Por Ronaldo Souza
As capas das revistas IstoÉ e Veja desta semana são um primor.
Erguem as taças de champanhe e fazem um brinde com seu público.
As revistas, porém, não perceberam, mas expuseram o juiz.
No desejo de saciar os seus sofisticados e elegantes leitores e deixa-los ainda mais excitados com o gosto de sangue na boca, deixaram-no nu em praça pública.
Fico aqui imaginando com os meus botões, apesar de estar sem camisa neste momento em que escrevo, como os leitores devem estar se deliciando vendo o seu grande guerreiro e herói com o azul na sua roupa e na sua face como o representante do poder combatendo o mal da corrupção, representado pelo vermelho na roupa e na face do torneiro mecânico bandido, representante do outro lado.
É mais que emblemática a forma como são apresentados os dois lutadores.
No entanto, pelo menos numa coisa acertaram.
Não há como negar que ambos representam muito bem os seus respectivos partidos.
Finalmente, a mídia brasileira abre as portas da sua academia e exibe o seu grande lutador.
Cumpre assim o papel de informar ao seu público tão cativo.
E fez um belo trabalho, afinal, dada a discrição do sempre reservado Moro, um juiz que não gosta de badalações e exposições midiáticas, alguns ainda poderiam não ter percebido que o juiz, justiça se faça a ele, é o grande lutador do PSDB.
Aliás, por questão de justiça, não se pode deixar de citar também a Folha que, mesmo sabendo que seus leitores não perceberiam, já tinha mostrado o juiz como candidato do PSDB em pesquisa no ano passado.
Ou seja, também a Folha assumiu há mais de um ano que o juiz, que alguns maldosamente chamam de o “imparcial de Curitiba”, é um político do PSDB.
Um verdadeiro guerreiro a desempenhar muito bem o seu papel.
Um juiz guerreiro que, imbuído do papel de salvar o seu país das forças do mal, abandonou os tribunais, deixou de lado a Justiça e, como um justiceiro dos tempos dos filmes de cowboy, com os quais eu vibrava na minha doce infância, foi para o ringue da luta política, onde, de fato, trava a sua verdadeira batalha.
Não à toa, é digno merecedor das homenagens que lhe foram e são prestadas pela imprensa, nesse perfeito convívio judiciário-mídia-política, tão saudável para a eternamente “jovem e robusta” democracia brasileira.
Sem dúvida, um juiz moderno.
Herói pacificador
Não bastassem todas essas ações do juiz, eis que ele se revela também um bom samaritano.
Sensível aos seus, o juiz nos presenteia com um vídeo tocante em que expõe toda a sua preocupação com os seus apoiadores, num aconselhamento paternal para que não saiam às ruas de Curitiba na quarta-feira (10/05) e assim evitem um confronto com aqueles pobres miseráveis, que já nascem degenerados por culpa da maldita colonização portuguesa, como nos assegura o antropólogo Deltan Dallagnol.
Segundo o mesmo antropólogo, seríamos outro povo se tivéssemos sido colonizados pelos bons e puros ingleses, povo que colonizou os bons e puros americanos.
Converso outra vez com meus botões e eles me chamam a atenção para algumas coisas.
Um juiz que faz vídeos!
Um juiz que é “parte” do processo e tem “apoiadores”!
Pergunte a qualquer advogado que seja minimamente sério e competente o que isso de fato significa para a Justiça de um país.
Só mesmo debaixo do céu azul e sol intenso deste país tropical um juiz deixa de julgar e se transforma em adversário do réu.
Calei-me diante deles, meus botões.
Mas daqui também ergo a minha taça, num brinde à mídia pela sua sinceridade em finalmente mostrar e chamar de seu o juiz que não julga.
Faz do réu adversário e o enfrenta.
Do alto do cinismo, um conhecido ministro brasileiro diria:
“Meus a-mi-gos, ve-jam o que fi-ze-ram com a jus-ti-ça bra-si-lei-ra!
A plateia ainda aplaude, ainda pede bis
A plateia só deseja ser feliz
(Gonzaguinha)