“More is less”

Estados Unidos do Brasil

Por Ronaldo Souza

Há alguns anos, em uma das idas ao Rio de Janeiro, meu cunhado me pegou no aeroporto e fomos pela Barra da Tijuca.

Fiquei chocado.

Tudo era em inglês.

Off, rent a car… e por aí vai.

Dali a dois ou três dias o que me chocou estava retratado em uma das crônicas de João Ubaldo. Ele começava dizendo:

“Essa crônica devia ser escrita em inglês. Pelo menos na Barra eu seria mais lido”.

Como sempre, João Ubaldo usava todo seu talento para trazer luz ao dia-a-dia.

E dessa luz Ariano Suassuna também sabia que muitos precisavam.

Também há alguns anos em um encontro de intelectuais, por coincidência no Rio, Suassuna mais uma vez se posicionou.

Na sua palestra fez algumas considerações e disse:

“Oh, por exemplo, depois da minha conversa com vocês vai ter um cofffféééééé breaki”, puxando pelo sotaque nordestino bem arrastado, ele que já tinha um sotaque forte.

Claro, o auditório foi às gargalhadas.

Suassuna conseguira seu objetivo; trouxe a plateia para ele.

Infância e adolescência vividas sob grande influência dos Estados Unidos, tinha naquele país, no seu cinema, na sua música, as minhas referências.

Desde cedo, Gary Cooper, John Wayne, Rock Hudson, Elizabeth Taylor, Elvis Presley (graças a ele, para mim o Havaí era o paraíso na terra), Frank Sinatra, Jonnhy Mathis… eram os meus artistas preferidos.

Nenhum brasileiro.

Mas já na adolescência, Elis Regina e Jair Rodrigues (o inesquecível “Dois na Bossa”), Chico Buarque, Edu Lobo, Caetano, Gil, Gal, Bethania, Tom, Vinicius, Gonzaguinha… começavam a aparecer na minha vida.

O cinema brasileiro só tempos depois, quando já entrara na vida adulta.

Eu começava a nascer para mim mesmo.

E quando se nasce para si mesmo, o mundo já não é o mesmo.

Entretanto, mesmo quando ainda era forte aquele traço cultural de idolatria aos Estados Unidos, ao “american way of life”, que só anos depois perceberia com clareza o que de fato significava, começava a se manifestar em mim o encantamento pela língua portuguesa.

Mesmo até hoje sendo alguém em eterno débito com ela, tenho esse sentimento.

Muitos relatam que os franceses se aborrecem quando estrangeiros procuram se comunicar em inglês na França.

Eventuais exageros dos franceses à parte, nós, que costumamos exaltar as qualidades dos outros, temos realmente muito a aprender com eles

Enquanto na França se protege o francês, aqui é grande o desrespeito à nossa língua.

Less is more.

Não, less não é more.

More is less.

More is less porque tudo que torna menor é menos.

“Minha Pátria é minha língua”, já dizia Fernando Pessoa e que Caetano pôs numa de suas belas músicas.

As agressões à língua portuguesa, nossa língua, nossa Pátria, tornam-na menos importante, menor.

Aqui menos é mais e mais é menos.

Simples assim.

Aqui, tudo será menos sempre que afrontar o país, o seu povo, a sua língua, os seus costumes, os seus hábitos, a sua soberania.

Aqui tudo será mais sempre que enaltecer o nosso povo, a nossa cultura, o nosso modo de ser, de falar, de escrever.

Aqui tudo será mais sempre que elevar a nossa autoestima.

Aqui tudo será mais sempre que ratificar a nossa soberania.

Eu não pediria a Nelson Rodrigues, pernambucano que se tornou carioca e torcedor do Fluminense, para emitir uma opinião sobre essa questão.

Apaixonado pelo futebol e conhecedor do seu povo, ele era chegado a opiniões muito fortes.

Foi ele quem disse que o brasileiro tinha “complexo de vira-lata”.

Mas, apesar de brilhante, certamente Nelson Rodrigues não era um Fernando Pessoa.

Nem tinha a leveza de Ariano Suassuna.

Suassuna perguntaria; meu filho, por que você não usa a beleza e a riqueza da sua língua. Você sabia que ela é tida como uma das mais ricas e belas?

Suassuna diria:

“Oh, depois da minha conversa com vocês vai ter uma palestra danada de boa. Vejam só o título; ‘Menos é mais’. Enigmático, não é? Não parece interessante? Até eu vou ficar para assistir”.

Não sei quantos sabem que ele era um ferrenho defensor da língua portuguesa e fazia disso uma luta diária.

Talvez por pensar como Fernando Pessoa e achar que sua língua era sua Pátria.

Bobagem.

Just my two cents.