“Não tem escapação”

Firmamento

Por Ronaldo Souza

Estávamos nos 15 anos e traçávamos os destinos do mundo, como costuma acontecer nessa idade.

Em determinado momento, fechou-se o semblante de um dos meus amigos e veio a sua triste conclusão:

– É, não tem escapamento.

Atônito com o que acabara de ouvir, outro, do alto da sua sapiência, corrigiu-o de imediato.

– Escapamento o que seu burro, não tem escapação.

Deu-se o impasse.

Ah, os 15 anos.

Tempo delicioso em que tudo é possível e… permitido.

O nosso vasto conhecimento sobre as coisas da vida é mostrado a todo instante.

Há um prazer incontido em exibir o quanto sabemos.

Na frente das meninas, então!

Hoje, não.

Estamos calados, introspectivos.

A sabedoria chegou.

E a sabedoria recomenda prudência.

Ninguém mais anda exibindo conhecimento sobre as coisas.

E olha que não falta onde fazer isso.

Lembro das reportagens do Canal 100, que eram exibidas antes dos filmes no cinema, mostrando as pessoas em pé na frente das bancas de jornais e revistas.

Liam as manchetes.

Só, mais nada.

Dali saiam dominando todas as informações em profundidade e prontos para exibir o conhecimento recém adquirido nas discussões que travariam com amigos e colegas de trabalho.

– Li no jornal que…

Talvez venha daí o hábito dos dias atuais de ampliar o conhecimento através da leitura… das manchetes. 

Tudo mudou.

Lembra daquele casal de um programa humorístico, em que Ofélia, depois de dizer as maiores barbaridades na frente de alguém que lhes visitava, dizia para Fernandinho, o marido?

– Fernandinho, eu só abro a boca quando tenho certeza!!!

Hoje as pessoas só abrem a boca quando têm certeza.

Bem informadas pela televisão e uma imprensa escrita de alto nível, parece que adquiriram o hábito da prudência.

Por saberem que sabem muito, parece que ficaram com medo de falar, porque sabem que os outros também sabem muito.

É a insegurança do grande saber.

Onde todos sabem tudo, é prudente não falar muito.

E escrever!!!

Já reparou como escrevem?

Quando muito, três, quatro linhas.

Há quem diga que é porque não sabem escrever.

Inveja dos maldosos.

É sabedoria.

Alguns gastam o vocabulário em comentários que levam à reflexão.

– Você é um idiota!

Pronto.

Escrevem isso como comentário sobre o texto de alguém, tomam uma cerveja, dão um arroto e vão dormir.

Felizes da vida porque mais uma vez filosofaram sob as estrelas no firmamento.

Os quase “jênios” sempre se arriscam um pouco mais.

Com comentários com a profundidade de uma piscina para bebês, adoram expressões sábias, sofisticadas e de grande sensibilidade como “coliformes fecais”, “esquerda caviar”, “petralhas”…

Acham o máximo e assim se destacam entre os seus.

Não tem escapamento.

Opa, perdão!

Não tem escapação.

É o preço que se paga por viver entre pessoas muito bem informadas, com muito conhecimento.

Diferenciadas.

Doutores.