Por Ronaldo Souza
Tão claro quanto a luz de um dia ensolarado do Nordeste, vivemos um momento em que reina a mediocridade.
O Brasil atual pertence a eles, os medíocres.
Comandantes e comandados.
Ganharam corpo e a mediocridade, que costumava ser mais recatada, está num momento de grande resplendor.
Estamos em tempos de mediocridade resplendorosa.
É o resplendor brega, sobretudo de uma classe média que busca a qualquer preço ter o que julgam ser sofisticação e requinte daqueles que eles têm como referência; a elite brasileira.
Os enófilos da classe média representam um exemplo irretocável.
E ela, essa mediocridade brega, está mais ativa do que nunca.
A simplicidade não é um objetivo.
Mas deveria ser.
A busca por ela poderia nos trazer maior capacidade de reflexão para vermos a beleza e a sabedoria do simples.
Quem sabe assim encontraríamos a forma para nos afastarmos de vez dos diferenciados que circulam entre nós, essa “massa cheirosa” como em parte bem definiu Eliane Cantanhede, então jornalista da Folha, do alto da sua grande sabedoria de membro da elite brasileira.
Diferenciados que vomitam a sofisticação e o requinte que pensam ter para tentar “despertencer” à classe média, no eterno desejo de fazer parte da elite brasileira, por sua vez também altamente “diferenciada”.
Essa busca da sofisticação e do requinte é recurso dos medíocres.
Mas é também nutriente indispensável da sua pobre dieta.
A pompa é necessária.
Fundamental.
Quanto mais “diferenciado” for o segmento social, mais necessária se torna a pompa.
Não é à toa que títulos, funções, homenagens e posições alcançadas adquirem tanta importância nos nossos currículos.
Por que muitos professores precisam dourar a pílula?
Por imaginarem que o simples é simples, por isso alcançável por todos.
E nesse todos não caberia o diferenciado; ele, o professor.
Enganam-se.
Não percebem que é no simples que está a diferenciação que tanto buscam.
Mas ser simples não é para todos.
Ser simples é algo impossível para muitos dos que estão à frente dos destinos do país, nos seus diversos segmentos.
Por isso, a pobreza generalizada, em patamar inimaginável, dos dias atuais.
De uma certa forma, a simplicidade do texto abaixo nos traz de volta a esperança.
É um nocaute no pensar tão pobre.
Por esta razão, além da justíssima homenagem a Iniesta, ficou tão bonito.
Tão tocante.
Tão digno.
—
Fazer o simples
Por Guilherme Cimatti, na coluna De bico com Cimatti
Iniesta oficializa saída do Barcelona depois de 22 anos. A coluna de hoje é sobre o craque espanhol e seu marco no futebol
Cresci idolatrando quem fazia o difícil. Ronaldinho Gaúcho era o nome da minha adolescência. E, com ele, dribles monumentais, gols extraordinários e lances geniais. Vi o craque dando três ou quatro chapéus (muitas sabem o plural da palavra “chapéu” por causa daquele lance pelo Barcelona). Ou seja: ensinou até indiretamente quando fez o impossível.
Você deve ter visto. Tem um comercial antigo em que Ronaldinho acerta três chutes seguidos no travessão. Isso sem deixar a bola cair. Explode no pau e cai na perna do gênio dos cabelos longos. Ele amortece a bola e chuta outra vez. E outra. E outra. Mas essa é a prova de que nem sempre Ronaldinho é educativo. Meu primo Raphael Chiummo, no dia seguinte, lá em 2005, tentou fazer a mesma coisa. Não aprendeu, claro. Tropeçou e caiu. Causando risada nos outros pernas de pau. Eu, inclusive. “Quem não erra é aquele que acerta”, filosofou Raphael depois da presepada.
Após uns anos, Xavi e Iniesta eram o trampolim de Messi. Messi driblava meio mundo assim como Ronaldinho. Xavi e Iniesta limpavam a área. Ajeitavam a bola. Clareavam o jogo. Deixavam Messi o mais livre possível. Desmarcavam o argentino. Ganharam muitos títulos juntos. Descobriram espaços inimagináveis.
Ninguém conseguiria cobrir o espaço de Xavi quando o tempo passou. O Barcelona novamente se reinventou, mas é fácil se reinventar quando ainda se tem Iniesta. Iniesta foi melhor do que Xavi, mas apenas diferente de Messi e Ronaldinho. Diferente na forma de ver o jogo, de dar o show, de trazer o espetáculo para si. Ele é passe; os outros são drible. Ele é assistência; os outros são gols. Ele é inteligência; os outros são decisivos. Existem menos Iniestas do que Ronaldinhos na história. E Iniesta está deixando o Barcelona.
O fantástico poeta Raphael Chiummo tinha razão: “quem não erra é aquele que acerta”. Iniesta sempre fez parecer ser fácil porque quase nunca errou. O futebol, porém, não é tão simples como o meia fazia parecer. Perder o espanhol também não é.