Por Ronaldo Souza
Não é a primeira vez.
Há um movimento cujo claro objetivo é a destruição do conhecimento, da inteligência e da sensibilidade na vida brasileira.
Na ditadura militar quebraram o ensino brasileiro. Entre tantas coisas que fizeram (eliminar disciplinas, por exemplo) as universidades “receberam” alunos e professores infiltrados.
Estranhava-se no passado que a primeira investida era sempre na educação, no conhecimento, na inteligência.
Eu era garoto e vi meu pai, homem de vida simples mas com uma sede de saber enorme (não teve nem curso primário, alfabetizou-se já com dois filhos e escrevia como poucos), ter que queimar livros.
É compreensível que seja assim.
Livros incomodam demais.
É pelos livros que chega o saber e o saber incomoda, machuca, dói.
Através deles você viaja por mundos inimagináveis.
Esses sim, dão asas à imaginação.
Livros subvertem.
Como alimentar com ignorância aquele que lê?
Pensar é transgredir, já diz Lya Luft em um dos seus livros.
E, como ignoram tudo, na cabeça deles transgredir não é ir além, só tem um significado; subversão da ordem e como tal tem que ser proibida e punida.
Por isso agridem.
Grosserias, xingamentos, ofensas, agressões, difamações, assassinatos, são armas da ignorância.
Esse é o mundo deles, a linguagem deles, entre eles, com a qual conseguem se expressar e se comunicar.
Ainda que fira, como odiá-los?
A ignorância deve ser compreendida, não odiada.
Compaixão, sim, este é o sentimento.
Apesar de em desuso, para os que são cristãos deve ser mais fácil.
As pessoas do bem, os humanos direitos, aqueles que têm direito aos direitos humanos (meu Deus!!!), não podem ter a sua paz perturbada.
Sem nenhum pudor ou constrangimento, assumiu-se a ignorância como um condutor de vidas, onde declarações absurdas de tão estúpidas, pipocam todos os dias nos meios de comunicação.
Criam-se seres com incapacidade de reflexão e o pragmatismo mais elementar e rude reina; nem mesmo o mundo da ciência consegue escapar; é só olhar ao lado.
“Se você oferecer algo inteligente para um público que se acostumou a consumir lixo, esse público vai procurar outra fonte para sua combustão cognitiva.”
Gustavo Conde (linguista)
Diversos exemplos, que se incorporaram ao nosso dia-a-dia, podem ser dados, de tão evidentes que são.
A incapacidade de reflexão reina, o óbvio não consegue mais ser óbvio; é algo que se perdeu.
A liberdade maior que se pode ter, ainda que muitos não alcancem essa compreensão, é a liberdade de pensamento e expressão. Mas, como concebe-las se perdemos a capacidade de pensar.
Seríamos livres para que?
A tão falada liberdade de expressão se torna assim a primeira vítima; não há o que expressar quando não há o pensamento, pois é este que constrói a expressão.
O pensamento é a mãe da expressão.
Sem ambos, forma-se uma sociedade de seguidores.
Nada mais.
Que sejam então cortados, eliminem-se os livros.
Você tem quantos seguidores?
A ausência de imaginação os torna reféns da “autoridade” que estiver ao alcance, não interessa quem seja.
Arte e artistas são perseguidos.
Gestos, palavras, ações, absurdamente primários, toscos, o messias se apossa das mentes e passa a conduzi-las.
E, pior de tudo, parece não haver limites.
A Terra é plana.
Só pode ser.
E não há nada melhor para explicar o momento atual, sem dúvida, aterrorizante.
Rompeu-se de vez com todos os parâmetros da inteligência, do conhecimento e do bom senso.
Abandonamos o tempo da delicadeza.
A ignorância assumiu muitas vidas e faz questão de se exibir violenta.
Essa ignorância em pleno século XXI é, por si só, uma violência, e representa a falência da sociedade brasileira.
feliz ano novo.