Pode obturar?

Bia:
Olá, prof. Ronaldo!!
Gostaria de saber se quando ocorre, durante a instrumentação, drenagem via canal de exsudato purulento, cessando o mesmo durante a propria instrumentação; poderia obturar o canal nesta mesma sessão?? Outra questão seria em relação ao alargamento dos canais mesiais do molares inferiores: alarguei a cervical com gates, fiz a odontometria, instrumentei os canais até a lima #20 com sucesso; porém a lima #25 não quer chegar ao meu CT.Teve irrigação abundante durante o procedimento. Existe a possibilidade da lima estar “com dificuldades” de passar no terço médio, necessitando de um alargamento a mais (com limas mais calibrosas?)  Agradeço desde já a ajuda!

Bia, aproveito a sua pergunta muito interessante para perguntar se você permite que eu faça uma resposta um pouco mais longa? Permite? Obrigado.
1. O abscesso em fase aguda denuncia a queda da resistência orgânica do paciente, aumento da quantidade e/ou virulência dos microorganismos, sendo estas últimas as causas mais comuns. Em outras palavras, a quantidade e as características dos microorganismos exercem um papel fundamental. Vamos usar dois exemplos para tentar explicar bem essa questão.
Diante de um caso com fístula e/ou exsudato intenso, você prepara o canal e na sessão seguinte percebe uma melhora na diminuição da fístula ou do exsudato. Observa, por exemplo, que este está menor. O que deve ter acontecido? O preparo do canal, onde se inclui a medicação intracanal, deve ter promovido uma redução significativa na quantidade e qualidade da infecção, suficiente para promover uma atenuação da sua manifestação clínica (diminuição do exsudato). Terá removido toda a infecção? Sabe-se que não. A infecção residual será suficiente para, a médio/longo prazo, diante de determinadas condições (que a literatura e a experiência clínica mostram que existem) aumentar e se manifestar clinicamente outra vez? Quem tem essa resposta? Sabe-se que é possível e tem acontecido (apesar de alguns não perceberem).
Por que se mudam as formas de prescrever antibióticos? Qual usar, qual a dosagem, por quanto tempo? Assim que cessarem os sintomas, remove-se o antibiótico ou deixa por mais tantos dias? Uma coisa tão “simples” que se faz há tantos anos, por que ninguém apresentou a palavra final? Porque na Medicina a coisa é séria, não se brinca com a saúde do paciente. Eles sabem que as infecções não são iguais, os pacientes não são iguais, as respostas imunológicas não são iguais. Por isso, eles, médicos, prescrevem e mudam quando teem que mudar, são “inseguros”. Nós, endodontistas, não, somos conhecedores profundos da biologia, sabemos o que vai acontecer com os nossos pacientes (com todos), por isso estabelecemos uma terapia única para todos eles, em série: abre e fecha (prepara e obtura).
Os ministradores de curso (hoje todo mundo é ministrador de curso), os formadores de opinião (hoje todo mundo é formador de opinião) trabalham muito no que pode ser feito, poucos trabalham no que deve ser feito. Nem sempre se sabe o que deve ser feito e por isso se mudam as prescrições de medicação sistêmica, numa tentativa de melhor controle da infecção. Assim, para a sua pergunta, “quando ocorre, durante a instrumentação, drenagem via canal de exsudato purulento, cessando o mesmo durante a propria instrumentação; poderia obturar o canal nesta mesma sessão??”, digo que pode, porém sugiro que analise cada caso isoladamente. Pode, nem sempre deve. Não se trata somente de habilidade técnica e experiência pela repetição do ato em si, é algo muito maior, que costumamos tratar de maneira pequena. Quem é o paciente e como está ele imunologicamente, qual é a história daquele caso, como é a infecção, como se manifestou e como se manifesta…? Esta infecção eu posso tratar assim, ou de outra maneira, devo ter um suporte medicamentoso sistêmico ou não…?
2. A sua segunda questão é técnica. Aqui, portanto, entra o que? Técnica. A possibilidade de a lima “estar com dificuldades de passar no terço médio” existe porque as brocas GG não trabalham em curvatura e muitas vezes estas se manifestam já no terço médio dos canais mesiais dos molares inferiores. Isso seria mais facilmente contornado com o preparo automatizado com limas NiTi. Se você não usa, faça uma ampliação (manual mesmo) do terço médio (fazendo a patência do terço apical para não haver entulhamento de raspas de dentina). Isso lhe dará maior liberdade de ação no terço apical. Além disso, veja também se o grau de curvatura que você dá à lima #25 é o mesmo que deu à #20. Também aqui, o preparo automatizado com limas NiTi tornaria essa passagem da #20 para #25 bem mais tranquila. Mais uma vez, não se aflija se não faz. Mesmo sem ainda ter desenvolvido essa parte você pode fazer um bom preparo. Porém, assim que puder, comece a usar os sistemas rotatórios, como são conhecidos.

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