A Rede Globo perdeu a noção

A história contemporânea do nosso país registra momentos que a imensa maioria da sua população, por razões conhecidas, sequer imagina. Em alguns desses momentos, a participação de setores do que se chama hoje a grande mídia assusta e nos deixa bastante preocupados quanto à possibilidade de que o Brasil apresente a curto prazo um real processo de desenvolvimento como nação democrática, com participação e crescimento do povo, como deveria ser.

Preocupa, mas não elimina as esperanças de que esse desenvolvimento terminará acontecendo, ainda que em prazo maior do que o país já tem condições de promover. E por uma razão bem simples. Sempre, isso mesmo, sempre existirão aqueles que aos olhos de alguns não passam de uns pobres idealistas.

São homens e mulheres que, apesar de tudo ser feito de maneira intencional para gerar desesperança, estarão sempre, pública ou anonimamente, imbuídos de um sentimento maior. Ao longo da história sempre existiram. E não se engane. Apesar da aparente impotência, eles podem muito. Segundo Capra* “nunca duvide que um pequeno grupo de pessoas conscientes e engajadas possa mudar o mundo; de fato, sempre foi somente assim que o mundo mudou”. E há um dado novo. O mundo nunca foi tão favorável à disseminação das idéias desses Dom Quixotes, graças à Internet. Ela está mudando o mundo.

Por algumas razões, não cabe a mim e neste espaço, até porque me faltam as condições mais apropriadas, descrever os riscos que setores da assim chamada grande imprensa representam para o real desenvolvimento do povo desse país. Mas, sem dúvida, é uma manipulação perversa e muito bem conduzida a serviço de uma minoria privilegiada.

Há muito tempo perdi completamente a esperança, e aí posso dizer, sem qualquer possibilidade de vir a recupera-la, de que a Rede Globo, possivelmente a maior empresa de comunicação do Brasil, possa ter qualquer participação nesse processo de desenvolvimento, que virá, com ou sem a participação dela. Cedo na minha vida reconheci isso.

Ela agora, porém, extrapolou todos os limites que permitem a preservação do mínimo de respeito pelo ser humano. Sei que ela faz isso há muito tempo e o fez outra vez ao nos impingir essa coisa que se chama Big Brother Brasil. Não quero falar sobre isso outra vez, já o fiz anteriormente (clique aqui para ler), mas aproveito e trago daquele texto o que disse José Wilker há algum tempo: “É um programa de indigentes mentais. As pessoas que estão ali não têm nada a oferecer, são de uma pobreza mental que dá dó”. Só que com isso eles arrastam toda uma sociedade.

Mas a Rede Globo agora se superou. Passo pela sala e vejo a minha filha caçula assistindo ao Vídeo Show, que estava apresentando os vídeos das pessoas que se candidataram a participar do Big Brother Brasil. Não bastassem as cenas exibidas pelos vídeos, grotescas por si só, o locutor, sem qualquer pudor, sem o menor constrangimento, pelo contrário, dando à voz o tom de galhofa, lê textos que de forma escancarada ridicularizam os candidatos. Lembro que em um deles aparece um candidato como que em posição de Yoga, com a voz ao fundo; “mas também tem candidato zen… noção de nada”. Concordo inteiramente, sem noção de nada, porque se tivesse a mínima, não desejaria participar daquele programa.

É a humilhação total, é a degradação do ser humano, de pessoas simples, humildes, postas no mais fundo dos poços da ausência de dignidade humana, mas que, a rigor, em pouco diferem (será que diferem? José Wilker deve achar que não) daquelas que se classificam e participam do programa.

Reflexos do processo de idiotização da sociedade proporcionado pela televisão brasileira, achamos graça do que vemos, quando na verdade não vemos nada.

 

* Fritjof Capra – Doutor em Física pela Universidade de Viena e filósofo.