Já escrevi inúmeros textos sobre Joaquim Barbosa. Salvo engano, a primeira vez foi aqui e a última aqui.
É possível que alguns não tenham concordado em nenhum instante com nada do que falei sobre ele e eu entendo. Afinal, a grande mídia brasileira, onde a Globo e a Veja ocupam cadeiras cativas e de grande destaque, fizeram dele o novo herói do Brasil. Disseram até que seria a máscara mais vendida no carnaval. Lembra? Fracasso total. Os comerciantes tiveram prejuízo.
É algo tão recente que mesmo o mais desmemoriado dos brasileiros é capaz de lembrar com detalhes tudo que se falou e se mostrou dele. Foi alvo dos maiores elogios e homenagens de que se tem notícia nos últimos anos. Não há nenhum membro na história do judiciário brasileiro que tenha sido tão incensado quanto ele.
Literalmente blindado pela imprensa, era um poço de virtudes. Os absurdos que cometeu foram devidamente escondidos do povo brasileiro.
O que chama a atenção agora é o cinismo da mídia. Ela já tem tanta certeza da sua impunidade moral, graças ao público que ela própria formou e sobre o qual tem absoluto controle, particularmente aquele pobre segmento que adora se dizer elite, que diz e desdiz como quem troca de roupa.
Um dia desses, herói, agora…
Há poucos dias um amigo me disse: “quando começo uma conversa e a pessoa diz ‘eu li na Veja’, não vou adiante. Desconverso e, se possível, saio de mansinho”.
Não faltam evidências que mostram que ele está coberto de razão.
O que está por trás disso? Muita coisa. E tudo se resume em uma só: jogo de interesses.
Nos vários textos que escrevi eu sempre disse que Barbosa era um instrumento do consórcio mídia/oposição/elite, estava a serviço dela. Por esta razão, enquanto lhe fosse útil seria blindado. Mas, tinha prazo de validade.
E essa validade estava diretamente ligada à condenação e prisão dos réus da AP 470, conhecida como mensalão. Só conseguiu parcialmente o seu objetivo e missão, foi derrotado. Talvez agora fique mais fácil entender todo o seu nervosismo e irritabilidade nos últimos tempos; pressentiu o fracasso e via vencer a validade. Vamos ver o que vai restar dele.
A mídia faz isso com perfeição. Constrói e destrói heróis de barro de tal forma que o público por ela formado não percebe.
Marina foi um desses na campanha de 2010. Sentindo que só com ela poderiam fazer o segundo turno com Dilma Rousseff, o consórcio mídia/oposição/elite a levou ao altar. Marina e seus seguidores não perceberam o quanto foram usados. O consórcio sabia que ela levaria ao segundo turno, mas não estaria nele. Levou-a ao altar e lá mesmo ela foi sacrificada. Serra foi para o segundo turno. Dilma venceu.
A inconsistência de Aécio dói. O seu vazio dá pena.
Agora, porém, há um risco iminente de que o PSDB não vá ao segundo turno (se é que vai haver segundo turno).
Os movimentos da mídia estão sendo ansiosamente aguardados. Vai bater em Campos/Marina? E se Aécio não for? Vendo-o tropeçar nas próprias pernas, não bate em Marina e a leva ao altar para, dessa vez, seguir com ela? Os dois netos então, Aécio e Campos, estariam fora (os netos não costumam ter biografia própria na política brasileira), porque se tiver que ir para o segundo turno não deverá ser Eduardo Campos e sim Marina. E é aí que entra a possibilidade de Serra… voltar a ser o candidato do PSDB.
A depender das conveniências, a mídia fará de Eduardo Campos e Marina heróis de prateleira como Joaquim Barbosa. Vai depender muito do que poderá surgir dos movimentos da Rede da Vingança do Partido dos Trabalhadores (RVPT).
Veja a reportagem do Brasil 247
Pela primeira vez em muito tempo, Reinaldo Azevedo, blogueiro de Veja.com, acertou; em artigo publicado nesta segunda-feira, ele afirma que o discurso político de Joaquim Barbosa solapa a credibilidade do Supremo Tribunal Federal; "Não dá! Alguém imagina um membro da Suprema Corte dos EUA a especular sobre a própria candidatura? Ou da Alemanha? Ou da França? Ou aqui pertinho, do Chile? Isso é coisa típica, lamento constatar, de republiqueta, em que as autoridades não se dão conta do papel de que estão investidas e não prestam atenção ao peso que têm suas respectivas funções", diz ele; na prática, ao se colocar como presidenciável, Barbosa deixa no ar a dúvida: virou político agora ou já era quando conduzia o processo do chamado mensalão e fazia demagogia com a toga?
Reinaldo tem razão: Joaquim Barbosa desmoralizou o mensalão
Se até um relógio quebrado acerta as horas duas vezes ao dia, por que, afinal de contas, Reinaldo Azevedo, blogueiro de Veja.com, não poderia dar uma dentro?
Nesta segunda-feira, ele condenou, de forma veemente, a fala de Joaquim Barbosa, num congresso de jornalismo no Rio de Janeiro em que, pela primeira vez, o presidente do Supremo Tribunal Federal se colocou como presidenciável (leia mais aqui).
A dúvida que paira no ar, a partir de hoje, é óbvia: se um presidente de uma suprema corte pode ter pretensões políticas, ele vira político apenas quando sai da magistratura ou já era político quando fazia demagogia com a toga e jogava para a plateia?
A partir de agora, todos os votos de Joaquim Barbosa, na Ação Penal 470 e em outros processos, estarão sob suspeita. Foram votos técnicos, com base na lei, ou decisões que visavam cimentar eventual candidatura política?
Num país sério, um presidente de uma suprema corte que se colocasse como político deveria, imediatamente, ser colocado sob suspeição. No entanto, foi a própria revista Veja quem incensou o político que já se assanhava sob a toga com a famosa capa sobre "o menino pobre que mudou o Brasil", aquele que, depois do caçador de marajás, poderia ser o caçador de petralhas (leia aqui reportagem do 247 a respeito).
Abaixo, o texto de Reinaldo:
Não fosse um absurdo em essência, seria o caso de recomendar ao ministro Joaquim Barbosa, presidente do Supremo e relator da, como é mesmo?, “Ação Penal 470” que não desse mole a mensaleiros. Como, no entanto, ele errou no mais, o menos vem de troco. Explico-me. Na sua intervenção no congresso promovido pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), na PUC-Rio, ele confirmou que tem, sim, pretensões políticas, mas não para já.
Durante um bom tempo, muita gente especulou — especialmente os que o acusavam de perseguir os pobres réus do mensalão — de atuar movido por intenções políticas. Chegou a ser apontado como pré-candidato, e seu nome foi testado por todos os institutos de pesquisa. Em 2014, Barbosa já não pode fazer mais nada. Ainda que quisesse, perdeu os prazos. Mas e no futuro? Pois é… Reproduzo trecho (em vermelho) da reportagem da VEJA.com:
Pela primeira vez, o presidente do ST
F disse que refletirá sobre a possibilidade de entrar para a política após deixar a Corte. Barbosa também afirmou que tem intenção de se afastar do Tribunal antes dos 70 anos, quando se aposentaria compulsoriamente. O ministro tem 59 anos. ‘Refletirei sobre isso (ingressar na política), mas só depois de deixar o Supremo. Acho difícil ficar na Corte até os 70 anos. No momento, não tenho nenhuma intenção de me lançar candidato. No futuro, a médio prazo, terei tempo para pensar’, disse. Quando perguntado sobre onde estará em 2018, o ministro respondeu em tom de brincadeira: ‘Na praia’, dando uma pista da data em pretende deixar o STF.
Retomo
Não da! Alguém imagina um membro da Suprema Corte dos EUA a especular sobre a própria candidatura? Ou da Alemanha? Ou da França? Ou aqui pertinho, do Chile? Isso é coisa típica, lamento constatar, de republiqueta, em que as autoridades não se dão conta do papel de que estão investidas e não prestam atenção ao peso que têm suas respectivas funções.
Ora, a partir de agora, confessada a pretensão, é justo que os que não gostam (e até os que gostam) da atuação de Barbosa a vejam segundo o horizonte que admitiu para si mesmo. Ainda que alimentasse (alimente) pretensões políticas, é um despropósito que as revele. “Ah, isso é mais honesto!” Não! Isso é apenas imprudente. Vai contribuir para lançar sombras de suspeição sobre suas decisões, seja essa desconfiança justa ou injusta.
Foi mais longe, informa a VEJA.com. Mais uma vez, fora dos autos, como livre pensador, o que ele não é, deu-se a inconveniências. Reproduzo (em vermelho):
Em sua participação no debate da Abraji, Joaquim Barbosa criticou o sistema político brasileiro e até aos candidatos à presidência da República. “O quadro político partidário não me agrada nem um pouco”, disse, respondendo se via algum candidato com simpatia. O ministro também afirmou que política e o judiciário brasileiros. No “pequeno catálogo dos problemas da política”, segundo ele, estão o voto obrigatório, a impossibilidade de candidatura avulsa, o “assombroso” número de partidos políticos, a “mercantilização” das legendas e “o coronelismo e mandonismo” na estrutura interna de certos partidos políticos. “O povo tem sido ignorado e colocado à parte das decisões políticas no país”, avaliou.
Volto
Não é a fala de um juiz. É a fala de um político. Não é a fala de um presidente do Supremo. É a fala de um politico. Não é fala do chefe máximo de um Poder que tem também as características de Poder Moderador. É a fala de um político. E, agora, não é um mensaleiro que está a dizê-lo, mas um jornalista que acha que aquela turma tem de ir para a cadeia: é em outro prédio que se fala assim, não no Palácio da Justiça.
Nem me estendo sobre o mérito das decisões de Barbosa no caso do mensalão — eu acho que ele teve uma boa atuação, mas isso, reitero, não está em pauta. Foi ele quem decidiu investir na confusão nesta segunda. Não gosto quando lideranças políticas fazem essas avaliações genérico-apocalípticas, na base do “nada funciona”, “tudo é mesmo uma porcaria”, “olhem que lástima”… Essas coisas tem o inegável sabor da demagogia barata. Como se diz em Dois Córregos, “nem diminói nem contribói”. Esse tipo de intervenção só serve para colocar sob suspeição sua própria atuação.
Não é o primeiro a fazê-lo. Luiz Roberto Barroso também já se entregou a essas especulações. Como esquecer aquele 28 de agosto em que negou provimento a um embargo de declaração impetrado pela defesa de José Genoino com uma crítica demolidora ao sistema político, relevando, no entanto, as qualidades morais e a biografia do condenado?
O Regimento Interno do Supremo deveria ser acrescido de um suplemento sobre decoro e boas maneiras. Quando ministros do Supremo começam a se comportar como políticos, os políticos se assanham e começam a querer se comportar como juízes, e tudo fica fora do lugar.