Bahia, um grande momento, um time especial

Por Ronaldo Souza

Olho para trás e vejo uma história gloriosa.

De forma resumida, único Bicampeão Brasileiro do Norte e Nordeste e um dos poucos do Brasil, 7 vezes campeão regional e 48 vezes campeão baiano.

Não é pouca coisa.

As nossas homenagens a todos que contribuíram para a construção dessa grandeza; jogadores, comissões técnicas, diretorias, funcionários e essa torcida única.

Permito-me citar particularmente Osório Villas Boas, presidente do Bahia, e sua diretoria, pelo título nacional de 1959 e Paulo Maracajá, também presidente do Bahia, e sua diretoria, pelo de 1988.

Momentos diferentes e especiais do clube, na sua trajetória de muitas e grandes conquistas.

Dou um salto no tempo e caio hoje, no dia 01 de janeiro de 2020, quando o Bahia faz 89 anos.

Outro momento.

O Bahia sempre foi grande dentro de campo, mas fora das quatro linhas não tinha a mesma grandeza. Ainda faltava ao clube algumas coisas, entre elas uma infraestrutura que lhe conferisse maior solidez.

Viveu dias difíceis, dias que pareciam não ter fim.

Como foi bonito e inspirador ver o que fez a sua torcida.

Como bem disse o jornalista Juca Kfouri, jamais nenhuma outra fez igual.

Mais de 50 mil pessoas foram às ruas de Salvador numa manifestação brigar pelo time com a campanha “Devolva meu Bahia”.

Num momento duro, uma intervenção judicial permitiu que Fernando Schmidt assumisse a presidência interinamente.

Era o primeiro passo.

Nova eleição, novo modelo.

Lá vai o Bahia mostrar outra vez ao Brasil como é que se faz, lá vai o Bahia mostrar outra vez o seu pioneirismo.

Pela primeira vez no país uma torcida elegia o presidente do seu time.

Democracia.

Nossa, como foi bonito e outra vez inspirador.

Marcelo Sant’Ana e sua diretoria são eleitos.

Como uma Fênix, o Bahia renascia.

Marcelo Sant’Ana e sua diretoria faziam surgir um novo horizonte.

Nunca se falou tanto em “projeto do Bahia”.

Como um mantra, cada novo jogador e cada novo técnico que chegava dizia que entre as razões pelas quais escolhera vir para o Bahia estava o seu projeto.

Os incrédulos, entre os quais eu, torciam o nariz.

Marcelo Sant’Ana e sua diretoria davam uma nova cara ao clube e foram fundamentais para aquilo que eu começava a suspeitar que de fato existia; o projeto do Bahia.

Projeto que se mostrou com uma clareza estonteante na eleição e posse da nova diretoria.

Ali percebi que de fato havia, pela primeira vez na sua história, um projeto em andamento, o projeto do Bahia.

Assumiram Guilherme Bellintani e sua diretoria.

Se já em 2017, fruto da gestão Marcelo Sant’Ana, o Bahia ocupava o cenário nacional como time que voltava a estar entre os grandes, em 2018 e 2019 isso não só se consolidou, como deu um grande salto.

Guilherme Bellintani e sua diretoria representam o novo, mas não o novo de idade e sim o novo pelo pensamento jovem, moderno, competente e digno. 

Aquele time grande dentro de campo, de tantas glórias e conquistas memoráveis e inesquecíveis, é agora grande também fora dele.

De casa nova, ainda não completamente pronta (imagem lá em cima), o novo Centro de Treinamento, que carinhosamente é chamado de Cidade Tricolor, terá o nome de Centro de Treinamento Evaristo de Macedo, numa bela homenagem ao técnico que comandou o time do título de 1988, será um dos mais completos e modernos do país.

Pela primeira vez na sua gloriosa história, o Bahia é hoje modelo de gestão.

Um Bahia que, já em outro patamar, ensaia voltar a ter os grandes times que já teve em campo, mas, sobretudo, que quando sai dele continua grande, maior até, porque extrapola os limites do gramado.

Mais uma vez mostrando ao Brasil como é que se faz, volta-se para a sua torcida, para o seu povo, e o vê como ele é, nas suas diversas formas, nas suas diversas cores, nas suas diversas raças. O seu pioneirismo agora nos enche de orgulho com suas campanhas e ações sociais num momento em que, mais do que nunca, tanto estamos precisando.

Parabéns, Bahia.

Hoje é seu aniversário, mas nós torcedores é que ganhamos presentes. Ser seu torcedor é um deles.

Hoje é seu aniversário, mas não só os seus torcedores, o povo de um estado está feliz por se ver tão bem representado por um clube de futebol.

Hoje é seu aniversário, você, um exemplo para o futebol brasileiro.

A Terra é plana

Por Ronaldo Souza

Não é a primeira vez.

Há um movimento cujo claro objetivo é a destruição do conhecimento, da inteligência e da sensibilidade na vida brasileira.

Na ditadura militar quebraram o ensino brasileiro. Entre tantas coisas que fizeram (eliminar disciplinas, por exemplo) as universidades “receberam” alunos e professores infiltrados.

Estranhava-se no passado que a primeira investida era sempre na educação, no conhecimento, na inteligência.

Eu era garoto e vi meu pai, homem de vida simples mas com uma sede de saber enorme (não teve nem curso primário, alfabetizou-se já com dois filhos e escrevia como poucos), ter que queimar livros.

É compreensível que seja assim.

Livros incomodam demais.

É pelos livros que chega o saber e o saber incomoda, machuca, dói.

Através deles você viaja por mundos inimagináveis.

Esses sim, dão asas à imaginação.

Livros subvertem.

Como alimentar com ignorância aquele que lê?

Pensar é transgredir, já diz Lya Luft em um dos seus livros.

E, como ignoram tudo, na cabeça deles transgredir não é ir além, só tem um significado; subversão da ordem e como tal tem que ser proibida e punida.

Por isso agridem.

Grosserias, xingamentos, ofensas, agressões, difamações, assassinatos, são armas da ignorância.

Esse é o mundo deles, a linguagem deles, entre eles, com a qual conseguem se expressar e se comunicar.

Ainda que fira, como odiá-los?

A ignorância deve ser compreendida, não odiada.

Compaixão, sim, este é o sentimento.

Apesar de em desuso, para os que são cristãos deve ser mais fácil.

As pessoas do bem, os humanos direitos, aqueles que têm direito aos direitos humanos (meu Deus!!!), não podem ter a sua paz perturbada.

Sem nenhum pudor ou constrangimento, assumiu-se a ignorância como um condutor de vidas, onde declarações absurdas de tão estúpidas, pipocam todos os dias nos meios de comunicação.

Criam-se seres com incapacidade de reflexão e o pragmatismo mais elementar e rude reina; nem mesmo o mundo da ciência consegue escapar; é só olhar ao lado.

“Se você oferecer algo inteligente para um público que se acostumou a consumir lixo, esse público vai procurar outra fonte para sua combustão cognitiva.”
Gustavo Conde (linguista)

Diversos exemplos, que se incorporaram ao nosso dia-a-dia, podem ser dados, de tão evidentes que são.

A incapacidade de reflexão reina, o óbvio não consegue mais ser óbvio; é algo que se perdeu.

A liberdade maior que se pode ter, ainda que muitos não alcancem essa compreensão, é a liberdade de pensamento e expressão. Mas, como concebe-las se perdemos a capacidade de pensar.

Seríamos livres para que?

A tão falada liberdade de expressão se torna assim a primeira vítima; não há o que expressar quando não há o pensamento, pois é este que constrói a expressão.

O pensamento é a mãe da expressão.

Sem ambos, forma-se uma sociedade de seguidores.

Nada mais.

Que sejam então cortados, eliminem-se os livros.

Você tem quantos seguidores?

A ausência de imaginação os torna reféns da “autoridade” que estiver ao alcance, não interessa quem seja.

Arte e artistas são perseguidos.

Gestos, palavras, ações, absurdamente primários, toscos, o messias se apossa das mentes e passa a conduzi-las.

E, pior de tudo, parece não haver limites.

A Terra é plana.

Só pode ser.

E não há nada melhor para explicar o momento atual, sem dúvida, aterrorizante.

Rompeu-se de vez com todos os parâmetros da inteligência, do conhecimento e do bom senso.

Abandonamos o tempo da delicadeza.

A ignorância assumiu muitas vidas e faz questão de se exibir violenta.

Essa ignorância em pleno século XXI é, por si só, uma violência, e representa a falência da sociedade brasileira.

feliz ano novo.

Seguidamente humilhado por Bolsonaro, Moro rasteja

Por Ronaldo Souza

É sempre louvado o homem que luta por seus objetivos e assim parece ter o espírito dos conquistadores.

Alguns deles foram consagrados pela História.

Imagens precisam ser criadas na construção de heróis.

Eu poderia dizer “o homem que luta por seus princípios…”, mas não disse, porque é completamente diferente .

É destino da cobra rastejar, do homem não.

Homens não rastejam por princípios.

Lutam por eles.

Homens rastejam por objetivos.

Por eles desconstroem, destroem, matam.

Alguns deles, diga-se de passagem, têm objetivos muito bem definidos, mas objetivos muito bem definidos nem sempre têm a ver com objetivos nobres.

Sentimentos nobres só existem em homens nobres.

“A estratégia do político Moro de dar a impressão que perdeu pouco, ou que foi vitorioso, foi desmascarada quando o próprio Presidente da República não vetou o Juiz de Garantia, cujo veto parecia questão de honra para o político Moro”.

Foi essa a avaliação do advogado criminalista Antonio Carlos de Almeida Castro, Kakay, sobre a sanção do pacote anticrime de Sérgio Moro.

Há um objetivo muito bem definido por Moro, que por ele continuará rastejando.

Esse é o seu destino, isso é o que lhe resta ser.

Mas não se iluda.

O homem que rasteja é frio e calculista.

Os seguidores de Moro já começam a chamar o mico de Bolsonaro traidor.

Quando chegar o momento, serão os bolsominions que irão chamar Moro de traidor.

Moro vai saber esperar a hora da rasteira.

Entre certos “homens”, é assim que funciona.

Luzes do Natal

Por Ronaldo Souza

Não me lembro de ter feito assim anteriormente.

Como não tinha sido possível fazer a caminhada na praça no cedo da manhã, fiz ali pelas 18:30.

Um detalhe.

Era noite de Natal.

A praça é praticamente na porta do edifício onde moro.

Toda iluminada, estava bonita de se ver, mas havia alguma coisa diferente.

Só então me dei conta de que estava vazia, completamente vazia.

A proximidade das ceias tirara as pessoas da praça, mas não era desse vazio que ela estava vazia.

Era de algo bem maior.

O completo não estava completo.

O vazio, muito vazio.

Bateu tristeza.

Era mais um Natal não tão completo, como alguns já vinham sendo desde as primeiras ausências de meus pais, algo que faz parte da vida, com a qual aprendemos a ter a necessária resignação. Eles que moravam mais perto ainda da praça que eu.

Mas se essas ausências incomodam, e como incomodam, a vida nos ensina a ter um lugar especial para elas.

Ali, naquela noite, naquele momento, a tristeza tinha alguma outra razão.

Talvez por ser noite de Natal, tímida, envergonhada, a explicação foi chegando aos poucos. É que esses momentos nos levam a reflexões mais profundas.

Os rios estão bebendo sua própria água, talvez por sentirem que estão vendendo a nossa água, que poderá se tornar algo mais difícil de conseguir.

As árvores estão comendo seus próprios frutos, talvez por sentirem que pouco lhes restará, dizimadas que estão sendo por tantas queimadas.

O Sol não brilha mais, encoberto pela fumaça criminosa da destruição de nossas matas e florestas.

As flores perderam a fragrância porque, sem o Sol da vida, nada lhes resta.

Estamos sendo violentados.

As luzes iluminavam a praça da minha caminhada, mas não havia luz na minha alma.

As luzes iluminavam a praça, mas faltava vida.

Em casa, os mais doces sorrisos me aguardavam.

Nos arrumamos e fomos desejar Feliz Natal aos nossos.

Era noite de Natal.

Paradigmas da Endodontia. 3ª parte

Por Ronaldo Souza

   

A história da Endodontia mostra que inicialmente o canal era instrumentado e aí se seguiam trocas sucessivas de “curativos de demora” (fase da desinfecção), antissépticos que eram colocados e renovados periodicamente até que não houvesse mais nenhum odor desagradável nos canais.

Isso mesmo, o olfato desempenhava papel importante na Endodontia. Quando os curativos eram removidos para a troca, eram cheirados pelo profissional até que nenhum odor existisse mais.

Esta era a hora da obturação.

Em outro momento, o acesso passou a ser o passo inicial do tratamento, tendo na sequência o preparo do canal e finalmente a obturação.

Observe que nas duas formas de dividir as etapas, a parte destinada à “preparação” do canal representa a base da pirâmide, a base do tratamento; instrumentação/desinfecção ou acesso/preparo.

À obturação cabiam as honras de concluir o tratamento, por isso ocupando o ápice do tratamento, o vértice da pirâmide.

Mas não só essas honras lhe eram reservadas.

Desde a publicação de (John) Ingle, o famoso estudo de Washington, todas as honras do tratamento endodôntico couberam à obturação.

Apesar de muito se ouvir que o tratamento era como uma corrente, onde todos os elos têm a mesma importância, ele nunca foi visto, de fato, dessa maneira.

Dê só uma olhadinha nas citações abaixo (existem centenas de outras nesse mesmo tom na literatura) que você não terá nenhuma dificuldade em observar que a obturação, por mais que autores e professores dissessem que todos os passos do tratamento eram iguais em importância, sempre foi vista como o fator determinante do sucesso do tratamento endodôntico.

Cerca de 60% dos insucessos endodônticos são, aparentemente, causados pela obturação incompleta dos canais radiculares.
O objetivo principal da Endodontia é promover um selamento hermético no forame apical e obliteração do canal radicular.
Ingle, 1956

É de observação diária a presença de rarefações periapicais em porcentagem bastante elevada nos canais com obturações incompletas, sem que estes estejam necessariamente infectados.
Bevilacqua

A reparação apical pode ocorrer independentemente da presença de microrganismos, desde que o conduto esteja corretamente obturado.
Paiva e Antoniazzi

Comprovadamente, a sub e a sobre obturação influem no resultado final do tratamento endodôntico.
Soares, IJ e Rocha, MJ

A menos que uma obturação bem adaptada, densa, seja feita, o prognóstico é duvidoso, a despeito de quão bem as outras fases do tratamento tenham sido realizadas.
Nguyen, NT

Os  procedimentos de limpeza e modelagem dos canais têm por objetivo permitir seu preenchimento de maneira  satisfatória  com  um material sintético.
Holtz, AP e Machado, MEL

O êxito final do tratamento endodôntico está condicionado à qualidade da obturação.
Mario Leonardo

A obturação hermética do sistema de canais por meio de materiais biologicamente toleráveis continua sendo a meta do tratamento endodôntico.
Guerisoli, DMZ e cols.

O objetivo da terapia endodôntica é obturar e vedar hermeticamente o sistema de canais radiculares, de modo a possibilitar um selamento biológico.
Michelotto, AL e cols.

De nada adiantarão os cuidados de assepsia, a execução de uma técnica atraumática, o preparo biomecânico cuidadoso, se a obturação for defeituosa.
Mário Leonardo

Não há nenhum juízo de valor em relação às citações, é tão somente a constatação do lugar nobre dado à obturação pela literatura.

Nunca consegui ver o tratamento endodôntico como um procedimento que se divide em três partes, como sempre se estabeleceu.

Não conseguia e não consigo ver, por exemplo, o acesso como etapa diferente à do preparo, como está representado acima na pirâmide da direita.

Quando se faz acesso ao canal já se está fazendo o preparo da cavidade pulpar, na sua porção coronária. Na sequência, será feito o preparo da cavidade pulpar na sua porção radicular, o que é conhecido como preparo do canal.

Sendo assim, acesso e preparo constituem a mesma etapa, aquela em que se faz o preparo da cavidade pulpar, nas suas porções coronária e radicular.

Observe que não estou falando que o tratamento é feito em duas ou mais consultas e sim com momentos diferentes.

Pre-determinar a quantidade de consultas necessárias para que esses dois momentos possam ser bem realizados representa um equívoco diante das possibilidades que existem em qualquer tratamento na área da saúde.

Alguns fatores podem e devem ser observados:

  • Características de cada paciente
  • Características de cada caso
  • Eventuais dificuldades que podem surgir durante o tratamento

Independente disso, o estabelecimento de etapas parece mais sensato quando feito da maneira abaixo:

  • Preparo
  • Obturação

No preparo do canal, são esses os passos:

  • acesso
  • instrumentação
  • irrigação
  • medicação intracanal*

Para simplificar a compreensão desses passos, observe que há um objetivo bem definido; remover o conteúdo do canal.

É particularmente na promoção do reparo em casos com necrose pulpar e infecção do sistema de canais que entra a medicação intracanal.

Devemos  ver essa etapa como o momento de remoção do conteúdo e controle de infecção.

Uma vez que isso é alcançado, ou seja, que a remoção do conteúdo e o controle de infecção são alcançados, o canal vazio se torna um convite à contaminação ou recontaminação. Ele precisa, portanto, ser protegido.

Chega o momento da obturação.

Precisamos então entender o seguinte:

  1. Há um momento em que se trabalha o canal visando o seu esvaziamento, a remoção do seu conteúdo, que constitui a etapa do preparo do canal
  2. Há outro momento, completamente diferente, em que o canal é preenchido, selado para evitar sua contaminação ou recontaminação e esta constitui a etapa da obturação.

Se estivéssemos falando de um ato operatório em Medicina, onde estaria a maior importância? No momento da remoção da causa da patologia ou no momento da sutura?

Não tenho nenhuma dúvida de qual é a sua resposta.

E por que não é assim na Endodontia?

O que é o preparo do canal?

O que acabou de ser descrito; fundamentalmente, a remoção da causa da patologia (lesão periapical), que é a infecção contida no canal, ou, se quisermos dizer da forma mais apropriada, no sistema de canais.

O que é a obturação do canal?

O momento da sutura.

Por que na Endodontia a sutura, representada pela obturação, é mais importante do que a remoção da causa?

Ou não é isso que está dito de diferentes maneiras por diversos autores nas citações lá em cima e em muitas outras?

  1. Por que o travamento perfeito do cone de guta percha sempre foi colocado como momento especial?
  2. Por que a “sutura hermética”, crença e desejo que jamais foram confirmados pelos trabalhos publicados, continua sendo ensinada como fator determinante do sucesso do tratamento endodôntico?

Pensamentos e procedimentos consagrados pelo tempo, mas que nunca foram consagrados pela Ciência Endodôntica.

Nem pelo bom senso.

A Endodontia estava engessada.

Dá para imaginar quantas evidências científicas existem dando respaldo à necessidade de travamento do cone de guta percha como garantia de vedamento hermético ?

Dá para imaginar quantas evidências científicas existem dando respaldo ao uso de determinados cimentos obturadores?

Dá para imaginar quantas evidências científicas existem dando respaldo à necessidade de vedamento hermético?

Dá para imaginar quantas evidências científicas existem dando respaldo à obturação como fator determinante do sucesso do tratamento endodôntico?

Assim como fui repetitivo aqui, também foram e são os inúmeros trabalhos publicados gerando essas “evidências” às quais recorrem vários professores.

Diante de tantas evidências, como ousar enfrentar e contestar o incontestável?

Você entende agora porque tenho dito contestar o incontestável?

Vou fazer uma correção.

Contestar o que parecia incontestável.

Muito além do jardim

Em 2006 foi publicado o trabalho de Sabeti e colaboradores.

Após o preparo de 56 canais de dentes de cães com lesão periapical, eles foram divididos em dois grupos:

  • Grupo controle: os canais de 28 dentes foram obturados com cones de guta percha e cimento AH Plus
  • Grupo experimental: os canais de 28 dentes não foram obturados

Após análise histológica do reparo dos 56 dentes com lesão periapical, os autores concluíram:

“Em suma, este estudo demonstrou que não há diferença no reparo de lesões periapicais entre canais obturados e não obturados, desde que a limpeza e modelagem e o selamento coronário tenham sido realizados. Como não podemos assegurar que o canal foi esterilizado e somos capazes de eliminar microrganismos do sistema de canais infectado, a obturação ainda é recomendada. Isso pode reduzir espaço e nutrição para a multiplicação de microrganismos remanescentes. Concluindo, o insucesso não ocorre pela falha da obturação, mas pela falha da limpeza e modelagem. O sucesso do tratamento endodôntico depende fundamentalmente da eliminação de microrganismos, resposta do hospedeiro e selamento coronário dos canais tratados, que podem fornecer um potencial para contaminação bacteriana futura”.

Sintetizo dessa maneira:

  1. Não houve diferença na cura de lesões periapicais entre os canais obturados e os não obturados
  2. O sucesso do tratamento endodôntico depende fundamentalmente da eliminação de microrganismos, defesa do hospedeiro e selamento coronário dos canais tratados

O insucesso não ocorre pela falha da obturação, mas pela falha do preparo do canal

Você não acha que o resultado desse trabalho é muito intrigante?

Publicado em 2006, por que em 13 anos não houve o interesse que se poderia imaginar por pesquisas e publicações de outros artigos sobre esse tema?

Você não acha que um resultado que diz o contrário do que disse e diz a literatura endodôntica ao longo de mais de 50 anos deveria merecer um grande interesse por parte de outros pesquisadores?

Não mereceria que outros trabalhos fossem feitos na mesma linha?

Ou não interessa saber qual é, de fato, o real papel da obturação no tratamento endodôntico?

Você acha que, apesar de publicados em periódicos importantes, com alto fator de impacto, as evidências resultantes desses artigos respaldando a obturação como fator determinante do sucesso do tratamento endodôntico podem ser fortes?

Surgem assim duas questões relevantes:

  1. Devemos continuar ignorando as evidências que “ameaçam” contestar as “incontestáveis evidências” da necessidade de travamento perfeito do cone de guta percha, vedamento hermético e da obturação como fator determinante do sucesso do tratamento endodôntico?
  2. Devemos considerar o que pode estar surgindo de consistente na Endodontia ou simplesmente seguir encantados com as maravilhas da mais recente e avançada lima, sistema de instrumentação, sistema de obturação, do mais novo cimento obturador…?

Paradigmas da Endodontia. 2ª parte

Por Ronaldo Souza

Nele explico a diferença entre patência apical e limpeza do forame (como eram conhecidos) e
que o objetivo da patência apical (foraminal) é basicamente mecânico e não biológico

Assim terminei a primeira parte do texto “Paradigmas da Endodontia“.

O nele se refere ao artigo The Importance of Apical Patency and Cleaning of Apical Foramen on Root Canal Preparation, que espero você tenha lido. Se não, é só clicar no link aqui em cima.

Publicado há treze anos, veja o que digo na segunda página dele:

“Entretanto, deve-se levar em consideração que a manutenção da patência apical não limpa o forame; só evita que haja bloqueio por entulhamento de raspas de dentina. O forame apical deve ser instrumentado para realmente ser limpo. Em outras palavras, um forame patente não está necessariamente limpo porque patência apical e limpeza do forame são procedimentos diferentes”.

Na sequência, também na segunda página, digo:

“A patência apical é estabelecida durante o preparo do canal com o objetivo de manter o acesso ao forame (objetivo mecânico), mas é importante que após a instrumentação o forame não esteja só patente mas também limpo (objetivo biológico). A lima de patência, que deve ter um diâmetro menor que o forame, provavelmente não fará essa limpeza de maneira adequada. O uso de um instrumento ajustado ao forame e que toque nas paredes do canal certamente será mais bem indicado. Por esta razão, a melhor abordagem seria assegurar a patência apical com um instrumento de menor diâmetro durante a instrumentação do canal e depois limpar o forame com uma lima ajustada às suas paredes”.

Mesmo tendo escrito alguns antes, foi a partir daí que fizemos uma sequência de publicações sobre esse tema, sob a visão da microscopia eletrônica de varredura. Você pode ver pelo menos três deles.

1. Location of the apical foramen and its relationship with foraminal file size – na seção Publicações deste site.

2. Relationship between Files that Bind at the Apical Foramen and Foramen Openings in Maxillary Central Incisors – A SEM Study – clique aqui www.scielo.br/pdf/bdj/v22n6/v22n06a03.pdf

3. Influence of Apical Foramen Lateral Opening and File Size on Cemental Canal Instrumentation – clique aqui  www.scielo.br/pdf/bdj/v23n2/v23n02a06.pdf

Mais recentemente, iniciamos trabalhos com experimentos em animais nessa mesma linha e o primeiro artigo publicado (abril de 2019) foi o de Paula Brandão, minha orientanda no mestrado.

Você pode ler aqui www://link.springer.com/article/10.1007/s00784-018-2628-2

Perceba que no título do artigo consta a expressão “foraminal enlargement”, mas, como se pode ver abaixo no título original na dissertação consta “instrumentação do canal cementário”.

O titulo original da dissertação foi modificado porque alguns periódicos rejeitaram a expressão “instrumentação do canal cementário”, por não constar na literatura endodôntica, numa clara demonstração das idiossincrasias que existem na literatura.

Por conta disso, mais uma vez, uma expressão equivocada, ampliação foraminal, foi adotada e difundida como consequência do desconhecimento e leitura incorreta das particularidades anatômicas do terço apical, especialmente na sua porção final.

Veja no vídeo abaixo do meu canal no YouTube, o Falando de Endodontia, porque considero ampliação foraminal uma expressão inadequada, como já tive oportunidade de dizer em diversos momentos.

Para dificultar ainda mais o conhecimento desse tema, erros grosseiros são ditos e “ensinados”, particularmente nas redes sociais e em vídeos que proliferam no YouTube, onde salta aos olhos o desconhecimento sobre aquilo de que se fala.

Ampliação foraminal é um procedimento com evidentes equívocos desde a sua concepção, que numa considerável quantidade de vezes é inviabilizada na sua execução pela forma como é “ensinada”.

Onde estão as discussões sobre temas tão importantes e pertinentes à Endodontia como esse?

Por que não são vistas em lugar nenhum?

Porque os eventos se transformaram em desfile de palestras, quase todas falando dos “mais recentes e avançados sistemas de…”.

Vamos lá.

Não é razoável a compreensão da necessidade de preparo do canal para efeito de controle de infecção nos casos de necrose pulpar e infecção?

Claro que sim.

O  canal com necrose pulpar e infecção precisa ser instrumentado para que a infecção seja “eliminada” .

Mas você acha sensato que após tantos anos de conhecimento adquirido, que demonstra claramente a infecção do canal cementário nos casos de necrose pulpar e infecção, particularmente nas situações de lesão periapical, que a instrumentação desse canal para efeito de controle de infecção seja desconsiderada?

Não é razoável que, sendo assim, as evidências que podiam “aprovar” a concepção que recomenda a instrumentação do canal cementário não existiam porque engessaram a Endodontia em ideias e conceitos que eram compatíveis com o conhecimento da época, mas que hoje se mostram fracas como evidências?

Como pode ser evidência científica uma ‘evidência’ (a redundância é intencional) que nega a necessidade de tratamento de um órgão infectado?

Em que área da Medicina isso seria possível?

E por que é na Endodontia?

Deixar intencionalmente material cariogênico infectado permanentemente no corpo é único na prática da Medicina e da Odontologia.
Hasselgren, G  In: Ørstavik, D e Pitt Ford, TR. Fundamentos da Endodontia  2004

Deixar intencionalmente material cariogênico infectado permanentemente no corpo é único na prática da Medicina e da Odontologia.

A sutil modificação da frase de Hasselgren acima não seria uma representação do que ocorre quando não se instrumenta o canal (cementário) infectado?

Quando será que os endodontistas vão perceber que a Endodontia não pode ser uma ilha isolada nas ciências da Saúde?

Quando irão perceber que algumas vezes a Endododontia bate de frente com conceitos clássicos, consagrados pela ciência e importantes da fisiologia humana?

Quando irão perceber que as “evidências” iniciais estão na imaginação de autores que não se deixaram contaminar pela conveniência das evidências dos pensamentos e procedimentos consagrados pelo tempo e ousam avançar e ir além, muito além do jardim?

O que é mais importante?

  • A imaginação, a percepção, o ver o que não se viu, a ideia e o consequente surgimento de uma eventual nova concepção
  • Publicações repetidas sobre determinados assuntos

E o que é que mais se vê hoje em dia?

Entende-se a necessidade de se estabelecer alguns critérios que “reconheçam” o valor do artigo e estimulem os pesquisadores, mas são notórias as distorções.

Urubus e sabiás

Por Rubem Alves

Tudo aconteceu numa terra distante, no tempo em que os bichos falavam… Os urubus, aves por natureza becadas, mas sem grandes dotes para o canto, decidiram que, mesmo contra a natureza eles haveriam de se tornar grandes cantores. E para isto fundaram escolas e importaram professores, gargarejaram dó-ré-mi-fá, mandaram imprimir diplomas, e fizeram competições entre si, para ver quais deles seriam os mais importantes e teriam a permissão para mandar nos outros. Foi assim que eles organizaram concursos e se deram nomes pomposos, e o sonho de cada urubuzinho, instrutor em início de carreira, era se tornar um respeitável urubu titular, a quem todos chamam de Vossa Excelência. Tudo ia muito bem até que a doce tranqüilidade da hierarquia dos urubus foi estremecida. A floresta foi invadida por bandos de pintassilgos tagarelas, que brincavam com os canários e faziam serenatas para os sabiás… Os velhos urubus entortaram o bico, o rancor encrespou a testa, e eles convocaram pintassilgos, sabiás e canários para um inquérito.

– Onde estão os documentos dos seus concursos? E as pobres aves se olharam perplexas, porque nunca haviam imaginado que tais coisas houvessem. Não haviam passado por escolas de canto, porque o canto nascera com elas. E nunca apresentaram um diploma para provar que sabiam cantar, mas cantavam simplesmente…

– Não, assim não pode ser. Cantar sem a titulação devida é um desrespeito à ordem.

E os urubus, em uníssono, expulsaram da floresta os passarinhos que cantavam sem alvarás…

MORAL: Em terra de urubus diplomados não se houve canto de sabiá.

Assim, vejo a “necessidade” da instrumentação do canal cementário como um conceito a ser compreendido, como ocorre com a instrumentação do canal dentinário.

A razão de ambas, instrumentação do canal cementário e instrumentação do canal dentinário, é uma só: controle de infecção.

Talvez agora fique mais claro mostrar porque algumas evidências, como muitas vezes se imagina e se diz, não são evidências.

Como a que existiria, por exemplo, a partir de artigos como “Success of maintaining apical patency in teeth with periapical lesion: a randomized clinical study“, sobre o qual estamos tratando desde a primeira parte deste texto, Paradigmas da Endodontia.

Por tudo isso que foi dito aqui é que escrevemos o artigo abaixo, que está sendo publicado agora em dezembro de 2019.

Como já comentei anteriormente, publico-o junto com Julian Webber, endodontista inglês que fez parte da criação e desenvolvimento de alguns instrumentos endodônticos que são utilizados nos dias de hoje, como o Wave One Gold, instrumento reciprocante da Dentsply.

Deixo aqui o link para você ler o artigo na íntegra aqui no nosso site.

Cemental canal instrumentation: a new concept – http://localhost/wp/endo2/publicacoes/

Continuaremos a conversa no próximo texto, abordando outro tema com nova visão dentro desse mesmo contexto.

Paradigmas da Endodontia

Por Ronaldo Souza

Como nasce um paradigma

Um grupo de cientistas colocou cinco macacos numa jaula, em cujo centro puseram uma escada e, sobre ela, um cacho de bananas. Quando um macaco subia a escada para apanhar as bananas, os cientistas lançavam um jato de água fria nos que estavam no chão. Depois de certo tempo, quando um macaco ia subir a escada, os outros o enchiam de pancada. Passado mais algum tempo, mais nenhum macaco subia a escada, apesar da tentação das bananas. Então os cientistas substituíram um dos macacos.

A primeira coisa que ele fez foi subir a escada, dela sendo rapidamente retirado pelos outros, que lhe bateram. Depois de algumas surras, o novo integrante do grupo não subia mais a escada. Um segundo macaco foi substituído, e o mesmo ocorreu, tendo o primeiro substituto participado, com entusiasmo, da surra ao novato. Um terceiro foi trocado, e repetiu-se o fato. Um quarto e, finalmente, o último dos veteranos foi substituído.

Os cientistas ficaram, então, com um grupo de cinco macacos que, mesmo nunca tendo tomado um banho frio, continuavam a bater naquele que tentasse chegar às bananas.

Se fosse possível perguntar a algum deles porque batiam em quem tentasse subir a escada, com certeza a resposta seria:

“Não sei, as coisas sempre foram assim por aqui…”

Se determinadas profissões ou especialidades perdem a capacidade de refletir, de discernir e, pior, de discutir os problemas inerentes a elas, tornam os seus membros vítimas da massificação do pensamento e do comportamento.

Isso ocorre geralmente no sentido de manter o que está estabelecido.

Para isso, criam-se argumentos que nada mais são do que maneiras de preservar o “status quo”.

Criam-se então coisas como a “incontestável” necessidade de evidências.

Sem o suporte delas, qualquer ideia nova tenderá a ser reprovada pelos doutos daquela especialidade.

Qualquer ideia nova que venha a alterar o estado atual ou, status quo.

Quem ousa enfrentar e contestar a necessidade de evidências?

Entende o porquê da “incontestável” necessidade de evidências?

É triste ver o mundo acadêmico se perder com alguma frequência no emaranhado da “necessidade” das evidências.

…com frequência, se processa uma separação definitiva entre o falado e o vivido, e a ciência se torna um jogo de conceitos… Malabarismo verbal, virtuosismo conceitual.
Rubem Alves

Como conceber uma ideia, uma nova concepção, algo que acabou de nascer, apoiada em evidências?

É aí que se perde o direito à imaginação.

Diante disso, a derrubada de paradigmas se torna impossível, ou pelo menos bem mais difícil.

Diante de qualquer possibilidade de se mudar o que está consagrado pelos anos de prática, o que fazem os professores que se tornaram especialistas, mestres e doutores em formar correntes do não pensar?

Apelam para as evidências.

Na verdade, escondem-se atrás delas.

Evidências às quais recorrem mas que, quando conveniente, eles próprios apontam para a inconsistência ou até mesmo inexistência delas em muitas situações.

Ou você nunca observou as entrelinhas das conclusões de alguns artigos e viu o que pode estar contido na “necessidade de mais pesquisas clínicas bem delineadas, bem conduzidas, estudos clínicos randomizados, que forneçam suporte adequado que permitam esclarecer melhor…”?

Li no sábado o artigo acima, recém publicado.

Veja a conclusão do resumo:

“Dentro das limitações do presente estudo, a manutenção da patência apical não afetou os resultados do tratamento endodôntico”.

Este é um estudo clínico randomizado, reconhecido na escala de importância dos estudos.

Um periódico importante.

Dirão então que aí está uma evidência forte.

Como evidência forte, é uma daquelas “que fornecem suporte adequado que permitem esclarecer melhor…”.

E esclarece, dizendo que a patência apical não melhora os resultados.

Como iremos vê-la?

– Como não há evidências que justifiquem a realização da patência apical, para que faze-la? –

Assim ela será mostrada nos eventos de Endodontia.

Se lá chegar.

Hoje não falta quem fale daquele instrumento, daquele sistema de instrumentação, daquele sistema de obturação, dos novos cimentos obturadores…

Quem fala de Endodontia?

Qual evento você conhece que promove a discussão dos temas pertinentes à Endodontia?

Não parecem um desfile de palestras, quase todas falando dos “mais recentes e avançados instrumentos e sistemas de…”?

Do auditório para o stand.

Nunca foi tão curto esse caminho.

Como seria interessante se alguns professores falassem um pouco sobre Endodontia.

Assim, muitos entenderiam o que é Endodontia e aí, quem sabe, até melhoraria a qualidade do ensino no Instagram.

Muitos perceberiam, por exemplo, por que a evidência forte aí em cima não tem força.

Por uma razão bem simples.

O trabalho partiu de uma premissa equivocada.

Veja o que dizem os autores já na primeira página:

“Define-se patência apical como uma técnica que permite a eliminação de debris na porção apical do canal pela recapitulação com uma lima fina através do forame apical. A lima de patência deve ser de pequeno calibre e flexível usada com movimentos passivos através do término do canal sem estar ajustada ou ampliando a constrição apical.

Por favor, volte e leia lá em cima o objetivo do trabalho.

Se desconsiderarmos a análise da dor pós-operatória, como estou fazendo, lá diz que “o objetivo foi avaliar o efeito da patência apical no reparo periapical”.

Quando prepara um canal com lesão periapical, você usauma lima fina…  de pequeno calibre e flexível usada com movimentos passivos…  sem estar ajustada ou ampliando“?

Claro que não.

Você usa limas ajustadas da melhor maneira possível às paredes do canal para que possam, por ação mecânica efetiva de desgaste e consequente ampliação, entre outras coisas remover o seu conteúdo.

Como podem autores e professores, sejam eles quem forem, pretender observar “o efeito da patência apical no reparo” de lesões periapicais com limas finas, de pequeno calibre, folgadas no canal, usadas com movimentos passivos, sem ação de desgaste e, portanto, de ampliação???

O trabalho está errado porque o conceito de patência, que há muitos anos chamo de foraminal e não apical, não é bem entendido e como consequência é mal interpretado.

No entanto, por preencherem alguns “requisitos”, como o fator de impacto do periódico em que são publicados, muitos artigos ganham o certificado de evidência.

E “derrubam” aquela nova forma de pensar porque ela evidencia os equívocos das evidências (a redundância é intencional) do que está consagrado.

Apesar de já falar sobre esse tema há muitos anos, foi somente em 2006 que publiquei o artigo acima (se desejar lê-lo, clique aqui www.scielo.br/pdf/bdj/v17n1/v17n01a02.pdf).

Nele explico a diferença entre patência apical e limpeza do forame (como eram conhecidos) e que o objetivo da patência apical (foraminal) é basicamente mecânico e não biológico.

Obs: Conheci a história de “Como nasce um paradigma” há alguns anos através de um grande amigo, o Prof. Pécora.

Obs 2: Continuaremos esse tema no próximo texto.

‘Moro é a figura mais perigosa para a democracia brasileira’

Por Ronaldo Souza

A eleição de Bolsonaro, segundo o exército brasileiro um “covarde, canalha, contrabandista e um homem com graves distúrbios psicológicos“, tornou inviável qualquer discussão política.

Explico porque.

Até a campanha de Aécio ainda se tratava de política, mesmo sendo ele o que se mostrou nos últimos tempos; um ser abjeto.

Apontado por boa parte da imprensa (a de sempre) como grande político, nunca o foi, a não ser na capacidade de enganar.

Apresentado como futuro da política brasileira, poucos poderiam ser tão retrógrados.

Impune, solto e inexpressivo, representa uma página virada na política brasileira.

Mas da sua insatisfação pela derrota para Dilma Rousseff, com apoio da imprensa (Globo à frente), boa parte do judiciário e de segmentos influentes da sociedade, Aécio iniciou um movimento que impediu o governo de Dilma, que culminou com o golpe que a derrubou e na sequência levou Lula à cadeia.

Não, não vou perder tempo falando do que foram capazes homens e mulheres para que esse projeto fosse adiante e tivesse o desfecho que teve. Indecentes e imorais, todos se revelaram como são; canalhas.

Todas as vezes que demonizam políticos e política, o resultado já é conhecido; surgem os messias e os corruptos que “combatiam” a corrupção terminam dominando a cena.

Não só aumenta a corrupção como a violência, nas suas diversas formas, se instala.

Abra os olhos, olhe e é isso que você verá.

Não há, entretanto, nenhum precedente igual ao momento que vivemos.

A descoberta de que a Terra é plana, as conversas de Jesus em pés de goiaba, o fundamentalismo religioso, a tentativa de destruição da inteligência e das ciências brasileiras são provas incontestes de que a ignorância e a loucura assumiram o país.

Um homem personifica tudo isso e ninguém o faria à perfeição como ele.

O atual presidente da república.

Nunca antes na história deste país foi visto qualquer coisa semelhante a este momento.

Como então falar de política com pessoas e segmentos da sociedade que “conseguiram” por esse homem sentado no trono da  presidência.

Sim, puseram-no na cadeira da presidência para cumprir o que lhe é determinado.

Ele não governa, ele não é presidente.

É alguém que se diverte durante o dia passando twitter e dizendo m….

Ele é a prova incontestável de que a classe média brasileira é uma das coisas mais medonhas que existem.

“Uma abominação política porque fascista, uma abominação ética porque violenta, e uma abominação cognitiva porque ignorante”.
Marilena Chaui

Aberração humana e política, tudo desconhece, tudo ignora.

Manipulado e controlado, o perigo que representa como presidente é justamente o de não saber o que diz e o que faz.

Assim, sem nenhuma noção e controle, fica sujeito a pessoas que dão provas diárias do seu despreparo.

Ministros que parecem brigar para ver quem vai ficar responsável pela asneira do dia, precisando sempre se desdizer logo em seguida, com as mais esdrúxulas explicações e justificativas.

E os filhos vice-presidentes?

Dispensam comentários.

Excludente de ilicitude

Moro, não.

Moro é um caso à parte.

Mas que, finalmente, cada vez mais pessoas começam a ver quem ele realmente é.

Gente como o jornalista Kennedy Alencar.

Em primeiro lugar, o de sempre.

Um homem bastante limitado na sua cognição.

O que se costuma atenuar chamando de limitações, são características marcantes nele.

Não consegue mais, entretanto, disfarçar o seu jeito acanalhado de ser.

Mas não se engane.

Ele é estúpido, mas é esperto.

Violento, mas frio e calculista, sabe que está nas mãos do presidente desprovido de tudo, mas o trairá assim que surgir a oportunidade mais propícia.

E esta certamente não se apresentará por agora.

Mas ele saberá esperar o dia e a hora.

Tem a seu favor um auditório que, como tantos outros auditórios, não possui nenhum discernimento.

Provas disso há em abundância.

Mas, por que insistir com o óbvio, mesmo sendo ele ululante, como diria Nelson Rodrigues, se nada mais óbvio parece existir?

Quantas coisas podem ser mais óbvias, por exemplo, que a sanha que ele mostrou ter pelo Coaf?

A (verdadeira) razão pela qual desejou ardentemente ter o Coaf nas suas mãos foi tão acintosa e escancarada que até Bolsonaro percebeu e por isso tirou dele.

Os seus incultos e incautos (como também diria Nelson Rodrigues) seguidores/admiradores passaram longe, bem longe, dessa percepção.

Nenhuma surpresa, claro.

Mas talvez seja o “excludente de ilicitude” a mais assustadora e maior aberração das propostas do seu pacote anticrime, pacote por demais sedutor para mentes de pouco alcance. Mais uma vez o seu séquito sequer consegue imaginar o que isso de fato significa.

Projeto antigo, ambos, Bolsonaro e Moro, desejam a qualquer custo aprovar a licença para matar. Aqui, o óbvio não só é ululante como dá pulos e saltos ornamentais de alegria diante de qualquer possibilidade de aprovação.

https://www.youtube.com/watch?v=Y3w-zjH3CuA

Um vergonhoso garoto-propaganda pouco antes de se eleger.

Quem há muito já se excluiu da licitude não poderia ter desejo diferente.

De uma sociedade que não consegue perceber quem é Bolsonaro e o elege presidente do país, como esperar que perceba quem é Sérgio Moro?

Não é razoável esperar pelo impossível.

Medíocres

Por Luis Fernando Veríssimo

Richard Nixon certa vez defendeu a mediocridade do seu governo dizendo que os medíocres também precisavam ser representados. Certa a intenção de Nixon. 0s medíocres formam a maior parte da população de qualquer país e condená-los à irrelevância política ou a um governo de notáveis, de autocratas autoungidos ou de generais disfarçados, seria uma maldade antidemocrática. O próprio Nixon foi um exemplo de mediocridade bem-sucedida, pelo menos de acordo com o seu conceito de mediocridade e sucesso. No fim, teve que deixar o governo por excesso de mediocridade, mas durante sua carreira foi uma inspiração para a categoria. Poucos medíocres chegaram tão longe.

O Brasil talvez tenha a maior quantidade de políticos medíocres por metro quadrado do mundo. Estão concentrados nas duas casas do Congresso Nacional, mas seu poder se espalha pelos Legislativos e Executivos estaduais e pelo Judiciário e chega ao Planalto como uma espécie de apoteose da teoria do Nixon. Congressistas brasileiros cuidam das suas vidas e dos seus bolsos e têm pronta a resposta para quem os acusa de medíocres: no Brasil, quem não é? Claro que há exceções, bons políticos cuja excepcionalidade só realça a mediocridade da maioria. A escuridão em volta destaca o brilho. Mas a escuridão não para de aumentar.

No Brasil, a natureza colabora com o artista. Fornece paisagens espetaculares, poemas prontos, beleza por todos os lados. E, quando é preciso, também fornece metáforas e ironias conforme a ocasião. Ninguém descobriu até agora de onde vem o petróleo que está sujando as nossas praias. Existe representação maior e mais apropriada para a nossa situação do que uma sujeira cuja origem ninguém sabe? De onde vem esse negrume nas nossas almas, de que abismo, de que culpa nunca saldada?

Estamos pagando pela nossa mediocridade, será isso? Nos atacam no que temos de mais bonito, as praias. A escuridão já chegou a Itapuã.