O escritor

Em uma crônica falei de um garoto negro que era meu vizinho e tinha sido o maior amigo da minha infância. Alguém lê, diz que gostou e que, como eu, também teve “dois pretinho” na infância. Como eu, não. Eu não disse que na minha infância teve um pretinho, disse que o maior amigo da minha infância foi um garoto negro.

O senador americano Barack Obama, negro, ganhou prévias do partido dos Democratas (nada a ver com o daqui, pelo amor de Deus) em alguns estados americanos. “Viu quem ganhou as prévias nos Estados Unidos, um pretinho”?

Não deve ser um pretinho. Apesar de não ser uma sociedade que possa servir de exemplo em termos de sensibilidade e bom senso, ele não deve ser qualquer um para chegar ao senado americano, ainda mais por ser negro. O pretinho seria um homem negro pequeno, de pouca estatura física?

Deve ser bom ser escritor. Ele se vinga de tudo. Ele joga no papel todas as suas mágoas, frustrações, revoltas, medos. Ali, no papel, ele trava todas as suas batalhas e, se quiser, vence todas. Existe coisa melhor? Travar qualquer batalha e vencer todas. A da injustiça, do preconceito racial, político, social. Nada fica travado dentro de você, nada vem “até aqui”, sai tudo.

Numa categoria mais abrangente de escritor, entram outras, como jornalista, autor de teatro, de novelas. Peguemos um autor de novelas como exemplo, até porque o alcance da sua obra é enorme.

Alguns autores de novela são reconhecidos homossexuais, e não vai aqui nenhum juízo de valor, até porque alguns deles não demonstram nenhuma preocupação em esconder a sua homossexualidade, pelo contrário. O homossexualismo já foi retratado de diversas maneiras nas novelas brasileiras, mas vamos à última, Paraíso Tropical, da Rede Globo, em que dois jovens atores, bonitos, fizeram um casal homossexual. Perceberam como foram retratados? Um casal perfeito, sem defeitos. Mais uma batalha vencida.

Chama a atenção a atual novela das oito, também da Globo. Um ator negro, Lázaro Ramos, em um dos principais papéis, faz um favelado que namora uma menina rica (Débora Falabella) da zona sul do Rio de Janeiro e, claro, branca. Cenas quentes de beijos e erotismo. Glória total (ou desgraça?). Posso quase afirmar que existem algumas pressões para acabar com essa “sem-vergonhice”. Se não posso assegurar isso, posso assegurar que o desconforto é grande para muita gente.

Atores negros sempre tiveram dificuldades para encontrar papéis importantes na televisão de brancos (existe outra?), razão pela qual sempre representam criados, porteiros, faxineiros, etc. Grande Otelo, único na sua época, superou isso e sempre foi respeitado, pelo menos na classe. Você é capaz de lembrar quantos mais? É possível que esqueça de alguns, mas, mais recentemente, Milton Rodrigues, Ruth de Souza, Taís Araújo. Não colocaria Camila Pitanga, por não ser uma negra nos padrões típicos.

Mas, sem dúvida, Lázaro Ramos chegou arrepiando. Não sei se também há algum casal homossexual, ou alguém que represente outra “minoria”, mas, ao colocar um negro como par romântico de uma branca em Duas Caras, Aguinaldo Silva, o autor (não é quem escreve um escritor?) teve coragem. Não deixou vir até aqui, botou pra fora. Ganha mais uma batalha.

Dá para imaginar o prazer que sente o escritor, como devia sentir Nelson Rodrigues, ao escrever cada texto retratando a sociedade brasileira? Não, não dá. Deve ser indescritível.

É bom demais ser escritor.

Caso Clínico 35

        A                                                      B

        C                                                       D

Incisivos central e lateral superiores com lesão periapical (A). Em B, o 12 já foi tratado e aparece obturado, e a lima está no forame do 11. Em C, obturação do 11 com extravasamento de material obturador. Controle radiográfico realizado cinco anos após mostra regressão acentuada da lesão periapical (D). O restabelecimento dos referenciais anatômicos (espaço do ligamento periodontal e lâmina dura) pode ser observado nos dois dentes, menos no local onde ocorreu o extravasamento. Veja o que diz o artigo "Um grande equívoco" na sessão Conversando com o Clínico sobre os casos clínicos de 31 a 34 e também a comparação entre os casos clínicos 35 e 36.

Um grande equívoco

“A Odontologia é uma profissão que exige o conhecimento científico de um médico, a destreza manual de um cirurgião, o senso estético de um artista e a paciência de um monge”. Sem dúvida, esta frase reflete um momento muito feliz atribuido ao Papa Pio XII e diz com grande clareza o que é a Odontologia. Vamos vê-la mais de perto?

Observe por onde ela começa; “…conhecimento científico de um médico…”. Isso é verdade? Tenho sérias dúvidas. Não me parece que esta tenha sido ao longo dos anos uma característica dos dentistas. É evidente que muitos têm esse conhecimento, mas não me parece ser o forte da classe. Se, para atenuar a nossa condição, você me disser que os médicos atualmente também deixam muito a desejar vou concordar inteiramente. Atenua, não justifica.

“…a destreza manual de um cirurgião…”. Perfeito. Há cirurgiões-dentistas de grande habilidade manual.

“…o senso estético de um artista…”. Também aqui não há como negar, há quase que obras de arte na Odontologia em termos de estética, ainda que em boa parte devidas à qualidade dos materiais.

“…a paciência de um monge…”. Nesse sentido, alguns profissionais se não atingem a perfeição chegam muito perto dela. Provavelmente, poucos conseguem nos níveis de um bom endodontista.

Podemos sintetizar e dizer que a Odontologia seria Arte e Ciência, num sentido maior, amplo. Projetemos isso para a Endodontia.

O avanço técnico/científico da Endodontia salta aos olhos. Acredito, porém, que posso dizer sem medo de errar que na história da Endodontia a arte sempre esteve acima da ciência. Em vários momentos isso se mostrou com uma clareza muito grande. Parece estar mais forte do que nunca.

A excelência em Dentística, por exemplo, tem sido demonstrada através de restaurações esteticamente perfeitas, ou quase isso. Aproveitando-se muito bem desses resultados, alguns profissionais, com espaços importantes na mídia, têm dado um show de marketing pessoal. Para alguns não importa se muitas vezes às custas de patologias pulpares e periapicais, que poderão se manifestar só mais tardiamente. Também muitas vezes os pacientes sequer percebem.

Tenho visto com freqüência preocupante em cursos a “comprovação” da excelência em Endodontia através de belas obturações. A obturação é a estética da Endodontia. E o que é obturação? Algo meramente técnico. Pode-se faze-la facilmente, e aí sim, concordo, mais facilmente ainda nos dias de hoje pelas técnicas disponíveis.

Ouço todos os dias os nossos alunos falarem de orkuts, msn, blogs, sites, etc, mecanismos contemporâneos de comunicação importantes. O grande problema é que não há nenhum controle de qualidade, e aqui controle de qualidade significa compromisso com a formação de milhares de estudantes e jovens profissionais de Odontologia que têm acesso a essas informações diariamente. Observam-se radiografias periapicais com belas obturações e textos e comentários em que a grande preocupação é a “confirmação” de que delas depende o sucesso. Pouco ou nada se fala do tratamento endodôntico.

Vá na sessão Casos Clínicos e veja os casos de 31 a 34 (outros serão colocados). Leia os textos e perceba que não é uma proposta de obturação. O que quero mostrar é que O REPARO NÃO DEPENDE DA OBTURAÇÃO. Sendo assim, vá lá outra vez e veja os casos 35 e 36 e volte a este texto. O que você acha? Os casos 35 e 36 têm exatamente o mesmo período de acompanhamento, cinco anos. Perceba que no 35, onde houve extravasamento de material obturador, a lesão periapical praticamente desapareceu, mas ainda não houve reparo, e por uma razão bem simples: o extravasamento do material obturador não permitiu, e não permitirá por ainda alguns longos anos. Todos os referenciais anatômicos (espaço do ligamento periodontal, lâmina dura) estão reparados nos dois dentes envolvidos pela lesão, menos no local onde houve o extravasamento. No 36, o reparo não só se deu plenamente como houve selamento biológico. Por que? Pela mesma razão simples: não há nada agredindo o organismo, nada que impeça o processo de reparo. O organismo agradece e sela biologicamente o canal. Qual alternativa você quer para o seu paciente? A escolha é sua.

Os nossos egos fugiram do controle. Hoje se faz marketing dentro de sala de aula. Notoriedade acima de tudo. Precisamos voltar urgentemente a assumir compromisso com a profissão. Só assim serão respeitados os milhares de estudantes e jovens profissionais da Odontologia.

Vamos fazer menos festa e mais Endodontia.

Um grande equívoco

“A Odontologia é uma profissão que exige o conhecimento científico de um médico, a destreza manual de um cirurgião, o senso estético de um artista e a paciência de um monge”. Sem dúvida, esta frase reflete um momento muito feliz atribuido ao Papa Pio XII e diz com grande clareza o que é a Odontologia. Vamos vê-la mais de perto?

Observe por onde ela começa; “…conhecimento científico de um médico…”. Isso é verdade? Tenho sérias dúvidas. Não me parece que esta tenha sido ao longo dos anos uma característica dos dentistas. É evidente que muitos têm esse conhecimento, mas não me parece ser o forte da classe. Se, para atenuar a nossa condição, você me disser que os médicos atualmente também deixam muito a desejar vou concordar inteiramente. Atenua, não justifica.

“…a destreza manual de um cirurgião…”. Perfeito. Há cirurgiões-dentistas de grande habilidade manual.

“…o senso estético de um artista…”. Também aqui não há como negar, há quase que obras de arte na Odontologia em termos de estética, ainda que em boa parte devidas à qualidade dos materiais.

“…a paciência de um monge…”. Nesse sentido, alguns profissionais se não atingem a perfeição chegam muito perto dela. Provavelmente, poucos conseguem nos níveis de um bom endodontista.

Podemos sintetizar e dizer que a Odontologia seria Arte e Ciência, num sentido maior, amplo. Projetemos isso para a Endodontia.

O avanço técnico/científico da Endodontia salta aos olhos. Acredito, porém, que posso dizer sem medo de errar que na história da Endodontia a arte sempre esteve acima da ciência. Em vários momentos isso se mostrou com uma clareza muito grande. Parece estar mais forte do que nunca.

A excelência em Dentística, por exemplo, tem sido demonstrada através de restaurações esteticamente perfeitas, ou quase isso. Aproveitando-se muito bem desses resultados, alguns profissionais, com espaços importantes na mídia, têm dado um show de marketing pessoal. Para alguns não importa se muitas vezes às custas de patologias pulpares e periapicais, que poderão se manifestar só mais tardiamente. Também muitas vezes os pacientes sequer percebem.

Tenho visto com freqüência preocupante em cursos a “comprovação” da excelência em Endodontia através de belas obturações. A obturação é a estética da Endodontia. E o que é obturação? Algo meramente técnico. Pode-se faze-la facilmente, e aí sim, concordo, mais facilmente ainda nos dias de hoje pelas técnicas disponíveis.

Ouço todos os dias os nossos alunos falarem de orkuts, msn, blogs, sites, etc, mecanismos contemporâneos de comunicação importantes. O grande problema é que não há nenhum controle de qualidade, e aqui controle de qualidade significa compromisso com a formação de milhares de estudantes e jovens profissionais de Odontologia que têm acesso a essas informações diariamente. Observam-se radiografias periapicais com belas obturações e textos e comentários em que a grande preocupação é a “confirmação” de que delas depende o sucesso. Pouco ou nada se fala do tratamento endodôntico.

Vá na sessão Casos Clínicos e veja os casos de 31 a 34 (outros serão colocados). Leia os textos e perceba que não é uma proposta de obturação. O que quero mostrar é que O REPARO NÃO DEPENDE DA OBTURAÇÃO. Sendo assim, vá lá outra vez e veja os casos 35 e 36 e volte a este texto. O que você acha? Os casos 35 e 36 têm exatamente o mesmo período de acompanhamento, cinco anos. Perceba que no 35, onde houve extravasamento de material obturador, a lesão periapical praticamente desapareceu, mas ainda não houve reparo, e por uma razão bem simples: o extravasamento do material obturador não permitiu, e não permitirá por ainda alguns longos anos. Todos os referenciais anatômicos (espaço do ligamento periodontal, lâmina dura) estão reparados nos dois dentes envolvidos pela lesão, menos no local onde houve o extravasamento.  No 36, o reparo não só se deu plenamente como houve selamento biológico. Por que? Pela mesma razão simples: não há nada agredindo o organismo, nada que impeça o processo de reparo. O organismo agradece e sela biologicamente o canal. Qual alternativa você quer para o seu paciente? A escolha é sua.

Os nossos egos fugiram do controle. Hoje se faz marketing dentro de sala de aula. Notoriedade acima de tudo. Precisamos voltar urgentemente a assumir compromisso com a profissão. Só assim serão respeitados os milhares de estudantes e jovens profissionais da Odontologia.

Vamos fazer menos festa e mais Endodontia.

Preparo e obturação do canal

A Medicina é uma profissão fantástica. É extremamente gratificante cuidar da saúde física e mental do ser humano.

Cuidar da saúde física e mental do ser humano. Dá para imaginar o tamanho da responsabilidade que isso representa? Seria possível um profissional ter todos os conhecimentos necessários para algo dessa grandeza? Humanamente impossível.

Daí surgem as diversas especialidades da Medicina. O conceito de um único organismo, mas a necessidade de “dividi-lo” em partes, para tornar possível o seu conhecimento. Cardiologia, Pneumologia, Ortopedia, Odontologia, Oftalmologia, Dermatologia e tantas outras especialidades, todas elas com um único objetivo; a saúde do homem.

Os primeiros cursos de Odontologia no Brasil surgiram como anexos das Faculdades de Medicina na Bahia e no Rio de Janeiro. Assim também eram os cursos de Farmácia e Obstetrícia. Em São Paulo, o ensino de Odontologia já surgiu de forma distinta da Faculdade de Medicina e chegou a existir uma Escola de Farmácia, Odontologia e Obstetrícia. O modelo adotado no Brasil é o das escolas americanas, isto é, a “separação” da Odontologia das outras especialidades. Se essa separação foi acertada ou não, não cabe aqui discutir. Mas a discussão de pelo menos um dos seus aspectos é inevitável.

Parece que para os profissionais de ambas, a transformação da Odontologia e da Medicina em profissões distintas gerou a idéia de que, de fato, são distintas. A começar pelo fato de que os profissionais que nelas atuam não são colegas. Se existem, quantos médicos consideram seus colegas os dentistas, e vice-versa? Muito pelo contrário, há aí um sentimento de rixa (na verdade há um outro menor, mas… deixa pra lá), expresso de várias maneiras em vários momentos. Mas esse é um tema que pede uma outra hora para a sua discussão e é possível que eu volte a ele mais adiante. A distinção sobre a qual pretendo falar é outra.

Talvez os mais jovens não saibam, mas até há pouco tempo os representantes comerciais das indústrias farmacêuticas que visitavam os dentistas falavam de antibióticos, antiinflamatórios e analgésicos para dentista. Percebeu? Específicos para dentista. O organismo que o médico tratava exigia um antibiótico, o que o dentista tratava outro. “Existiam” dois organismos, um para o médico outro para o dentista. Se observarmos bem, é possível que essa concepção ainda não tenha sido inteiramente eliminada.

O organismo é um só. A compreensão desse aspecto não permite pensar que ele se mobiliza e reage diferentemente na Odontologia e na Medicina. As células que compõem os tecidos e órgãos são as mesmas, onde quer que eles estejam situados. Até onde o conhecimento científico permitiu chegar, não há como o sistema imune se comportar de maneiras diferentes pelo fato de estar atuando em uma patologia da Odontologia ou da Medicina. Isso não existe. Assim, onde quer que estejam ocorrendo, a reação inflamatória e o processo de reparo obedecem às mesmas leis do organismo.

Nenhuma especialidade da Medicina tem qualquer tipo de dúvida de que é removendo a causa que desaparece a patologia, a doença. Nenhuma especialidade da Medicina tem qualquer tipo de dúvida de que é o ato cirúrgico de remoção que elimina a causa. Nenhuma especialidade da Medicina tem qualquer tipo de dúvida de que, uma vez removida a causa, o organismo promove a cura. Na Endodontia, uma especialidade da Medicina, parece que querem que seja diferente.

O preparo do canal é a fase mais importante do tratamento endodôntico, pode ter absoluta certeza disso. Na Endodontia, a causa é o canal infectado, a patologia é a lesão periapical (exsudato persistente, fístula). Na Endodontia, quem remove a causa é o preparo, quem promove a cura é o organismo. Não sei por que ainda hoje queremos ir na contra-mão. Não sei por que ainda hoje queremos, e brigamos por isso, demonstrar que é a obturação que permite a cura. Nunca foi.

Preparo do canal significa acesso, instrumentação, irrigação e medicação intracanal (se e quando necessária). Todos esses procedimentos constituem uma única etapa, que visa a eliminação da causa. Que não se argumente com a impossibilidade de eliminar a infecção em Endodontia. Isso parece ser fato, porém pobre como argumento. Mais pobre do que ele é o que é colocado logo em seguida, e que parece a todos que se justifica: “Ao vedar hermeticamente, a obturação promove o enclausuramento das bactérias que não foram eliminadas. Isoladas entre a obturação hermética e o cemento, elas morrem”. Quem provou isso? Não se pretende uma Ciência que só se justifica com provas? Onde estão os trabalhos que provam a existência do vedamento hermético?

Você já observou quantas vezes uma antibioticoterapia é modificada no tratamento de pacientes em Medicina? Por que? As razões são diversas, mas há uma de fácil compreensão; com essa ou aquela medicação não se conseguiu a eliminação do processo infeccioso. Mas observe que o medicamento está sempre voltado para esse objetivo; eliminação da causa. Quando a medicação funciona e o tratamento controla a infecção, quem entra em cena? O sistema imune. Na verdade ele nunca esteve fora de cena, pelo contrário. No entanto, agora existem condições mais favoráveis para que ele possa fazer o seu papel; promover a cura. Quem criou essas condições? O tratamento, que exerceu controle de infecção.

Será difícil imaginar algo semelhante na Endodontia ? Por que alguns tratamentos podem falhar? Porque as medidas tomadas para controle de infecção não foram suficientes para este ou aquele caso. Em outras palavras, o tratamento endodôntico não foi suficientemente efetivo. Aí você poderá ter como explicação a permanência de microorganismos que não foram alcançados pelo preparo (alojados em locais inacessíveis a ele), microorganismos com maiores recursos de sobrevivência.

O que a literatura propõe além do enclausuramento pelo vedamento hermético? A utilização de cimentos obturadores com atividade antimicrobiana. Olha só que coisa. Perceba a inversão absurda que se faz. Atribuir ao cimento obturador o papel de matar microorganismos.

Vamos pensar juntos? Dispomos hoje de excelentes técnicas de instrumentação, você sabe disso. Você usou uma delas. Além disso, irrigou com solução com reconhecida ação antimicrobiana, solvente de matéria orgânica, em associação com solução de comprovada eficácia de ação sobre matéria inorgânica, e complementou com medicação intracanal, também com comprovada ação antimicrobiana. Várias ações que se somam e juntas ganham grande potencial antimicrobiano. Você realmente acha que os microorganismos que escaparam desse tratamento morrerão pela ação de um cimento obturador? Quais são as chances de isso acontecer? Já pensou que para isso o cimento obturador teria que ter uma ação antimicrobiana superior a todos aqueles procedimentos do preparo juntos? Você conhece algum que tenha? Qual seria a toxicidade desse cimento? Tendo em vista que alguns acreditam que cimentos obturadores com hidróxido de cálcio fariam esse papel com menor toxicidade, esse hidróxido de cálcio contido no cimento estaria em condições, concentração e quantidade mais adequadas e teria mais tempo de ação do que aquele da medicação intracanal?

Parece ser consenso que não se consegue a eliminação da infecção com o tratamento endodôntico. Também não há comprovação de que o reparo só se dá nessas condições. Por essa razão, hoje prefere-se dizer controle de infecção. Quando se consegue, ocorre a cura. Não parece muito difícil imaginar que as condições para isso são atingidas através do preparo e não da obturação.

Nenhuma especialidade da Medicina tem qualquer tipo de dúvida de que é removendo a causa que desaparece a patologia. É simples. Todos os procedimentos de remoção do conteúdo infectado do canal estão inseridos na fase do preparo do canal. Na Medicina, após o controle de infecção, a pele e as mucosas se reconstituem e “selam” o organismo contra a reinfecção. A reconstituição da pele e das mucosas é a síntese da demonstração de reparo que o organismo pode dar. Na Endodontia, após o controle de infecção que o preparo do canal proporciona, não há como o organismo formar novo esmalte e nova dentina. A obturação do canal e a restauração coronária selam o canal contra a reinfecção. Esse é o papel da obturação: selar.

Desde 1987 trabalho com essa linha de raciocínio e somente a partir de 1992 comecei a mostra-la nos cursos que tenho ministrado em algumas cidades do Brasil. Como era de se esperar, ocorreram as mais diversas reações, algumas das quais violentas. É natural. A História mostra que isso sempre acontece todas as vezes em que surge um novo pensamento, uma nova concepção. Dou um exemplo: a descoberta por Nicolau Copérnico, levada adiante por Galileu Galilei, de que não era a Terra e sim o Sol o centro do Universo, um dos grandes momentos da Ciência. Por ter ido contra o pensamento (errôneo) da época, Galileu foi condenado à prisão e forçado a admitir publicamente que estava errado. Somente quatro séculos depois (1997) ele foi perdoado oficialmente pela Igreja Católica.

Dizer que há 21 anos trabalho com essa linha de raciocínio não significa não dar importância à obturação. Todos os nossos alunos, em todos os níveis, graduação, aperfeiçoamento e especialização, sem exceção, são nossas testemunhas de que em vários momentos orientamos refazer a obturação por não estar bem feita. O fato de o reparo não depender da obturação não significa que ela pode ser feita de forma negligente ou, o que seria pior, não ser feita. O reparo não depende dela, mas a sua manutenção sim. A obturação do canal e a restauração coronária fazem o papel da pele, “evitar” a reinfecção.

Portanto, o argumento da negligência com a obturação ou, pior ainda, da sua supressão, que já foi utilizado contra mim, só encontra explicação na incompreensão do que tenho dito ou na má fé. Além do que já publiquei (pelo menos alguns artigos podem ser vistos na seção ARTIGOS PUBLICADOS desse site), inclusive o meu livro, trabalhos importantes de outros autores começam a surgir seguindo essa mesma linha de raciocínio. Veja, por exemplo, “Healing of Apical Periodontitis After Endodontic Treatment with and without Obturation in Dogs” (Journal of Endodontics, julho de 2006, p. 628-633) clique aqui.  Após acompanhamento histopatológico de canais tratados, os autores dizem que “o achado digno de registro do estudo é que não houve nenhuma diferença na cura de lesões periapicais entre canais obturados e não obturados”.

Atribuir o reparo à obturação do canal foi um dos grandes equívocos cometidos na Endodontia. O reparo ocorre graças ao preparo do canal. É a Endodontia em consonância com todas as outras especialidades da Medicina.

Endodontia moderna

No final do século XX (não foi há cem anos, lembre que o século foi até o ano 2000, ontem), podíamos ver cursos de Endodontia com títulos bem atrativos – “A Endodontia do novo século”, “A Endodontia do terceiro milênio” (lembre também que na mudança do século passamos do segundo para o terceiro  milênio), e por aí vai. Ainda é comum “Técnicas Avançadas em Endodontia, “A Endodontia Moderna”, etc.

São títulos interessantes, nada contra, mas confesso que eles me incomodam.

Certamente você tem visto e ouvido falar do grande aumento da quantidade de Faculdades de Odontologia no Brasil. Você faz idéia de quantos cursos de especialização existem hoje? Eu não faço, sei que são muitos.
                                                                                                                       
Você lembra do tempo, isso foi ontem, em que pouquíssimos eram Mestres e menos ainda eram Doutores? Já viu quantos são hoje? Onde todos parecem iguais, como fazer a diferença? Se você respondeu na qualidade respondeu errado. É no marketing.

Não é bom ter uma orientação sobre como conduzir o seu consultório, torna-lo mais rentável, atrair mais paciente? Bem-vindo o marketing. Mas, será que não está havendo um pouco de exagero?

Como “anunciar” qualidade? Não se anuncia. Quando você começa a mostrar uma boa Endodontia, uma boa Periodontia, uma boa Prótese, ela, a qualidade, aparece. Qualidade é uma coisa que se mostra ao longo do tempo. Mas tempo leva tempo. Não serve. Vou para o marketing, é mais rápido. Anuncio minhas qualidades e pronto. Se junto anuncio aparelhos, motores, técnicas modernas, é gol. Corro para o abraço.

Esse motor e essa técnica, aquele motor e aquela técnica, o outro motor e a outra técnica. Existiram outros antes deles, e existirão outros depois. Pense comigo: Se esse é o diferencial, você NUNCA fará uma boa Endodontia, porque os cursos precisam sempre mostrar aparelhos e técnicas “novas”, e você estará sempre sendo induzido a adotar o novo, o moderno, porque só aí você é bom. E você não quer ser chamado de ultrapassado, quer?

Em um texto recente, Oscar Niemeyer* diz que de acordo com Alvar Aalto** “não há Arquitetura antiga ou moderna e sim Arquitetura boa ou má”. Deixe-me beber um pouco da água de gênios da Arquitetura.

Gente, não existe Endodontia antiga ou moderna. O que existe é Endodontia bem feita ou mal feita. É evidente que hoje os recursos permitem mais facilmente fazer uma boa Endodontia. Temos esses recursos? Vamos usa-los. Mas o diferencial é quem está sentado no mocho: é você. E ninguém, isso mesmo, ninguém vai lhe transformar em endodontista. Somente a partir de bons cursos, com bons professores de fato, mas, sobretudo, a partir de você, da sua determinação, do seu desejo e da experiência que se adquire com o tempo, você será um bom endodontista. Marketing, qualquer um faz. E Endodontia bem feita, você tem visto qualquer um fazer?

Você está fazendo um curso de especialização. Você é bom. Parabéns ao curso que o faz bom. Olhe ao redor; são todos tão bons quanto você? Lógico que não. Alguns são melhores do que outros, ainda que façam o mesmo curso. Os parabéns acima são do curso ou seus?

Como sempre, os jovens são as grandes vítimas. Dificilmente eles identificam um vendedor de ilusões.

Vou parafrasear Chico Buarque: “Não quero o novo pelo novo. Quero o novo pelo que de bom ele pode trazer”. O manto da inovação sempre escondeu muita coisa e, é lógico, sempre o fará. Um colega nosso, Luiz Thadeu Poletto, a quem não conheço pessoalmente, diz que “inovar é fazer bem feito”. O que você acha?

 

* Oscar Niemeyer – Dispensa apresentações.
** Alvar Aalto – (1898-1976) Arquiteto finlandês, um dos primeiros e mais influentes arquitetos do movimento moderno escandinavo, que também se notabilizou como designer de mobília, tecidos, cristais, entre outros produtos.

A obturação e o espaço vazio

“Obturações curtas favorecem o acúmulo de maior volume de debris pulpares e dentinários, permitindo a instalação de microorganismos e consequentemente, contribuindo para o insucesso do tratamento endodôntico”.

Não importa a autoria, mas é possível que você concorde com essa afirmação. Ela está de acordo com a concepção que tem orientado a maioria absoluta dos profissionais da Endodontia pelo menos nos últimos cinqüenta anos; a obturação não pode ter falhas, não podem existir espaços vazios. O vedamento tem que ser hermético.

Volte lá, leia outra vez e pense comigo:

1. Como podem se acumular debris pulpares e dentinários depois que a obturação foi feita? De onde eles vieram?
2. Debris pulpares e dentinários já existem ou são produzidos pela instrumentação do canal?
3. Se existe um acúmulo de debris pulpares e dentinários é por causa da obturação curta?

O que você acha? Se eu disser que é lógico que o acúmulo de debris pulpares e dentinários não é por causa da obturação curta e sim porque o preparo não removeu, você concorda comigo?

Vamos pensar juntos outra vez?

1. Vimos que o acúmulo de debris pulpares e dentinários não é por causa da obturação curta, mas sim porque o preparo do canal não removeu.
2. Isso quer dizer que a “culpa” é do preparo e não da obturação, concorda?
3. Posso dizer então que não é o espaço vazio da obturação curta, mas o que está dentro dele?
4. Se é assim, foi o preparo mal feito que não limpou, que não removeu, correto?

Os passos do tratamento endodôntico não devem ser bem feitos, devem ser muito bem feitos, todos eles. Mas, em qualquer especialidade médica sabe-se que para curar uma doença basta eliminar a causa. Quem remove a causa na Endodontia, o preparo ou a obturação?

Vamos lá.

P. Por que será que um determinado dente está com rizogênese incompleta e lesão periapical?
R. Porque, por qualquer razão, quando o paciente era jovem, se já não for mais, a polpa necrosou, deixou de haver apicogênese e ainda surgiu a lesão periapical.
P. Você prepara e obtura logo?
R. Não, não é mesmo?
P. Por que?
R. Porque se fizer isso há uma grande possibilidade de a obturação extravasar, não é? Aí, você faz a apicificação e promove o fechamento do ápice, que leva alguns meses para ocorrer (depende de cada situação). Agora o canal pode ser obturado.

Você nunca observou que nesse momento muitas vezes a lesão já desapareceu, ou, pelo menos, quase toda ela? O que aconteceu? Você removeu a causa. Por causa desse “pequeno” detalhe, não só fechou o ápice como desapareceu a lesão. O que é isso? Reparo. Percebeu que você obteve reparo sem a obturação ter sido feita? Ela vai ser feita agora. Você não percebe isso em todos os outros casos por uma razão bem simples; você não precisa ficar esperando fechar o ápice para poder obturar. Simplesmente prepara, obtura, vê meses depois a lesão desaparecer e aí fica pensando que foi graças a obturação, como todos dizem a você.

Vamos agora, juntos, fechar o nosso raciocínio? O reparo de uma lesão periapical não depende da obturação.

Sei que é difícil pensar diferente do que você aprendeu, ainda mais que você lembra que todos pensam assim. Já pensou na possibilidade de que eles estão errados? Vou falar bem baixinho para ninguém ouvir, só você; estão errados.

Comece a pensar.

Tire meio

O aluno chega com uma radiografia na colgadura e diz:
– Professor, ‘tá bom?
– Não, tire meio.

Você já viu essa cena alguma vez? Como aluno, vi e fiz muitas vezes. Ainda vejo muito. Essa é uma das maiores provas, não a única, dos equívocos que cometemos ao ensinar a Endodontia. O que será desse aluno como profissional? Quais são as chances de que ele venha a ser, de fato, um bom endodontista?

A resposta é bem simples. Se ele não tiver potencial para exercer análise crítica e discernir e/ou não encontrar em algum outro momento alguém que modifique essa orientação, não são grandes as suas chances.

Ao longo dos anos, endodontistas autômatos têm sido gerados. Infelizmente, são poucos os endodontistas autônomos. Dizemos-lhes, tire meio, ponha meio, tire um, ponha um, trave o cone, não está bem travado, trave melhor. Não lhes damos espaço para a dúvida; por que tirar meio? Por que colocar meio? Por que travar perfeitamente o cone? E se eu não travar tão bem, o que acontece?

Não precisamos observar muito para perceber vários momentos como esse na relação dos alunos/profissionais com a Endodontia. Querem um exemplo?

Vamos utilizar o próprio tema desse nosso bate-papo; uma discussão sobre o comprimento de trabalho que deve ser utilizado. Ela, fatalmente, nos leva a tentar entender como se comportam os tecidos ápico/periapicais diante do preparo do canal, de como devem reagir nos casos de polpa viva e necrosada, a necessidade ou não de medicação sistêmica diante de um pós-operatório desconfortável para o paciente, enfim, a discussão nos levaria a entender o processo. Vem alguém, mostra alguns dispositivos dizendo que eles localizam com exatidão o ponto onde o canal deve ser instrumentado e pronto; para que eu preciso entender se a tecnologia me dá tudo pronto? Morre a discussão, morre a compreensão.

Uma vez, eu estava assistindo em uma faculdade (digamos, como convidado) a uma aula de graduação às 07:00 de uma segunda-feira (não era às 19:00, era às 07:00, da manhã), ou seja, horário perfeito para uma aula. Tinha aluno cochilando, namorando (não me diga que você nunca viu namoro em sala de aula), fazendo “cachinhos” no cabelo. De repente, um desavisado (aluno de graduação ligado na aula às sete da manhã de uma segunda-feira só pode ser um tarado), levanta a mão e, para o espanto de todos, uma pergunta; Professor, no livro do professor De Deus,… Não, aqui não fazemos assim.

O parágrafo anterior terminou muito bruscamente, não foi? Pois é, foi assim que terminou o momento que podia salvar uma aula às sete da manhã de uma segunda-feira. Na hora da pergunta, toda a sala, inclusive eu que estava sentado lá atrás observando tudo, se mexeu nas cadeiras, por sentir um alento de vida, uma pergunta que geraria neles, alunos, uma discussão; um momento para a reflexão.

É aí que está o problema; a reflexão. É muito mais fácil tirar meio.

Pondo os pingos nos is

O Congresso de Odontologia da Bahia acontece em anos pares. Em algumas especialidades sempre houve pelo menos dois cursos prinicipais, um nacional e um internacional. Acredito que alguns devem ter ficado registrados para quem os assistiu. Para mim ficaram.

Alguns cursos foram de grande importância na minha formação profissional. Há um congresso, porém, que destaco nesse sentido; 1986. Neste ano, mais precisamente outubro, mês em que o Congresso da Bahia é realizado, foram os cursos ministrados pelos professores Quintiliano Diniz de Deus e Lars Spangberg.

O do Prof. De Deus, como sempre, foi muito bom, mas, foi no curso do Prof. Spangberg que um determinado momento me chamou muito a atenção. Lembro-me perfeitamente, como se estivese acontecendo agora.

Àquela época não existiam os recursos de hoje, como por exemplo, ponteira a laser; usava-se muito uma vara de bambu (a essa altura vocês já estão dizendo; não é do meu tempo). Rolando a vara, no bom sentido, entre as mãos, ele disse; “existem bactérias que sobrevivem no periápice e não são atingidas pelo preparo do canal”. Aquilo ficou na minha cabeça. Estamos em outubro de 1986.

Janeiro de 1987. Vou ao consultório (maravilha, um sábado à noite) para atendimento de urgência a uma paciente com abcesso em fase aguda no incisivo central superior direito. Como se fazia então, fiz a cirurgia de acesso, drenagem e deixei o dente aberto. Assim se fazia, com o objetivo de trazer alívio ao paciente. Nessas condições, saía-se da fase aguda e entrava-se na crônica. Normalmente, dois ou três dias depois, já assintomático, o paciente era agendado para iniciar o tratamento, o que foi feito.

Após a consulta, manipulação do canal e colocação de PMCC (nessa época eu ainda utilizava essa substância), a paciente entrou em fase aguda outra vez, o que nos fez voltar ao consultório para outro atendimento de urgência (aí já não foi num sábado, ufa!).

Novamente, dente aberto, fase crônica, assintomática, a paciente foi agendada para nova consulta. Nova manipulação, PMCC, outra fase aguda, tudo de novo…

Aí, lembrei de outubro de 1986 (lembram que estamos em janeiro de 1987?). Congresso da Bahia, Spangberb, vara entre as mãos, bactéria no periápice. Não deu outra, fui no forame, instrumentei, medicação intracanal. Adeus fase aguda, adeus atendimento de urgência. Agora só agradecimentos da paciente, por sinal, uma bela mulher.

Aí está o registro da primeira vez em que fiz limpeza intencional do forame apical. Janeiro de 1987. Desde então, em todos os casos de necrose pulpar, sem exceção, passei a fazer limpeza do forame.

Ninguém falava disso; não tinha com quem trocar idéias sobre o tema. O professor Spangberg, minha fonte inspiradora, não tinha dito nada sobre como alcançar essas bactérias via Endodontia; a opção colocada foi a cirurgia paraendodôntica. A opção colocada hoje, 2007, ainda é a cirurgia paraendodôntica.

Nessa época eu era somente clínico, já especialista em Endodontia; não era e não imaginava que um dia, cerca de dez anos depois, viria a ser professor. E foi com muita alegria que em 1992 vi o professor De Deus abordar esse tema no seu livro. Somente agora, neste exato momento em que escrevo, lembro de um detalhe; De Deus estava assistindo ao curso, na última fila, sentado com as pernas sobre uma outra cadeira à sua frente. Será que aquele momento, Spangberg, vara de bambu rolando entre as mãos, bactéria no periápice, teve nele o mesmo impacto que em mim?

Por uma grande coincidência, foi em 1992 que, diante de um caso que não conseguia resolver, mesmo fazendo limpeza do forame e usando hidróxido da cálcio, modifiquei o procedimento. Desde então, até para mostrar que se deve atuar de forma diferente em diferentes situações, passei a preconizar dois procedimentos: a limpeza passiva e ativa do forame. Vocês podem ver esses dois casos na seção CASOS CLÍNICOS dessa página, os de número 15 e 16 respectivamente.

O limite apical de trabalho é um tema recorrente na minha vida profissional e a ele tenho dado grande importância, inclusive nos cursos que ministro. Como a minha atividade como professor é mais recente, o segundo artigo que publiquei, em 1998, “Clinical and radiographic evaluation of the relation between the apical limit of root canal filling and success in endodontics” já falava sobre ele. Não só este como alguns outros nessa mesma linha estão disponíveis na seção ARTIGOS PUBLICADOS dessa página.

Tenho colocado nos textos, inclusive de forma bem detalhada no nosso livro, as várias nuanças desse procedimento; como fazer, porque fazer, quando fazer, etc. Permitam-me sugerir a sua leitura e chamar a atenção, por exemplo, para o equívoco que a literatura comete ao colocar patência apical e limpeza do forame como se fossem a mesma coisa. Não são. São coisas bem diferentes.

Hoje vejo que este é um tema que voltou a ser discutido. Que bom.

Notoriedade

– Sentou na cadeira dele, ele fala mal de todo mundo.

Há poucos meses um colega disse isso referindo-se a um outro colega. Tudo a ver com uma coisa muito na moda (a falta dela), chamada Ética.

Sempre foi assim. O mundo é assim… Mas, parece que os profissionais “mais antigos” estão estranhando; dizem que o processo está forte demais. Em outras palavras, dizem que atualmente a falta de ética é de assustar qualquer um. Será que é assim, e se for, por que será?

É pouco provável que haja somente uma resposta. Geralmente, essas mudanças de comportamento da sociedade não encontram resposta em um único aspecto. Não tenho competência para fazer uma análise de algo tão complexo, mas, certamente ela passa por um aspecto cada vez mais visível; a busca pela notoriedade.

O advogado do diabo. Viram esse filme? Quem não viu corra e pegue em uma locadora. Al Pacino, para variar, soberano. Há um trecho em que a sua personagem diz; “o pecado de que mais gosto é a vaidade”.

Há, neste momento, e isso parece que fugiu do controle, manifestações de busca de notoriedade que deixaram de lado qualquer preocupação ou compromisso com a Ética. Alguns profissionais estão se notabilizando; para ocupar um espaço, falam de tudo e de todos.
 
Não há limites. Falar mal de alguém, dizer que professor fulano é um retrógrado, que o outro é mentiroso, que ele corrigiu tratamentos endodônticos que colegas fizeram (dizendo o nome de quem fez), tudo isso em público, diante de colegas e/ou de alguns alunos incautos. Demonstração de tudo, inclusive de insensatez; é incrível como não conseguem perceber que alguns dos seus casos clínicos “caem” nas mãos de outros colegas e por eles são corrigidos, mas não comentados.

A Ética, essa que aprendemos nos manuais dos conselhos que regem as profissões, é infringida com freqüência e naturalidade assustadoras. Não vejo solução para isso. Os profissionais são homens e é aí que está o problema; no homem. Perderam-se os valores, os princípios, que hoje constituem uma conversa chata para muitos. A busca da notoriedade regula os seus atos. Por ela, qualquer coisa, a qualquer preço.

Os mais experientes identificam com relativa facilidade os que agem assim. O grande perigo está nos jovens, aqueles que estão chegando e os recém-chegados ao mundo profissional, cada vez mais selvagem. Há de se ter um cuidado muito grande com estes, pois, sem o discernimento que só o tempo dará, deixam-se levar pela aparência e conversa desses profissionais, chegando até a admirá-los.

Nesses casos, os órgãos competentes nada ou pouco podem fazer. Esses profissionais seguirão a sua trajetória agindo dessa forma e é muito difícil dete-los. Eles vão continuar exercendo o alpinismo profissional. É na ética dos que têm que se escondem os que não têm.