Por Ronaldo Souza
Continuaremos a desejar e a festejar a doença de alguém? Continuaremos a festejar o câncer de alguém? Continuaremos a desejar a morte de alguém? Quando fazemos isso, em que nos diferenciamos daqueles a quem muitas vezes costumamos chamar de animais, que estão nas prisões por matarem pessoas?
Quantas vezes já viram uma briga ser o resultado de uma discussão da qual se perdeu o controle? Onde começa a violência física? Na violência verbal. Toda e qualquer forma de violência física tem a sua origem no estímulo a ela.
Foi a violência da concepção da raça ariana que gerou a ideia de raças inferiores. Foi a disseminação dessa concepção que gerou a perseguição às raças inferiores. Foi a concepção da raça ariana que gerou a guerra. Foi a perseguição às raças inferiores que gerou os campos de concentração nazistas. Foi a prisão das raças inferiores que gerou os milhões de mortes nos campos de concentração.
Quem disseminou essa concepção? Foi a “intelligentsia” de Hitler, foram os pensadores de Hitler. Criam-se as castas, criam-se as elites, nascem os que vivem à margem delas. Nascem os marginais, nascem os seres inferiores.
Quantos judeus morreram de morte matada? Quantos negros morreram e morrem de morte matada? Quantos homossexuais morreram e morrem de morte matada? Quantos índios morreram e morrem de morte matada? Quantos pequenos agricultores, proprietários de pequenos pedaços de terra nos cantos mais remotos desse país morreram e morrem de morte matada? Quantas pessoas de morros, favelas e periferias morrem de morte matada?
O que se espera de tanta violência disseminada nas redes sociais? Que nasçam o amor, a fraternidade e a igualdade de direitos? O que se espera de seres inferiores que são gerados nas redes sociais por e entre aqueles que se pretendem elite?
“Nordestino não é gente. Faça um favor a São Paulo: mate um nordestino afogado!”.
Mayara Petruso doeu em você? Por que? Por que você é nordestino? Qual a diferença? Nenhuma. Só porque ela e uma quantidade enorme de pessoas incluíram os nordestinos entre os pretos, pobres, prostitutas, homossexuais… os que merecem morte matada? Que outros grupos, que outros segmentos da sociedade serão incorporados a esses que merecem morte matada?
Quantas Mayara Petruso são geradas diariamente?
Quem somos e o que somos? Quantos de nós têm a pela branca, cabelos lisos e olhos claros? Quantos de nós teriam morte matada pelo “arianismo” de quem vê como inferiores aqueles que não possuem essas características físicas? Tem certeza de que você escaparia?
Lamento muito, mas é, no mínimo, extremamente difícil para qualquer ser humano que mereça ser chamado assim, ser humano, aceitar esse tipo de comportamento.
Como aceitar tal comportamento naqueles que falam tanto em Deus, um Deus a quem atribuem a condição de Pai e Ser Supremo e cuja “existência” é sinônimo de amor, paz, fraternidade, igualdade e perdão? Ele não é por si só a expressão de tudo isso? Por que falam em Seu nome e assim que Ele “olha pro lado” destilam tanto veneno?
Como conseguem falar de Deus e ao mesmo tempo disseminar tamanho ódio, tamanho rancor. Como conseguem viver tão intensamente nos seus corações sentimentos tão opostos. Como podem se imaginar bons com tanto ódio nos corações.
Não sou um homem religioso, mas recorro a uma passagem da Biblia, quando Jesus os acusou:
“Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas, porque sois semelhantes aos sepulcros caiados, que, por fora, se mostram belos, mas interiormente estão cheios de ossos de mortos e de toda imundícia! Assim também vós exteriormente pareceis justos aos homens, mas, por dentro, estais cheios de hipocrisia e de iniquidade.” (Mt 23. 27-28)
Não, não lhes respondo, nada de mal lhes desejo. Na minha pequenez, faço um enorme esforço para elevar o meu espírito e procurar entender e aceitar tamanha falsidade, tamanha mentira, tamanha hipocrisia, tamanha desumanidade. Mas, perdoem-me, sou um ser humano e como tal aceitar isso está acima das minhas forças. O máximo que consigo é ter pena de quem assim age.
E, num esforço maior ainda, não sendo um homem de crença religiosa, faço uma prece: se existe um Deus, que Ele se compadeça de vocês.
Acalmem seus corações. Aproveitem o famoso espírito do Nata
l, que não é só uma ceia alegre e farta entre os nossos. Se quiserem ver o espírito do Natal, percebam os diversos mensageiros da paz nos corações espalhados pelo mundo, cada um à sua maneira. Ouçam, quem sabe, um desses mensageiros. Que morreu de morte matada por alguém atingido por esse desamor disseminado no seio da raça humana.
Feliz Natal.
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