Realidade paralela

Por Ronaldo Souza

Eu já ia postar a crônica abaixo de Nelson Rodrigues.

Já estava engatilhada.

Escrita em 1968, parece que foi para o momento atual.

No entanto, sem ter porque ter pressa, poderia ser postada qualquer dia.

A noite de ontem (terça-feira, 14.04), entretanto, mudou os meus planos.

Fiquei em estado de choque.

Como diria o homem simples, fiquei matutando.

E cheguei à conclusão de que realmente há pessoas que vivem uma realidade paralela.

Uma realidade paralela pode significar algumas coisas e ter origens diversas.

É possível que tenha origem, por exemplo, em algo que se viveu ou se vive e que gera distúrbios emocionais-afetivos, alguns difíceis de serem contornados.

Olhe para Brasília que você encontrará o melhor exemplo para o que falo.

Pode estar associada também à dificuldades de cognição.

Da mesma maneira, também à busca de objetivos inatingíveis.

O eterno desejo de ser.

Se eu ainda tinha alguma dúvida sobre realidades paralelas, a noite de ontem a levou.

Ontem, às 20:00, uma live de Endodontia me deixou atônito.

Sem sentido.

Nada com nada. 

Desconexão total.

Ao final, muitos fogos em forma de elogios ao “liveiro”.

O que me fez lembrar de um trecho de Nelson Rodrigues no próprio texto aí embaixo.

“Outrora, os imbecis faziam platéia para os ‘superiores’. Hoje, não. Hoje, só há platéia para o idiota”.

Como “coachs” que ensinam a encher os consultórios de pacientes sem jamais terem tido essa experiência, as lives invadiram o país.

Espelho meu, espelho meu, há alguém nesse mundo que não faça live?

Tempos estranhos.

“Eles venceram e o sinal está fechado pra nós”.
Belchior

Leia Nelson Rodrigues. É sempre bom.

Os idiotas confessos

Por Nelson Rodrigues

Antigamente, o idiota era o idiota. Nenhum ser tão sem mistério e repito: — tão cristalino. O sujeito o identificava, a olho nu, no meio de milhões. E mais: — o primeiro a identificar-se como tal era o próprio idiota. Não sei se me entendem. No passado, o marido era o último a saber. Sabiam os vizinhos, os credores, os familiares, os conhecidos e os desconhecidos. Só ele, marido, era obtusamente cego para o óbvio ululante.

Sim, o traído ia para as esquinas, botecos e retretas gabar a infiel: — “Uma santa! Uma santa!”. Mas o tempo passou. Hoje, dá-se o inverso. O primeiro a saber é o marido. Pode fingir-se de cego. Mas sabe, eis a verdade, sabe. Lembro-me de um que sabia endereço, hora, dia etc. etc.

Pois o idiota era o primeiro a saber-se idiota. Não tinha nenhuma ilusão. E uma das cenas mais fortes que vi, em toda a minha infância, foi a de uma autoflagelação. Um vizinho berrava, atirando rútilas patadas: — “Eu sou um quadrúpede!”. Nenhuma objeção. E, então, insistia, heróico: — “Sou um quadrúpede de 28 patas!”. Não precisara beber para essa extroversão triunfal. Era um límpido, translúcido idiota.

E o imbecil como tal se comportava. Nascia numa família também de imbecis. Nem os avós, nem os pais, nem os tios, eram piores ou melhores. E, como todos eram idiotas, ninguém pensava. Tinha-se como certo que só uma pequena e seletíssima elite podia pensar. A vida política estava reservada aos “melhores”. Só os “melhores”, repito, só os “melhores” ousavam o gesto político, o ato político, o pensamento político, a decisão política, o crime político.

Por saber-se idiota, o sujeito babava na gravata de humildade. Na rua, deslizava, rente à parede, envergonhado da própria inépcia e da própria burrice. Não passava do quarto ano primário. E quando cruzava com um dos “melhores”, só faltava lamber-lhe as botas como uma cadelinha amestrada. Nunca, nunca o idiota ousaria ler, aprender, estudar, além de limites ferozes. No romance, ia até ao Maria, a desgraçada.

Vejam bem: — o imbecil não se envergonhava de o ser. Havia plena acomodação entre ele e sua insignificância. E admitia que só os “melhores” podem pensar, agir, decidir. Pois bem. O mundo foi assim, até outro dia. Há coisa de três ou quatro anos, uma telefonista aposentada me dizia: — “Eu não tenho o intelectual muito desenvolvido”. Não era queixa, era uma constatação. Santa senhora! Foi talvez a última idiota confessa do nosso tempo.

De repente, os idiotas descobriram que são em maior número. Sempre foram em maior número e não percebiam o óbvio ululante. E mais descobriram: — a vergonhosa inferioridade numérica dos “melhores”. Para um “gênio”, 800 mil, 1 milhão, 2 milhões, 3 milhões de cretinos. E, certo dia, um idiota resolveu testar o poder numérico: — trepou num caixote e fez um discurso. Logo se improvisou uma multidão. O orador teve a solidariedade fulminante dos outros idiotas. A multidão crescia como num pesadelo. Em quinze minutos, mugia, ali, uma massa de meio milhão.

Se o orador fosse Cristo, ou Buda, ou Maomé, não teria a audiência de um vira-lata, de um gato vadio. Teríamos de ser cada um de nós um pequeno Cristo, um pequeno Buda, um pequeno Maomé. Outrora, os imbecis faziam platéia para os “superiores”. Hoje, não. Hoje, só há platéia para o idiota. É preciso ser idiota indubitável para se ter emprego, salários, atuação, influência, amantes, carros, jóias etc. etc.

Quanto aos “melhores”, ou mudam, e imitam os cretinos, ou não sobrevivem. O inglês Wells, que tinha, em todos os seus escritos, uma pose profética, só não previu a “invasão dos idiotas”. E, de fato, eles explodem por toda parte: são professores, sociólogos, poetas, magistrados, cineastas, industriais. O dinheiro, a fé, a ciência, as artes, a tecnologia, a moral, tudo, tudo está nas mãos dos patetas.

E, então, os valores da vida começaram a apodrecer. Sim, estão apodrecendo nas nossas barbas espantadíssimas. As hierarquias vão ruindo como cúpulas de pauzinhos de fósforos. E nem precisamos ampliar muito a nossa visão. Vamos fixar apenas o problema religioso. A Igreja tem uma hierarquia de 2 mil anos. Tal hierarquia precisa ser preservada ou a própria Igreja não dura mais quinze minutos. No dia em que um coroinha começar a questionar o papa, ou Jesus, ou Virgem Maria, será exatamente o fim.

É o que está acontecendo. Nem se pense que a “invasão dos idiotas” só ocorreu no Brasil. Se fosse uma crise apenas brasileira, cada um de nós podia resmungar: — “Subdesenvolvimento” — e estaria encerrada a questão. Mas é uma realidade mundial. Em que pese a dessemelhança de idioma e paisagem, nada mais parecido com um idiota do que outro idiota. Todos são gêmeos, estejam uns aqui, outros em Cingapura.

Mas eu falava de que mesmo? Ah, da Igreja. Um dia, ao voltar de Roma, o dr. Alceu falou aos jornalistas. E atira, pela janela, 2 mil anos de fé. É pensador, um alto espírito e, pior, uma grande voz católica. Segundo ele, durante os vinte séculos, a Igreja não foi senão uma lacaia das classes dominantes, uma lacaia dos privilégios mais hediondos. Portanto, a Igreja é o próprio Cinismo, a própria Iniqüidade, a própria Abjeção, a própria Bandalheira (e vai tudo com a inicial maiúscula).

Mas quem diz isso? É o Diabo, em versão do teatro de revista? Não. É uma inteligência, uma cultura, um homem de bem e de fé. De mais a mais, o dr. Alceu tinha acabado de beijar a mão de Sua Santidade. Vinha de Roma, a eterna. E reduz a Igreja a uma vil e gigantesca impostura. Mas se ele o diz, e tem razão, vamos, já, já, fechar a Igreja e confiscar-lhe as pratas.

Cabe então a pergunta: — “O dr. Alceu pensa assim?”. Não. Em outra época, foi um dos “melhores”. Mas agora é preciso adular os idiotas, conquistar-lhes o apoio numérico. Hoje, até o gênio se finge imbecil. Nada de ser gênio, santo, herói ou simplesmente homem de bem. Os idiotas não os toleram. E as freiras põem short, maiô e posam para Manchete como se fossem do teatro rebolado. Por outro lado, d. Hélder quer missa com reco-reco, tamborim, pandeiro e cuíca. É a missa cômica e Jesus fazendo passista de Carlos Machado. Tem mais: — o papa visitará a América Latina. Segundo os jornais, teme-se que o papa seja agredido, assassinado, ultrajado etc. etc. A imprensa dá a notícia com a maior naturalidade, sem acrescentar ao fato um ponto de exclamação. São os idiotas, os idiotas, os idiotas.

E por falar em localizador foraminal… 2ª parte

Por Ronaldo Souza

Pelo que observamos nas imagens acima, como é possível estabelecer precisão com “segurança de 100% na localização do limite CDC” se em um mesmo canal há grande variabilidade na extensão do cemento e, portanto, diferentes pontos onde ele se encontra com o canal dentinário?

Essa frase foi dita já no final do texto anterior, E por falar em localizador foraminal…, de onde eu trouxe também a imagem.

A primeira coisa então que temos que entender é que existem alguns limites CDC no mesmo canal e não somente um.

Como querer precisão nessas condições?

Voltemos à frase que diz que “para que o localizador tenha a eficiência desejada, é necessário que o instrumento atinja o forame…”.

Por que ele tem que atingir o forame?

Graças à complexidade da anatomia naquele segmento do canal, o localizador não é capaz de fazer a leitura perfeita, aquela que todos desejam e dizem existir.

Então ele precisa ir até o forame apical e de lá perguntar ao endodontista.

– Cheguei. Já estou aqui no forame apical e pelo caminho fui vendo que existem alguns pontos em que a dentina se encontra com o cemento. Qual deles escolho para você registrar aí como seu limite CDC? Ou você prefere que eu recue de acordo com o protocolo que você segue?

Qual seria, por exemplo, o limite que o localizador “escolheria” para você na imagem acima à direita; 1,5 mm ou 2,1 mm?

E lembre que estamos vendo somente dois, por conta do plano bidimensional.

O que fazem nessa hora?

Daquela medida registrada pelo localizador no forame, recua-se o necessário de acordo com o limite que o profissional usa, geralmente a depender da escola que ele segue.

Numa grande quantidade de vezes, esse recuo é de 1 mm.

O CT será então 1 mm aquém do registro do localizador.

Confere?

Ou você conhece alguém que usa 0,5 aquém nos pacientes jovens e 0,7 nos pacientes idosos, como detalhou Kuttler em 1955?

Sabendo-se que essas medidas representam médias e, portanto, existem inúmeras outras, como 0,2 ou 0,3 ou ainda 0,8 e 0,9, algum localizador registra assim o limite CDC?

Posso lhe fazer uma pergunta?

Por que inicialmente foram chamados de localizadores apicais e agora são chamados de localizadores foraminais?

Por uma razão bem simples!

Qual era a ideia?

Além da constrição apical no limite CDC, o registro da diferença de impedância entre os tecidos pulpar e periodontal permitiria a “segurança de 100% na localização do limite CDC”.

Isso não se confirmou.

Era preciso então ir ao forame apical para, de lá, recuar e estabelecer o comprimento de trabalho.

Por isso o nome localizadores foraminais, que é o que eles fazem; localizar o forame.

Reconheceu-se que localizar o limite CDC, objetivo para o qual foram criados, é impossível!

Como localizar com precisão de 100% algo que não existe?

Você escreve na ficha clínica do seu paciente limite CDC ou comprimento de trabalho?

A precisão desnecessária

Voltemos à frase “por décadas, trabalhamos além do forame apical sem saber”.

Uma evidente crítica à possibilidade de a radiografia nos dar a falsa impressão de estarmos dentro do canal.

Ora, se “para que o localizador tenha a eficiência desejada, é necessário que o instrumento atinja o forame…”, ele já está fora do canal.

Fora do canal, ele já está nos tecidos periapicais!

Se alguém imagina o contrário, desconhece anatomia apical.

Observe a figura acima. A lima está “dentro” do forame, porém, vista numa visão mais próxima na figura abaixo, ela aparece dentro do forame sob a perspectiva da parede que está “atrás” dela (como se fosse a face palatina), mas está 1 mm fora sob a perspectiva da parede anterior (como se fosse a face vestibular).

E o que dizer das imagens na figura abaixo, do trabalho de Blaskovic-Subat e colaboradores?

No forame''

A radiografia nos daria “uma falsa impressão do instrumento dentro do canal, pela angulação e formação do halo apical”.

Verdade.

Para os mais jovens, o halo de que se fala corresponde à quantidade de tecido mineralizado que está “por trás” da lima nas imagens acima, cuja extensão é mostrada pela seta dupla preta pontilhada (letra C).

Pela radiopacidade desse tecido “em volta e acima” do instrumento que apareceria na imagem da radiografia periapical, imaginaríamos que o instrumento está dentro do canal, quando, na verdade, está fora.

E o que nos diria o localizador foraminal?

Pela parede “palatina” ele ainda está ligeiramente aquém da abertura foraminal, portanto, “dentro do forame”, mas pela parede “vestibular” ele está além do forame apical.

Aí o localizador acionaria o alerta.

– Doutor, muito cuidado! Pela parede “palatina” o instrumento ainda está ligeiramente aquém do forame e pelas proximais, mesial e distal, ligeiramente fora. Mas pela parede “vestibular” ele está completamente além do forame apical, portanto, nos tecidos periapicais.

É assim?

Estou enganado ou posso dizer que não é assim que ele “diz” ao endodontista?

Sendo assim, mesmo com o localizador e sua “precisão”, não teríamos ainda a possibilidade de trabalhar “por décadas… além do forame apical sem saber”?

E que história é essa de que só estamos em tecidos periapicais quando estamos além do forame apical?

Qual é o tecido que invagina e preenche o canal cementário?

Coto pulpar

O ligamento periodontal. Observe como é ele que penetra no canal cementário.

Ali é tecido periodontal apical. Sendo assim, o instrumento não precisa estar além do forame para estar em tecido periapical.

E que fosse

Digamos, porém, que existisse um único limite CDC e este fosse detectado pelo localizador com precisão.

Seria ótimo, sem dúvida.

Mas, para que?

Duas questões devem ser consideradas.

  1. A ampla, total e irrestrita ampliação foraminal que fazem em todos os tratamentos endodônticos
  2. A enorme quantidade de material obturador que jogam nos tecidos periapicais.

Surplus''

 

Surplus'''

Como pode alguém que preconiza, ensina e estimula isso falar de cuidados e preocupações com os tecidos periapicais?

Como explicar o Glória nas Alturas aos precisos localizadores e as cabecinhas balançando no amém, amém, amém ao “surplus”?

Impressiona o descompromisso com o conhecimento!

Aceitemos o limite CDC como a fronteira natural entre dentina e cemento.

Seria ali a fronteira entre o que se considera o campo de ação do endodontista, canal dentinário, e os tecidos periapicais.

Um dos grandes pecados dos deuses da endodontia moderna é que falam mais de instrumentos e aparelhos do que de Endodontia.

Daí o desconhecimento generalizado que se vê hoje.

Precisamos entender que era esse limite que ditava os procedimentos do tratamento endodôntico.

Se certo ou errado é outra questão.

Não se trata de concordar ou discordar da concepção, mas de entender.

A proposta do localizador era, por se imagina-lo preciso na detecção do limite CDC, não traumatizar tecidos adjacentes, aqueles que não estariam inseridos no contexto do preparo e obturação do canal.

Lembre que, concordando ou não, o canal cementário não era incluído no preparo do canal nem na obturação e muito menos os tecidos periapicais.

A louvada precisão de 100% do localizador significa então que você vai usar uma ferramenta para detectar com exatidão o limite CDC para logo em seguida destruí-lo com a ampliação foraminal e ainda por cima fazer um “surplus“.

Não é um espetáculo de inteligência?

Por que todo esse deslumbramento e interesse em disseminar uma ferramenta que “detecta” o limite CDC com precisão de 100%, se na “excelência em endodontia”, da qual se fala todo dia, invadem e destroem a fronteira natural entre cemento-dentina-canal-tecidos periapicais em todos os tratamentos endodônticos?

Por que louvam tanto a importância e necessidade da precisão do localizador se destroem o limite que ele “registra” com precisão e é por ali que invadem os tecidos periapicais com material obturador?

Não percebem a contradição?

Limite arbitrário

As setas brancas na figura acima são do artigo de Blascovic-Subat, as vermelhas eu acrescentei.

Qual é o ponto zero do forame, C ou D?

Quando chegar em C, o localizador já faz o registro sonoro acusando que chegou no ponto zero, ou somente quando chegar em D?

Ou no meio do caminho?

Quem sabe um pouco mais acima ou um pouco mais abaixo?

Qual é o CT mais utilizado?

1 mm aquém.

Não é isso que a maioria faz, recuar 1 mm?

Então, na verdade, não se usa um limite preciso e sim arbitrário para se determinar o comprimento de trabalho.

Vai-se ao forame apical (ponto zero) com o localizador foraminal e de lá se faz o recuo de acordo com o protocolo da escola que o profissional segue.

Se é assim, você pode usar a radiografia periapical.

Vai ao forame (onde precisa ir o localizador foraminal), faz a radiografia (usa a imagem, o localizador usa o som) e de lá recua 1 mm.

“É a economia, estúpido!”

Foi o que disse Bill Clinton, ex-presidente dos Estados Unidos, quando quis chamar a atenção do mundo para o fato de que a economia era o grande problema.

É a anatomia, estúpido!

Tenho duas perguntas.

  1. Qual dos dois é preciso, radiografia periapical ou localizador foraminal?
  2. Qual dos dois é mais preciso?

Qual é a pergunta mais adequada?

Você consegue perceber que muita coisa do que dizem não faz sentido?

São palavras soltas, sem conexão com a realidade da Endodontia.

Já ouviu falar de blindagem do canal, qualificação da dentina, remodelação foraminal…?

…com frequência, se processa uma separação definitiva entre o falado e o vivido, e a ciência se torna um jogo de conceitos… Malabarismo verbal, virtuosismo conceitual.
Rubem Alves – Conversas com quem gosta de ensinar, 2002

“Quando o navio afunda, os ratos são os primeiros…”

Por Ronaldo Souza

“Por que será que toda vez que a coisa aperta Moro some? Sem a toga, vão embora algumas coisas. A valentia é a primeira. O recurso é sempre se esconder…

Esse é um trecho de um brevíssimo comentário que fiz no dia 30/03 no FaceBook.

No dia 31/03, um dia depois, leio que “Moro confronta Bolsonaro e autoriza uso da Força Nacional pelo Ministério da Saúde”.

Perdi as contas de quantas vezes já falei aqui (há anos faço isso) sobre o ex-juiz que desonrou a sua categoria, o país, mas que desonra acima de tudo a raça humana.

Já tive oportunidade de dizer que ele é o pior caráter que existe entre os ministros do governo.

Bolsonaro sabe disso. Aliás, o que também já disse aqui.

Bolsonaro, também covarde e oportunista (eles se identificam como iguais, por isso são naturalmente assimiladas as rasteiras e traições entre eles), sabe disso mais do que ninguém.

O tempo todo Bolsonaro soube que tinha um traidor dormindo com ele.

A mulher de Moro agora anda dizendo que apoia o ministro da Saúde

A traição do ex-juiz, “conje” dela, agora se manifesta abertamente e por diversos canais.

Natural.

Ratos pegam o que está ao alcance.

Como ratos que farejam à distância o queijo que surge de repente, Moro observou a fragilidade de Bolsonaro nesse momento.

Percebendo que estava fora da mídia e que a grande estrela agora é Mandetta, o ministro da Saúde, promoveu o espetáculo do esquema do Ministério da Justiça à disposição do ministro estrela.

Não é hora de falar do político Mandeta, que goza da popularidade que Moro um dia experimentou.

A sua história política não o recomenda, mas há uma diferença fundamental entre ele e Moro, colega seu na Esplanada dos Ministérios.

Até pelo momento que vivemos, dispenso-me de qualquer comentário sobre o homem e o político e me atenho à sua condição de ministro da Saúde.

Apesar de suas fraquejadas, expressão que o Capitão Corona que ocupa a cadeira presidencial já utilizou para se referir à sua própria filha e característica pessoal dele, talvez seja difícil acusar Mandeta como médico à frente do ministério da Saúde nesse momento.

Até que se prove o contrário.

Bateu de frente com o Capitão Corona, manteve as ações que estavam determinadas pelo seu ministério, enfim, vem tendo um comportamento que em nada se assemelha à covardia e oportunismo do “conje” de Rosângela Moro.

Covarde, frio, calculista, carreirista e de olho em uma cadeira do STF, prometida pelo homem que “não é presidente mais” (segundo o filósofo haitiano), todo esse tempo Moro agiu como um capacho de péssima qualidade do presidente que nunca governou e não será agora que vai governar.

Até porque, como disse o filósofo haitiano, ele “não é presidente mais”.

Agora como ministro da justiça, tal qual como foi como juiz federal, Moro acobertou todas as jogadas e falcatruas do maior pesquisador da cloroquina, depois de Trump.

Acobertou tudo dos filhos, particularmente Flavio Bolsonaro, do nosso mais recente pesquisador e profundo conhecedor de substâncias químicas na área da saúde, protegeu Queiroz (por onde anda?), milicianos…

Mas, será que vislumbrou que é chegada a hora de pular do barco?

Estará sendo orientado outra vez por alguém?

Seria pelas “câmaras” de televisão? (como do alto de sua cultura ele chama Câmara [dos Deputados] de câmera, é possível que também faça o contrário, chamar câmeras de câmaras de televisão).

Estaria sendo orientado por determinado setor da imprensa? (já notou como estava desaparecido e de repente começou a aparecer nas coletivas de Mandeta?).

Percebendo o momento de extrema fragilidade e novo surto de desequilíbrio mental do Capitão Corona, Moro aproveita para emitir opiniões e tomar atitudes contrárias às do chefe.

E o que acontece com quem não engole os vômitos do nosso mais recente pesquisador?

Porrada nele!

Agora, o nosso herói nacional está sendo fuzilado (opa, é um perigo usar figuras de linguagem para determinados segmentos da sociedade) pela reserva selvagem do Capitão Corona.

Ou recua, como Bolsonaro faz todo dia, ou vai apanhar mais.

E mais do que ninguém, Moro sabe do que é capaz a reserva selvagem do Capitão Corona.

Trair não representa só um verbo para o ex-juiz.

É algo mais.

Alguma novidade?

Só para os idiotas.

Moro é isso.

Nada mais que um covarde oportunista.

E por falar em localizador foraminal…

Por Ronaldo Souza

Volto a um tema sobre o qual já escrevi para que possamos, juntos, discuti-lo outra vez.

Dessa vez divido em duas partes.

Percebem-se facilmente as dificuldades ainda existentes com relação à real dimensão das coisas da Endodontia.

A imprescindibilidade do localizador foraminal é dita com tamanha veemência que alguns endodontistas devem se sentir acuados.

– Quem não tem não pode fazer Endodontia!

Pronto!

A forçação de barra é grande e não é novidade.

Há pelo menos quatro razões para isso.

1. O professor acredita de fato que o localizador foraminal é indispensável

Tudo bem.

2. O cara diz para se colocar num pedestal

Funcionou mais no início. Como poucos tinham, o cara precisava se distinguir e deixar todos impressionados. É sempre assim cada vez que lançam algo novo.

Cria-se uma onda à qual muitos não resistem.

Ainda funciona, agora talvez um pouco menos pois muitos já possuem.

3. Desconhecimento da Endodontia

4. Outros

Esse corre por conta de interesses não vinculados diretamente à Endodontia e sim ao entorno dela.

Vamos lá.

  1. O canal radicular é composto por canal dentinário e canal cementário.
  2. O local onde se encontram o canal dentinário e o cementário ficou conhecido como limite CDC (Cemento-Dentina-Canal).
  3. O tecido que se encontra no canal dentinário é pulpar.
  4. O tecido contido no canal cementário é uma invaginação do ligamento periodontal, portanto, é tecido periodontal.
  5. O campo de ação do endodontista é o canal dentinário.
  6. O limite CDC representa o ponto de maior constrição do canal radicular.

Estes são postulados clássicos da Endodontia.

Dito isso, vamos observa-los mais de perto.

Para começo de conversa, diria que até o item 4 não existem dúvidas nem interpretações que possam ser consideradas corretas ou equivocadas.

De maneira simples, direta e objetiva, podemos dizer; é aquilo e aquilo mesmo.

Dali em diante, talvez não.

O limite CDC é algo consagrado na literatura endodôntica.

A partir do conhecimento sobre os tecidos que o compõem e da definição dos seus limites espaciais, tornou-se muito forte o consenso de que ali era o ponto onde deveriam ser estabelecidos os limites apicais de instrumentação e de obturação dos canais.

Apesar de ser periodontal, o tecido contido no canal cementário ficou conhecido como coto pulpar.

O respeito a esse tecido é algo consagrado na literatura endodôntica.

Traumatiza-lo sempre esteve fora de cogitação.

Daí o conceito de que aquela porção final do canal era sagrada.

Ainda que o coto pulpar não mais estivesse vivo e sim necrosado, sem ou com lesão periapical, aquele limite tinha que ser respeitado.

Mas que limite?

O limite CDC.

“O comprimento de trabalho ideal, acordado entre a unanimidade dos autores desde os estudos de Grove, situa-se no limite CDC. Aparelhos eletrônicos promovem a detecção exata da constricção apical”.
Spironelli, CA

Sabendo-se que o canal cementário, e consequentemente o tecido que o compõe, não representavam o campo de ação do endodontista (este era representado pelo canal dentinário), era na constrição apical (CDC) o limite apical no qual deveria trabalhar o endodontista.

Ali ele instrumentava o canal, ali ele o obturava.

Então o comprimento de trabalho do endodontista era… era qual mesmo?

Limite apical

Observando a tabela acima, onde podemos ver uma pequena amostra da diversidade de comprimentos de trabalho recomendada, parecem ficar claras as dificuldades existentes.

Onde finalmente era esse limite?

Onde finalmente o endodontista deveria “parar”?

Ela nos mostra que a depender do autor e da condição tecidual, os comprimentos preconizados são os mais diversos possíveis.

Como recomendar tantas e tão diferentes medidas?

Como exigir precisão diante de tamanha imprecisão?

Afinal, era o conhecimento da anatomia e dos tecidos que constituem as porções finais do canal ou o “achar” de cada professor?

Em outras palavras, era o conhecimento ou a interpretação dele?

“Não há verdades definitivas. Apenas interpretações sobre a realidade, condicionadas pelo ponto de vista de quem as propõe”.
Nietszche

Apesar de esse tema não ter sido percebido e analisado sob essa perspectiva, a tabela nos diz algumas coisas, mas a principal delas:

Ninguém sabe onde é!

Foi nessa onda que chegaram os localizadores apicais eletrônicos.

E o mundo foi salvo.

Os endodontistas podiam “ver” agora com facilidade a impedância dos tecidos que compunham os canais dentinário e cementário.

Ao “apito” do aparelho, sabíamos; cheguei lá.

Cheguei no CDC.

Aqui é o meu limite.

Aqui é onde devo parar.

Pronto, dali por diante, depois da descoberta dos localizadores apicais eletrônicos, finalmente o coto pulpar podia descansar em paz. Estava definitivamente resguardado.

Finalmente, a medida exata, a precisão com que tanto sonháramos.

Saímos mundo afora cantando a oitava maravilha do mundo aos quatro ventos.

Baixaram um decreto.

“A partir de agora, quem não usar localizador apical eletrônico está ultrapassado”.

Pronto!

Mas o mundo não é perfeito.

O mundo da Ciência menos ainda.

Começaram a perceber que não era exatamente daquele jeito.

Ainda existiam problemas, dificuldades a serem contornadas e por razões diversas percebeu-se que a precisão ainda não tinha sido alcançada.

Se já tínhamos avançado para a impedância, avançávamos agora para a frequência.

Ângelo CT 1 fig. 2

Agora sim!

Definitivamente aceitos e cantados em prosa e verso por profundos conhecedores da Endodontia, era hora de seduzir o mundo.

Novos aparelhos, novos conhecimentos, novos…

Sim, mas… e a exatidão?

“A nova geração dos localizadores eletrônicos foraminais nos dá uma segurança de 100% na localização do limite CDC”.

Você ainda tem alguma dúvida?

Claro que não.

Como poderíamos, diante de 100% de segurança?

Vamos adiante.

Ser ou não ser! A anatomia é a questão

O encantamento geral terminou sendo inevitável.

Ouve-se falar das maravilhas desses novos aparelhos em todos os lugares.

Cursinhos de endodontia, imersão, vídeos, lives…

Espelho meu, espelho meu, há alguém nesse mundo que não faça live?

Sem dúvida, o localizador é mais um recurso muito bem-vindo e importante para o tratamento endodôntico.

A questão, mais uma vez, é a conotação que deram e dão. Querem por precisão absoluta onde não existe.

Há muito tempo os estudos de anatomia já mostram as peculiaridades dos canais, particularmente no terço apical.

“A constrição do canal só pode ser observada na secção adequada de um corte histológico e este é o único método que permite a determinação do comprimento de trabalho”.
Langeland, K. 1995

Se você ainda não leu Os limites na Endodontia, convido-o a fazer isso para nos entendermos melhor.

Trago de lá a imagem abaixo.

Limites

A Ciência tem um péssimo hábito; mostrar a fragilidade das tolas certezas.

Você já parou para pensar o que significa uma “segurança de 100% na localização do limite CDC”?

Observe nas figuras acima que há dois pontos onde se encontram o Cemento-Dentina-Canal (CDC) em cada canal, apontados por setas em verde e vermelho.

Observe também que, como numa radiografia, temos imagens bidimensionais, o que nos faz deduzir pela existência de mais desses pontos na tridimensão.

Pelo que observamos nas imagens acima, como é possível estabelecer precisão com “segurança de 100% na localização do limite CDC” se em um mesmo canal há grande variabilidade na extensão do cemento e, portanto, diferentes pontos onde ele se encontra com o canal dentinário?

“A constrição apical parece ser mais um mito do que uma realidade”.
Walton, R. Princípios e Prática em Endodontia – 1997

“A constrição apical geralmente não existe”.
Wu, MK et al. O Surg O Med O Pathol 2000

“A localização clínica do limite CDC é impossível”.
Ponce, EH e Vilar Fernández, JÁ. J Endod, 2003

“Os nossos resultados indicam que o limite CDC e a constrição apical são dois pontos distintos e que o diâmetro do canal no CDC é sempre maior do que o da constrição apical”.
Hassanien, EE et al. J Endod Abr 2008

A tecnologia se superou.

Ela consegue nos dar “uma segurança de 100% na localização” de algo que não existe.

Não é sensacional?

Anatomia é aquela coisa que douramos quando convém.

As maravilhas do microscópio não seriam tão maravilhosas (a redundância é intencional) se não fosse o sistema de canais.

Sistema de canais!!!

O encantado mundo dos canais invisíveis, istmos, canais laterais…

Que maravilha é pertencer ao maravilhoso (outra vez) mundo da microscopia, onde tudo vemos, onde tudo é possível.

Por outro lado, esse maravilhoso, belo, complexo, impossível, indomável sistema de canais, torna-se pequeno quando o dominamos com um único instrumento, em 40 minutos, em sessão única.

Uma coisa menor, desimportante, à qual impomos a capacidade que nos foi dada pelos deuses da Endodontia de dominar e nos exibirmos diante de exigentes plateias, vomitando o nosso domínio da anatomia.

O maravilhoso, belo, complexo, impossível, indomável sistema de canais, toda essa grandeza então se ajoelha diante da nossa estupidez.

Oh, anatomia, como pretendes ser relevante se és tão desconhecida e desprezada?

Chora o poeta.

Diretor do Eisntein desabafa: “Estamos na época da medicina BBB, feita por votação”

Brasil 247

“Estamos na época da medicina BBB, feita por votação. Medicina e pesquisa de rede social. Você não consegue mais não dar cloroquina para um paciente meio grave. A família pressiona e, se você não der, no dia seguinte você não é mais o médico.” O desabafo é do médico Luiz Vicente Rizzo, diretor superintendente de pesquisa do Hospital Israelita Albert Einstein

O diretor superintendente de pesquisa do Hospital Israelita Albert Einstein, Luiz Vicente Rizzo, desabafa sobre o desastre causado por Jair Bolsnonaro na medicina no Brasil: “Estamos na época em que a medicina está sendo feita por votação. Medicina e pesquisa de rede social. Você não consegue mais não dar cloroquina para um paciente meio grave. A família pressiona e, se você não der, no dia seguinte você não é mais o médico.”

Ele relatou à jornalista Cláudia Collucci da Folha de S. Paulo a pressão que as instituições médicas estão sofrendo para ampliar o uso da hidroxicloroquina em pacientes com coronavírus.

Rizzo ainda desmentiu afirmações da médica Nise Yamaguchi, que atende no hospital, e o virologista Paolo Zanotto, da USP, que defendem e disseram haver o uso da cloroquina no início da doença. De acordo com Rizzo, o Einstein só indica a substância para pacientes graves, internados na UTI.

“Nenhuma dessas pessoas [Yamaguchi e Zanotto] que está falando de protocolo do Einstein participa de protocolo nosso. Nem de Covid nem de nenhum dos 711 projetos de pesquisa no hospital. Uma coisa é ser médico no Einstein; outra coisa é ser médico do Einstein”, afirmou.

O diretor médico e superintendente do hospital, Miguel Cendoroglo Neto, logo nos primeiros casos um consenso de especialistas do Einstein aprovou o uso do medicamento em pacientes graves. Ele adverte, entretanto, “que essa proposta terapêutica é dentro do que a gente chama de off label, não está na bula desses medicamentos, não está nos ‘guidelines’ das sociedades médicas”. Por isso, defende ele defende que “a família precisa ser informada sobre o risco de complicação, de efeitos adversos.”

Ele ainda disse que 70% dos 30 pacientes internados na UTI estão fazendo uso da cloroquina isolada ou associada ao antibiótico azitromicina, os outros não usam por terem alguma contraindicação (como problemas cardíacos).

O médico afirma também que outros medicamentos estão sendo estudados e usados para pacientes graves, como anticoagulantes, anticorpos monoclonais e plasma. “Tudo isso a gente está estudando ainda”, reforçou.

O haitiano já sabia. A manada… segue manada

Por Ronaldo Souza

As perguntas que lhe eram dirigidas nunca tinham resposta.

– Vou ver se resolvo com o Trump. Tenho linha direta com ele, é meu amigo!

– Pergunta pro Guedes!

– Vou ver com o Moro!

– Vou conversar com meu filho.

– Vou perguntar pro Weintraub!

Por que então todos parecem surpresos?

Em um ano e três meses, o que foi que o governo fez além de sucatear e privatizar?

Em um ano e três meses, o que foi que o presidente fez além de ficar discutindo e ofendendo pelo Twitter.

Num momento em que o Planeta Terra trava uma enorme luta contra a pandemia do coronavírus, ele adora dizer que está resolvendo com Trump sobre bloqueio a Cuba, invasão à Venezuela… sem dúvida de extrema importância e urgência nesse momento.

Tantas outras coisas mais poderiam ser ditas, não é mesmo?

“Resfriadinho, gripezinha, histeria…”!

Sabendo que está agradando aos machos da sua reserva selvagem, que o veneram, consegue fazer uma provocação canalha, absolutamente sem propósito, aos repórteres ali no curral que ele criou para seus adoradores na frente do Palácio do Planalto:

“Tão com ‘medinho’ do víurs?”

“Você não é presidente mais”

Diante de uma manada cuja estupidez ganhou vida própria, o “improvável” haitiano foi sábio.

Improvável porque de uma raça inferior e, como os idosos e desprotegidos no Brasil, não merece destino melhor que o abandono.

Ironia do destino, ele, o haitiano, passou, não para a história do Haiti, seu pobre e miserável país, merecedor de todos os males do mundo, mas para a história do Brasil.

Quando estivermos, nós, “eles” não, nada leem, lendo a história do Brasil nos livros dos nossos netos, leremos sobre esse haitiano e o seu diagnóstico cirúrgico desse momento histórico do país.

Ele nunca governou!

O seu desequilíbrio mental não permitiu e não vai permitir.

Infantil, desorientado, medíocre, precisa criar inimigos para viver.

Mulheres, negros, LGBT, indígenas, imprensa…, ele os criou para conseguir continuar vivendo.

Numa cena absurda, inconcebível e inaceitável de ciúme e inveja doentios, o mais novo deles; o ministro da Saúde.

Deixemos de lado qualquer outro tipo de comentário.

É perda de tempo.

O professor e as evidências

Por Ronaldo Souza

Foram 37 anos de consultório.

Os últimos sete, já dividindo um pouco o tempo com a docência, foram uma verdadeira “preparação” para deixa-lo.

E aí, a docência.

Chegava de malas e cuias ao mundo acadêmico.

Um mundo novo.

Deparei-me com coisas que já conhecia, talvez em escala diferente.

Uma delas, a vaidade.

Mas, mais coisa ainda estava por se mostrar.

Fascinado com as possibilidades, fui me encantando.

Aprendi, por exemplo, o valor das evidências.

Ah, o mundo das evidências.

Nada valia se não encontrasse suporte nas evidências.

Mundo admirável!

Como pensar em Endodontia sem evidências?

Exageros aqui, acolá, mas vamos em frente.

2009

Um choque maior.

Um trabalho em que acabara de fazer o último acompanhamento era “negado” pela falta de evidências.

Idealizado e iniciado em janeiro de 1987, ao pé da letra não era um “trabalho científico”, como esses que ganham o Nobel (às vezes chego a pensar que alguns professores de Endodontia já ganharam um), mas tinha normas e procedimentos traçados de acordo com o que eu via na literatura.

Dez anos foi o tempo que levei para fazer e mais outros de acompanhamento clínico/radiográfico (um deles acompanhei durante 21 anos). 

Tudo foi negado num debate ali na minha frente, na minha cidade, num evento promovido por mim.

Com o tempo percebi que outros dos professores que estavam ali (eram 8 convidados de diferentes estados) também o negavam, mas não se pronunciaram naquele momento.

Mais do que natural.

No entanto, um o fizera.

Ressalve-se que, apesar de inúmeros pedidos do auditório, como moderador do debate expliquei que não devia emitir a minha opinião.

Discordando da argumentação utilizada (o Prof. Pécora também), em nome das evidências respeitei e “acatei”.

2011

Dois anos depois, no jantar de um evento de Endodontia em Campinas (SP), um professor do mesmo grupo daquele que negara em Salvador o valor do trabalho (este na verdade, o líder do grupo), entre taças de vinho, falou; “o nosso grupo está começando a repensar o papel da obturação…!!!”.

O trabalho negado estava ali, exposto, na mesa de um jantar, agora com a paternidade do grupo que o rejeitara por falta de evidências.

A minha mente fez uma rápida viagem e não foi capaz de encontrar nenhuma evidência surgida naquele espaço de tempo entre 2009 e aquele momento, 2011, que justificasse tão rápida mudança.

Calei.

Os anos não se passam à toa, pelo menos para alguns.

A vida ensina a ouvir.

E a falar somente na hora certa.

No outro dia eu ia participar de um debate com ele e outro colega.

Ao voltar para o hotel depois do jantar, mudei a aula e preparei um momento especial.

Na aula prévia ao debate, houve um momento em que me dirigi a ele, e com a mão sobre seu ombro, disse:

– Professor…, sei que o seu grupo é sério e estudioso (ainda os achava sérios) e por isso você não é capaz de imaginar a alegria que tive ontem no jantar ao lhe ouvir dizer que vocês estavam ‘repensando o papel da obturação’, você não sabe o tamanho da alegria que senti (reforcei), porque isso eu já sei e digo há 24 anos.

Nessa hora eu já tinha saído de perto dele e estava começando a mostrar o trabalho aos demais professores convidados e colegas que estavam no auditório.

Um amigo e colega (do meu grupo) me disse depois que fui agressivo, como ele nunca me tinha visto ser.

De fato, fui, como nunca tinha sido.

Mas precisava ser.

2014

Eu, que tinha ficado decepcionado com a postura do líder logo após ter estado em Salvador (um dia falo sore isso), convidei-o outra vez para vir ao de 2014. Ainda acreditava nele como professor.

E ele veio.

2016

Convidado do CIOBA (Congresso Internacional de Odontologia da Bahia), o mesmo professor que me dissera em 2011 que o grupo estava começando a repensar o papel da obturação, na minha “cara”, disse:

– Garanto que aí na cabecinha de vocês (literalmente assim), vocês pensavam que eu ia dizer que a obturação desempenha o papel mais importante… Não, a obturação não faz esse papel…

Pronto.

Assumiram de vez a paternidade da concepção que há 29 anos eu vinha estudando e por causa dela tinha apanhado em algumas cidades em que fui.

Fiquei realmente perplexo.

Tamanha foi a perplexidade que não tive reação.

Algo que não acontecerá mais.

Ali percebi do que se tratava e vi com clareza quem eram, de fato, aquelas figuras.

A vida continuou.

E ela costuma pregar algumas peças.

Com o tempo, fui observando, vendo e ouvindo que aquele professor tinha se perdido.

Ele passou a defender determinados “pontos de vista” que não estavam vinculados diretamente à Endodontia e sim ao entorno dela, vínculos que vão além do ensino.

Em momentos assim, as pessoas costumam não se dar conta de que muitos estão percebendo.

Há um episódio recente num evento de Endodontia que evidenciou isso com clareza preocupante e os professores presentes ficaram horrorizados.

O que se pode dizer é que essa é uma opção que não permite retorno, porque a credibilidade fica ferida de morte.

Ao defender determinados pontos de vista com o entusiasmo com que fez e faz (o tempo deverá lhe ensinar a ser pelo menos mais discreto), o professor mostra que perdeu o compromisso com as evidências.

Aulas acontecem todos os dias; é a vida ensinando

A sua nova função não exige que evidências suportem o mais “novo” lançamento.

Mais do que suporte de evidências, a defesa desse novo só pede um marketing bem feito do que está sendo lançado.

O professor desmorona.

O homem se desmoraliza.

Aquele professor (eu), que, em nome da falta de evidências, acatou a negação do seu trabalho (com acompanhamentos radiográficos e tomográficos de até 21 anos), viu de forma decepcionante quem poderia ser uma referência (durante um tempo chegou a ser) mostrar-se como farsa.

A única?

Não, já tinha conhecido outras, mas aquela chocou.

Fiquei mais atento e passei a não me surpreender tanto.

A vulnerabilidade do homem parece dominar a cena nos dias de hoje.

O professor se tornou presa fácil.

Não deve haver retrato mais representativo de uma sociedade do que o professor.

Como também não deve haver retrato mais representativo de uma sociedade decadente do que o professor que desmorona.

Quando ele perde a nobreza de ser professor e se deixa envolver por episódios pequenos, mundanos, o perigo que ronda a sociedade é iminente.

Os reflexos disso nunca foram tão… evidentes como hoje.

Cientistas e pesquisadores de todas as partes desse enorme e belo planeta repetem todos os dias que  a vida é o bem maior da humanidade.

E o que temos visto?

No momento em que o mundo está diante da complexidade de um fenômeno que segundo diversas autoridades só encontra paralelo na Segunda Guerra Mundial, a vida está sendo relegada a um plano inferior.

Apesar de alguns dos maiores cientistas, pesquisadores, infectologistas, médicos, enfermeiros,  farmacêuticos… de todas as partes do mundo estarem apontando todo dia para o comportamento mais adequado para enfrentar a pandemia do coronavírus, estamos presenciando gestos e atitudes de covardia, crueldade e desumanidade jamais vistos nesse país.

Tudo à sombra do cinismo debochado e da canalhice.

Evidências de todas as partes do mundo nos chegam todos os dias.

Dirigentes de cidades, estados e países pediram desculpas pelo erro cometido por terem ignorado a importância das primeiras informações e como consequência amargaram um aumento alarmante de contaminações e mortes.

E o que fazem muitos dos nossos professores?

Na contramão de todas as evidências, tornam-se base importante de apoio ao comportamento insano, descontrolado e sádico de um homem reconhecidamente desequilibrado.

Tornam-se base importante não por inteligência, sensibilidade e bom senso, coisas que há tempos demonstram não possuir, mas porque, por serem professores, têm o poder de arrastar muitos jovens que tendo-os como referências se deixam arrastar pela correnteza da estupidez e da ignorância, como uma nau dos insensatos por mares desconhecidos.

Nunca tantas evidências foram negadas e rejeitadas pelo que chamaríamos, nós, professores e pesquisadores, de achismo.

Um homem, com a sua opinião, com o seu modo único de “ver” as coisas, lidera um movimento absolutamente irracional contra a ciência.

A opinião, única, isolada, sem nenhuma base que lhe dê o mínimo de suporte vence todo o conhecimento, toda a ciência do mundo.

Pasme, insisto, com o apoio de inúmeros professores, muitos dos quais adoram exibir a sua pobre ciência pretensamente respaldada por… evidências.

Professores que em nome da ciência (que hoje se vê, não respeitam) condenam opiniões, agora esquecem o que tanto gostavam de alardear pelos quatro cantos do mundo; que o conhecimento jamais será vencido.

Ainda mais por um homem que, por tudo ignorar, nunca escondeu o seu desprezo por ele.

O futuro dessa história não aguardará os livros que a contarão aos nossos netos.

Esse futuro irá ocorrer muito em breve, quando estivermos de volta às salas de aula.

Serão cobrados por alunos que mantiveram o mínimo de lucidez e não se perderam completamente nessa cegueira pandêmica.

Como falar de evidências daqui por diante?

Como esconder que, na verdade, nunca se importaram com isso?

Como negar que é algo que se usa de acordo com conveniências e necessidades.

Nem sempre farsas e farsantes têm vida longa.

Uma abominação cognitiva

Por Ronaldo Souza

Um homem simples, rude, inculto, um homem que diríamos… do povo.

Um homem que é comum ser ignorado e até desprezado.

Um homem que até pelo seu jeito de falar pode nos trazer risos (que bom), mesmo que seja por curto espaço de tempo nesse momento de dor e sofrimento.

Mas há nele a sabedoria da humildade, tão típica, permitindo-me a redundância, das pessoas humildes.

Essa sabedoria diz a ele que o mundo da ciência recomenda o isolamento social e ele, sabiamente, não ousa desobedecer.

Enquanto isso, pessoas esclarecidas, pessoas do bem, resolvem seguir a orientação de um homem cujo saber reconhecidamente inexiste em qualquer área do conhecimento humano. Um homem que habita há 30 anos no ambiente político e cujo saber político é zero.

Esse segmento da sociedade brasileira sempre se fez presente em momentos delicados da conjuntura sócio-política do país.

A sua sensibilidade tem a profundidade de uma piscina para bebês.

Alguém poderá negar que sabem criar muito bem os seus…cães?

Incapaz de pensar e ter ideias próprias e pressionada pelo desejo de pertencer a estratos superiores na escala social, essa gente sempre foi um poço de ignorância e preconceito.

O que poderá saber o homem que os comanda? Que poder terá ele adquirido para criar e comandar essa legião de desorientados que, como ignorantes fanáticos, desafiam o conhecimento construído ao longo dos anos, num comportamento típico dos fanáticos que, ciclicamente, surgem no mundo?

Engana-se, porém, quem pensa que o mundo nada faz.

O mundo a nada assiste com indiferença.

Em tempos de obscuridade, tem sempre mostrado que fora da Ciência não há salvação.

Apesar dos medos e das incertezas, fiquemos todos tranquilos, da maneira que é e será possível a cada um nesse momento.

E podem ter certeza.

Ao final, a raça humana sairá vencedora.

Mais uma vez.

Ex-ministros da Saúde divulgam nota de repúdio a Bolsonaro: “Vamos pedir à OMS que acompanhe o combate do Covid-19 no Brasil”

Nota de repúdio dos ex-ministros da Saúde contra Bolsonaro

Como ex-ministros de saúde expomos nossa indignação e total discordância com o pronunciamento feito pelo Presidente da República, na noite de 24 de março, em cadeia nacional de rádio e TV.

Vimos a público denunciar os graves efeitos nocivos das posições defendidas pelo presidente da República que procura minimizar e tratar de forma insensata uma pandemia com essas proporções, que já provocou a morte de mais de 18 mil pessoas, no mundo, até o momento.

O Sr. Jair Bolsonaro, principal dirigente do Executivo Federal, negou as evidências científicas que vêm embasando as ações governamentais de combate à pandemia da COVID-19 em todo o mundo e que preconizam o isolamento social como ação de inquestionável relevância para enfrentar a evolução da infecção pelo coronavírus, reduzir o número de infectados e, com isso, possibilitar ganho de eficácia na organização da rede de atenção à saúde e garantir o atendimento aos casos mais graves e diminuir o número de óbitos.

Preocupado em atender interesses estritamente econômicos, propõe uma dicotomia entre o enfrentamento da crise na saúde e na economia.

Os países que têm conseguido os melhores resultados são aqueles que fizeram o isolamento social, garantiram o atendimento à saúde da população e tomaram medidas para manter a renda e ativar a economia. Não há, portanto, dicotomia entre manter a atividade econômica e salvar vidas.

Ao advogar o isolamento vertical, restrito à população idosa e com comorbidades, Bolsonaro considera viável trancafiá-las em casa, sem nenhum contato com familiares, cuidadores, que passariam a circular livremente num ambiente totalmente favorável à disseminação do vírus corona.

Tal postura, além de desmobilizar a população que vem fazendo sua parte, seguindo as orientações da OMS, do próprio Ministério da Saúde, dos governadores, prefeitos, imprensa e líderes do parlamento, fere também, de maneira irreconciliável, ao pacto federativo e a autonomia de seus entes.

As medidas implementadas pelo Ministério da Saúde, pelos gestores da saúde, técnicos e profissionais do SUS não podem ser desrespeitadas e precisam ser defendidas.

As vidas dos trabalhadores da saúde, atualmente expostas para salvar nossa população, não podem ser relativizadas em função de interesses da economia.

Além disso, o belicoso presidente confronta e desrespeita o trabalho relevante da imprensa e de outros meios de comunicação, importantes aliados na difusão de informação e esclarecimento da população sobre a COVID-19.

Seu pronunciamento pode resultar em uma sobrecarga do sistema de saúde brasileiro de trágicas consequências, particularmente entre os grupos mais vulneráveis da sociedade.

É necessário que os líderes republicanos se juntem em torno da defesa da vida. Primeiro, para salvar as pessoas, e depois para salvar a economia.

Da nossa parte, na condição de ex-Ministros da Saúde, vamos recorrer à Organização Mundial de Saúde e à Comissão de Direitos Humanos da ONU para que acompanhem o enfrentamento da pandemia de Covid- 19 no Brasil.

Temos compromisso de nos engajarmos no esforço da sociedade brasileira na proteção de nossa população, independentemente de sua condição econômica e social e de sua faixa etária. Nosso dever é preservar a vida de nossos cidadãos.

EX-MINISTROS DA SAÚDE DO BRASIL

Humberto Costa
José Saraiva Felipe
Jose Agenor Alvarez da Silva
José Gomes Temporão
Alexandre Padilha
Arthur Chioro
Marcelo Castro