Qual é o nosso real tamanho?

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Dê poderes extraordinários a homens ordinários e você terá o caos

Por Ronaldo Souza

Ainda que se reconheça a importância e em alguns casos até a necessidade de se categorizar algumas coisas, parece haver no homem um desejo incontrolável de medir tudo, inclusive o próprio homem.

O outro.

Medir-se a si próprio, jamais.

O mundo acadêmico não escapa dessa característica do homem e aí surgem os títulos.

Doutor, membro (se for “fellow” então, torna-se irresistível), revisor, consultor, editor… são títulos e funções importantes e refletem o quanto somos diferenciados.

E quanto mais impacto tiver aquilo de que se faz parte, um periódico por exemplo, mais acima dos mortais o doutor se colocará.

Quanto mais próximo do Céu, mais Deus.

A humildade desfilada pelos corredores é somente aparente, ainda que imperceptível para alguns.

Alguns professores estrangeiros, nascidos no Brasil por acidente geográfico, acreditam ser grande diferencial a quantidade de publicações em revistas internacionais de impacto.

“Espelho meu, espelho meu, existe algum professor mais competente do que eu?”.

Espelhos costumam mentir.

Depende da competência do maquiador.

Não importa. O professor será admirado pelos seus seguidores.

“Hoje, como as pessoas não conseguem nem ser nem ter, o objetivo de vida se tornou parecer. As pessoas parece que sabem, parece que fazem, parece que acreditam”.
Roberto Shinyashiki

Hamlet (Shakespeare), hoje, diria:

“Parecer ou não parecer, eis a questão”.

As redes sociais que o digam.

Há quem domine a “arte” da publicação.

Sabe, por exemplo, exatamente em qual periódico submeter o artigo.

Sabe o que as revistas querem publicar.

Como todos sabemos, há pós-graduações e pós-graduações. Algumas, há algum tempo, têm objetivos bem definidos; um deles, “enriquecer” currículos.

Uma dissertação/tese sobre um tema importante e com um pouco mais de profundidade pode dar lugar a um trabalho banal, contanto que seja mais facilmente publicável.

Descobre-se um filão e este é explorado “ad nauseam”.

Publicam-se inúmeros trabalhos sobre o mesmo tema, que se tornam repetitivos e cansativos, mas sobre os quais pode haver muito interesse.

Esse interesse vai entre aspas.

Por acaso, neste momento, você percebe algum tema sobre o qual há grande quantidade de publicações?

Fácil, não?

Posso citar um tema ainda recente como exemplo.

Você faz ideia de quantos artigos foram publicados falando do MTA?

E sobre o hidróxido de cálcio?

Não como medicação intracanal, mas para algumas situações específicas, como tampão apical em casos de rizogênese incompleta.

Sobre qual se publicou mais?

Quanto custa um “potinho” de MTA?

Caso existisse, quanto custaria esse potinho com a mesma quantidade de hidróxido de cálcio?

Percebe?

Criou-se um consenso sobre a necessidade e a imprescindibilidade de usar o MTA e todos passaram a acreditar que só resolverão “aqueles” casos se ele for usado.

O que, na verdade, estão fazendo esses “professores”?

Publish or perish

Ao enaltecer as qualidades dos materiais tiram do foco a compreensão do problema por parte dos alunos.

Fazem acreditar que é o material o fator determinante do sucesso e não o controle de infecção.

Às vezes até falam sobre essa questão, mas em rápidas pinceladas, com o objetivo de dourar a pílula. Do que tratam mesmo na verdade é da realização de trabalhos que lhes rendam frutos.

Aí entram em cena a quantidade de artigos publicados e o prestígio do periódico.

“Publique ou pereça”.

Os professores estrangeiros nascidos aqui por acidente geográfico preferem dizer:

Publish or perish.

O interessante é que nessas horas ninguém diz “less is more”.

Publish or perish não parece combinar muito bem com “less is more”, expressão da língua inglesa que, de tão repetida nos salões de gala tupiniquins, virou português.

Apesar do flagrante antagonismo que existe entre as duas expressões, elas são ditas com naturalidade e frequência chocantes pelos mesmos profissionais, certamente por imagina-las capaz de seduzir mais facilmente as plateias sedentas por demonstrações de “cultura”.

“Just my two cents”.

Meu Deus!

A que nível chegou o nosso complexo de vira-latas, como bem definiu Nelson Rodrigues, apaixonado torcedor do Fluminense.

Ou alguém vai me dizer que ouve por aí as pessoas dizerem “menos é mais”, ou seja, em português?

E muitas vezes realmente menos é mais.

Einstein sempre esteve à frente do seu tempo.

Entretanto, vivesse hoje, não faria parte desse “seleto” grupo.

Miguel Nicolelis, cientista brasileiro consagrado em todo o mundo e crítico dos deuses da academia brasileira, na sua reconhecida simplicidade diz que, seguidos os critérios adotados por nossa academia, “Einstein não seria pesquisador A1 do CNPq”.

Um cientista como Einstein, que diz que “A imaginação é mais importante do que o conhecimento” certamente não tinha como meta a quantidade.

Você consegue imaginar o quanto ele incomodou o mundo acadêmico com essa frase?

Wesley Safadão enche muito mais shows que Chico Buarque.

Wesley Safadão ganha muito mais dinheiro que Chico Buarque.

Os holofotes se voltam muito mais para Wesley Safadão do que para Chico Buarque.

Pela lógica da notoriedade, o que resta às pessoas?

Acreditar que Wesley Safadão é artista mais importante e melhor que Chico Buarque.

Simples!

Imaginem esse homem culto de Vargas Llosa (ganhador do Nobel de Literatura em 2010) como sendo o professor.

E não o imaginemos com a cultura nos níveis de que fala o escritor peruano, particularmente como o descreve no livro, mas simplesmente como aquele que possui um conhecimento geral mais pleno, mais abrangente do que aquele a quem ensina; o especialista.

Não deveria caber ao homem culto, o professor, abrir os horizontes do especialista, o seu aluno?

De que forma?

Ensinando-lhe e estimulando nele o desenvolvimento do espírito crítico.

O espírito que o separará da “massa agregadora da qual era apenas uma peça e que surja como um ser soberano… a ser ele e não uma mera reprodução da comunidade, do conjunto, da coletividade”.

O especialista por acaso não deveria ser alguém que se destaca da “comunidade, do conjunto, da coletividade” do clínico, por saber mais que ele?

É esse especialista que está sendo formado?

O que vemos?

Professor e aluno de mãos dadas se incorporando à corrente do não pensar, do simplismo, e “fazendo canal, fazendo canal, fazendo canal”, nada mais.

Fazendo canal com esse ou aquele instrumento, com essa ou aquela técnica, com esse ou aquele cimento obturador e só, mais nada.

Ensina-se o que um curso de atualização pode ensinar; a usar instrumentos rotatórios, reciprocantes, obturação com guta percha assim ou assada, material obturador saindo por todos os poros do paciente. Tudo, claro, com material áudio/visual de qualidade inegável, o que causa ainda maior deslumbramento dos alunos.

Máquinas de fazer fazedor de canal.

Nisso se transformaram alguns cursos de especialização.

“Havia uma distinção que era bastante clara: a do especialista e a do homem culto (o professor). Seria um enorme erro confundir o especialista com o homem culto… O homem culto é um homem que não se deixa confinar pela especialidade…”.

Onde está esse professor?

Onde está o seu conhecimento?

Em encantadores de serpente se transformaram os professores.

E em como ensinar a fazer isso se transformaram alguns cursos de mestrado/doutorado.

Como diz Vargas Llosa, “o espírito crítico é absolutamente fundamental”. 

Mas este deixou de existir.

“Sufoco de ter somente isso à minha volta
Abram todas as janelas
Abram mais janelas do que todas as janelas que há no mundo”.
Fernando Pessoa

Toda uma geração de endodontistas está sendo sufocada por falta de conhecimento e discernimento clínico, graças à lobotomia feita pelos deuses da endodontia que se fazem parecer detentores do saber.

Inalcançáveis, pela altura dos pedestais erguidos por eles próprios.

É lamentável e assustador como os ensinamentos da Geração de Ouro estão se perdendo.

E o que é mais lamentável ainda é que alguns dos seus discípulos participam desse processo.

O ego e os holofotes os ofuscam de tal maneira que não permitem ver o que estão fazendo com a Endodontia brasileira, ainda que se vejam ladeados por alguns nomes “consagrados”.

Aliás, o que fazem questão de mostrar.

Completam-se, abraçam-se num abraço único, aplaudem-se e pelos auditórios são aplaudidos.

Se o que se quer é “estar no mundo da arte e ter sucesso, é indispensável que se torne um…”, como se num grande palco estivéssemos.

Não fazem ideia do seu real tamanho.

Trago o artigo abaixo para que você leia. É muito interessante.

Com negrito e algumas frases sublinhadas tentei chamar a atenção para pontos que julgo importantes, mas todo o texto é muito bom e vale a pena ler.

Quem sabe venha despertar o nosso espírito crítico e nos afaste da corrente do tudo único e igual que nos empurram goela abaixo, num processo cruel e covarde, particularmente para os mais jovens.

* A frase “Dê poderes extraordinários a homens ordinários e você terá o caos” é atribuída a (Jean Paul) Sartre.

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Miopia

A miopia dos indicadores bibliométricos

Por Lilian Nassi-Calò

A utilização de indicadores bibliométricos para avaliação da ciência é uma prática ubíqua, a despeito de não existir uma relação inequívoca entre citações e qualidade, impacto ou mérito científico. Quando se considera a inovação – característica inerente da pesquisa científica – a relação é ainda mais desconexa.

Esta é a opinião de pesquisadores da Georgia State University, em Atlanta, GA, EUA, e do Departamento de Gestão Econômica, Estratégia e Inovação da Universidade de Leuven, na Bélgica, de acordo com uma recente publicação na Nature1. Paula Stephan, Reinhilde Veuglers e Jian Wang observaram que especialistas que integram comitês científicos de instituições de pesquisa em vários países ainda utilizam largamente indicadores bibliométricos baseados em citações – como o Fator de Impacto, índice h, e citações aferidas pelo Google Scholar – como proxies para avaliar qualidade e impacto da pesquisa de candidatos a contratação e projeção na carreira. Iniciativas como a San Francisco Declaration on Research Assessment2, de 2012, e o Manifesto de Leiden3, de 2015, embora de ampla repercussão e apoio por parte de inúmeras instituições de pesquisa e agências de fomento em todo o mundo, na realidade pouco mudaram a forma de avaliação da ciência e dos cientistas. Afinal, os índices bibliométricos proveem uma forma simples (em muitos casos, simplista) e conveniente de avaliar um grande número de candidatos, propostas ou artigos.

As limitações do Fator de Impacto (FI) e dos indicadores similares de desempenho de periódicos na função de avaliar artigos individuais e pesquisadores são conhecidas por todos. Segundo Stephan, mesmo agências de fomento que não solicitam especificamente informar o FI do periódico na lista de publicações, utilizam este indicador, bem como o número de citações e o índice h para ranquear propostas. Os próprios pesquisadores contribuem para este círculo vicioso. Ao serem solicitados a identificarem suas publicações mais relevantes, eles geralmente as selecionam com base nos índices de citações, ao invés de atribuir aos artigos sua verdadeira importância acadêmica ou uma descoberta particularmente inovadora.

O artigo menciona o uso em larga escala de indicadores baseados em citações para progressão na carreira e contratações. Ademais da Itália, República Checa, Flandres (Noroeste da Bélgica) e China, os autores citam o programa Qualis do Ministério da Educação do Brasil, que utiliza o FI para definir a alocação de recursos para a pesquisa, o que, em particular, penaliza os periódicos do Brasil. Ressalva é feita ao Research Excellence Framework do Reino Unido, segundo os autores, uma rara exceção que explicitamente recomenda não utilizar o FI nas avaliações.

A inovação requer tempo

Os cientistas anseiam fazer descobertas inovadoras, e em nome delas, diz-se que podem até incorrer em práticas antiéticas e superestimar resultados preliminares. Stephen e colaboradores, entretanto, acreditam que na verdade o uso excessivo de índices bibliométricos com janelas curtas de aferição (2-3 anos) pode desencorajar a publicação de resultados inovadores. Para testar sua hipótese, os autores analisaram as citações no Web of Science de mais de 660 mil artigos publicados entre 2001-2015 categorizados em pesquisa com alto, moderado e nenhum grau de inovação. Como proxy para grau de inovação, os pesquisadores avaliaram a lista de referências dos artigos em busca de padrões insólitos de combinação. Desta análise, os autores chegaram à conclusão de que os artigos altamente inovadores levam mais tempo para serem citados em comparação aos medianamente inovadores e aos não inovadores. Entre os artigos altamente inovadores, dois tipos de comportamento foram observados: ou tornavam-se artigos altamente citados – as citações começam a aumentar após 3-4 anos e se mantém em ritmo crescente até 15 anos após a publicação – ou eram ignorados, em comparação aos artigos com nenhum grau de inovação. Porém, é importante notar que nos 3 anos após a publicação, a probabilidade de um artigo altamente inovador estar entre os 1% mais citados é inferior à probabilidade para artigos com nenhum grau de inovação. Isso levou os autores a concluir que o sistema atual de avaliação da pesquisa subestima trabalhos que possivelmente terão alto impacto na avaliação em longo prazo. É importante também ressaltar que artigos que se revelaram de alto impacto no decorrer do tempo foram publicados em periódicos de menor FI. Assim, Stephen e colaboradores concluem que “quanto mais estamos ligados a indicadores bibliométricos de curto prazo, mais longe estamos de recompensar a pesquisa com alto potencial de ir além das fronteiras – e aqueles que o fazem”.

Entretanto, esta observação não é totalmente sem precedentes. Em 2014, um artigo de John Ioannidis publicado também na Nature procurou investigar se, na opinião dos pesquisadores, seu trabalho mais citado era seu melhor trabalho. A pesquisa, objeto de um post neste blog, na verdade trouxe mais questionamentos do que respostas, como por exemplo, a dificuldade de identificar precocemente um artigo inovador com base em indicadores bibliométricos com janelas de 2-3 anos, ou quando são citados por artigos de outras áreas menos afins. Porém, na ocasião, uma das conclusões do autor foi a necessidade de se recorrer a outros índices além das métricas baseadas em citações para complementar a avaliação da ciência.

Recomendações à comunidade científica

A fim de encorajar os pesquisadores a empreender domínios mais inovadores da ciência, é necessário fomentar uma mudança de postura da comunidade científica como um todo com o objetivo de restringir o uso indiscriminado de indicadores bibliométricos de curto prazo.

Pesquisadores – Restringir o uso do FI e índices baseados em citações para orientar a escolha de tópicos e onde submeter artigos. Não incluir tais indicadores em CV e propostas de auxílio à pesquisa.

Agências de fomento – Prover múltiplas formas para avaliar as publicações de pesquisadores e instituições. Excluir medidas de citações e FI de propostas de auxílio à pesquisa, e não permitir que sejam discutidas pelos pareceristas. Incluir especialistas de outras áreas em comitês de avaliação e periodicamente avaliar o desempenho dos candidatos às propostas de auxílio à pesquisa utilizando índices com janelas de 5-10 anos.

Pareceristas – Buscar avaliar o trabalho deixando de lado as métricas, especialmente as de curto prazo.

Editores – Procurar ignorar as métricas usadas para avaliar publicações. Propor métricas que considerem maior intervalo de tempo.

Universidades – Adotar como prática nos comitês de avaliação que os membros realmente leiam a pesquisa dos candidatos e não apenas seus índices bibliométricos, a exemplo do que é feito no REF do Reino Unido. Ao avaliar candidatos, enfatizar como os pesquisadores abordam determinadas questões propostas. Neste sentido, aplica-se a consideração de Antônio Augusto P. Videira6, Professor de Filosofia da Ciência da UFRJ: “Deveria causar surpresa o fato de que o uso de um indicador torne elegível um ou outro autor pelo fato de que tenha publicado em um periódico de FI mais alto, de que é mais importante saber onde ele publicou do que ler seu trabalho”.

Os autores do estudo acreditam que “se realmente a comunidade acadêmica deseja criar avaliações mais objetivas, todos aqueles envolvidos – desde pesquisadores em início de carreira até os presidentes das agências de fomento – devem usar indicadores qualitativos e quantitativos de forma responsável […] de forma a evitar o uso de indicadores que penalize os pesquisadores e projetos que tem o maior potencial para romper fronteiras”.

* Lilian Nassi-Calò é química pelo Instituto de Química da USP e doutora em Bioquímica pela mesma instituição. Foi bolsista da Fundação Alexander von Humboldt em Wuerzburg, Alemanha. Após concluir seus estudos, foi docente e pesquisadora no IQ-USP. Atualmente é Coordenadora de Comunicação Científica na BIREME/OPAS/OMS e colaboradora do SciELO.

“Ah, você ainda é da época do hidróxido de cálcio”

Passado

Por Ronaldo Souza

Pensei em começar este texto parabenizando alguns ministradores e dadores de curso, mas refleti e desisti.

Explico.

Parabenizar pela competência que possuem em fazer lavagem cerebral nos seus alunos.

Já há algum tempo são várias as histórias que nos chegam sobre como alguns colegas estão se dirigindo a outros, algo que acontece inclusive entre aqueles que eram amigos quando ainda estavam na faculdade.

A queixa maior é das colegas, talvez pela maior quantidade de mulheres nos cursos de Odontologia.

Além da ironia e do sarcasmo, o que já não seria aceitável, muitos assumem uma postura de humilhação.

Há uma estupidez no ar, devidamente estimulada pelos imbecilizadores profissionais da filósofa Marcia Tiburi.

Eles surgiram há algum tempo produzindo ignorância, insensibilidade e estupidez.

Veja o que diz Marcia Tiburi.

Deve-se entender que uma sala de aula, em qualquer estágio da formação profissional, pode representar uma “massa” a ser manipulada.

Para isso, não importa qual, todas as armas e ferramentas são utilizadas.

Acho que uma “historinha” precisa ser contada.

Por forte influência de alguém muito próximo na sua própria família, uma aluna nossa de graduação decidiu que seria professora de Endodontia, até pela facilidade que teria de ser professora nos diversos cursos do seu parente.

Resolveu então fazer o mestrado na mesma instituição, ou seja, na nossa faculdade.

Os professores da Endodontia a viam com ressalvas e, pelo menos em parte, por isso não foram procurados. Tendo que cumprir estágio em uma disciplina clínica, escolheu uma em que estava um professor do nosso grupo, com quem ela mantinha muito bom relacionamento.

Mesmo conhecendo bem o seu perfil e sabendo que ela tinha parentesco muito próximo com um profissional que dá cursos de Endodontia, cujo perfil também representava risco iminente, esse professor do nosso grupo resolveu lhe dar essa oportunidade.

Um dia, porém, ao chegar mais cedo do almoço (na própria faculdade), ele notou algo estranho. Alguns alunos já tinham começado o atendimento a pacientes e ela estava orientando. Chegou silenciosamente, sem “anunciar” sua chegada.

Foi o suficiente para ouvir coisas como; “vocês ainda ficam melando o canal com hidróxido de cálcio? Não, não usem não, ninguém usa mais isso, está ultrapassado…”.

Concretizara-se o risco iminente.

Quem sabe há quanto tempo isso já vinha acontecendo?

Mesmo com grande relacionamento com aquele professor, ela foi capaz de fazer isso com ele.

Chamou-a em particular e pediu que ela se afastasse da disciplina.

Ainda que sejam considerados o perfil familiar e a hereditariedade e dando-se por isso os devidos descontos, com aquele episódio comecei a perceber mais claramente que, como diria Guimarães Rosa, havia “qualquer coisa no ar além dos aviões da Panair…”

Um movimento silencioso, aparentemente sutil.

      • Um único instrumento
      • Uma única hora
      • Uma única sessão

Acrescento mais um.

      • Um único pensamento; a estupidez

Breve parêntese.

“Uma única hora” já está caindo por terra. Meus alunos me dizem que no Instagram tem professores dizendo que fazem tudo em 45 minutos em qualquer situação.

Mal sabem eles que estão ultrapassados.

Aqui no interior da Bahia (a Bahia é uma terra abençoada), há anos um dador de curso diz; “marque aí, marque aí…” e faz um incisivo central em OITO minutos.

Confesso que não sei se já reduziu para cinco.

Virou mestre e coordenador de cursos de Endodontia por aqui.

Cada vez mais são mais frequentes esses relatos de colegas dizendo que, “além dos aviões da Panair”, há no ar uma pressão enorme para “mostrar” aos que não rezam nessa bíblia que estão todos ultrapassados.

Todos os que não praticam ilusionismo.

Não bastasse isso, agora passaram a tentar humilhar os colegas e foi o que me contou uma aluna da especialização no último módulo.

O colega que tinha saído da clínica onde ela agora estava trabalhando passou por lá e rolou um papo.

Falou muito de dinheiro.

Disse que cobrava tanto nesse dente, tanto naquele e disse que cobrava mais no incisivo do que no molar, porque ninguém queria perder um incisivo…

Quando a conversa conseguiu entrar em Endodontia, contou que tinha feito especialização no curso… e ao saber que ela estava fazendo especialização em Endodontia na ABO (é a deixa que eles esperam ouvir), subiu no pedestal dos deuses da Endodontia, encheu os pulmões e, de lá de cima, como um Moisés que acabara de descer do Monte Sinai com as Tábuas dos Mandamentos entregues pessoalmente por Deus, fez pregação da sua religião:

“Ah, você ainda é da época do hidróxido de cálcio!”

E professou.

“Ora, onde estão as bactérias? Se você alarga o canal, faz uma irrigação bem-feita, vedamento tridimensional com guta percha assim ou assada…”

E a humilhou.

Claro, dentro da perspectiva da Endodontia que deram a ele.

Por coisas assim, falei no início deste texto que pensei em começa-lo elogiando alguns ministradores e dadores de curso. Como de fato eles demonstram muita “competência” nesse processo de imbecilização, seria justo que lhes prestasse essa homenagem.

Entretanto, ao lhes parabenizar por essa competência, eu estaria, claro, sendo muito irônico.

Percebi a tempo que com essas coisas não se brinca.

Diante do mal que fazem a essas pobres pessoas, recuperei a razão e desisti da ideia.

Eles não merecem outra coisa que não seja a minha repulsa.

Alguém irá dizer; quem ele pensa que é para reprovar alguém?

Não me preocupa.

A falta de dignidade desses profissionais permite que qualquer que seja a crítica a esse processo será bem-vinda, venha de onde vier.

E minhas críticas não são uma “crítica qualquer” e muito menos vêm “de onde vier”.

Interpretem como quiserem.

Sabe o que é interessante?

Os colegas já estão percebendo e o incômodo da pressão que relatavam antes agora passa a ser visto como algo ridículo.

Sabe qual foi a reação da minha aluna?

Nenhuma tentativa de contra argumentação. 

Ouviu a pregação dele e nada disse.

Nada.

Ela está aprendendo que a arrogância muitas vezes é uma forma de manifestação da estupidez.

É um mecanismo de defesa.

Por trás dela está escondida a ignorância.

“A estupidez se coloca na primeira fila para ser vista; a inteligência se coloca na retaguarda para ver”.
Bertrand Russel

Há um ditado popular que diz, “quem cala consente”.

Veja esse ditado sob outra perspectiva.

Muitas vezes alguém cala porque percebe que não vale a pena discutir, tamanha a estupidez que está presenciando.

Foi o que fez a minha aluna; calou.

Ficou vendo a estupidez na primeira fila.

Aracaju, o CAP e eu

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Por Ronaldo Souza

Há algum tempo recebi um convite do Prof. Breno Araújo para dar um curso em Aracaju. Seria um curso pelo CAP, Centro de Aperfeiçoamento Profissional.

Para mim, ir a Aracaju é sempre motivo de alegria. Fazemos isso com frequência, eu, minha mulher e nossas filhas, com seus respectivos marido e namorado.

Mas voltei agora, depois de 10 anos, para falar de Endodontia.

A alegria foi redobrada.

Podemos dizer que foi tipo um curso “fechado”, praticamente com colegas e alunos de alguma forma ligados ao CAP.

Outra grande alegria me esperava, que pude sentir assim que entrei no auditório do CRO-SE.

Um grande amigo estava lá.

O Prof. Mirabeau Ramos.

Tenho com Mirabeau uma dívida de gratidão que, provavelmente, jamais poderei pagar.

Além da amizade, que já existia, surgiu há alguns anos o carinho que tenho por ele.

Mesmo não podendo ficar até o final (naquela noite ele foi professor homenageado pelos formandos em Odontologia da UFS), fez um esforço para me prestigiar até às 17:30, pois tinha que estar na formatura no máximo às 19 horas.

Mesmo com a alegria renovada de conversar sobre as coisas da Endodontia com os colegas de Aracaju, poderia ter sido “mais um curso”.

Não foi.

Foi especial.

E pelas razões afetivas que me ligam a Aracaju (a principal delas não foi explicitada aqui), tornou-se muito prazeroso.

Já tínhamos curtido a quinta-feira anterior ao curso (dessa vez, somente eu e minha esposa) e ainda curtimos a noite de sexta-feira e todo o sábado, voltando a Salvador no domingo.

Fiquei muito feliz por ter estado lá e mais feliz ainda quando vi algumas fotos, tiradas quando alguns já não estavam mais presentes (o curso foi até às 18:30), e comentários que, na sua gentileza, o professor Breno me enviou já no sábado.

Agradeço ao CAP, na figura dos professores Gustavo, Fabrício e Breno (na ordem em que estão comigo na foto lá em cima), pela gentileza do convite e pela oportunidade de estar em Aracaju.

E divido com vocês algumas fotos e comentários que me foram enviados.

Imagem 1'

Imagem 2

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Histórias que precisam ser contadas. E serão

Síndrome do Caranguejo

BAIXA GASTRONOMIA NO LITORAL - VIDA CIDADANIA - CURITIBA - PARANÁ - 19/01/2013 - Dicas de pratos de comidas, lanches e petiscos que os turistas podem comer nas praias do litoral paranaense - na foto caranguejo - Foto Albari Rosa / Agência de Notícias Gazeta do Povo

Por Ronaldo Souza

O caranguejo faz parte da vida do brasileiro e talvez se possa dizer que particularmente para o Nordeste ele representa algo mais, haja vista que se tornou parte importante da nossa culinária. 

Fala-se muito sobre esse crustáceo e algumas características lhe são atribuídas.

Que anda para trás, para os lados, que é o urubu dos mares e por aí vai. 

Resolvido a conhece-lo um pouco mais, um pesquisador resolveu fazer um experimento.

Adestrou um caranguejo de tal maneira que a cada toque de sua mão empurrando-o delicadamente e à ordem “anda” ele andasse.

Quando a cobaia finalmente se mostrou apta, deu início ao experimento.

E, pela primeira vez, agora experimentalmente, tocou-lhe com a mão e disse; anda.

E o caranguejo andou.

No segundo momento, o cientista lhe tirou uma das patas e, empurrando-o delicadamente, disse; anda.

E o caranguejo andou.

Na sequência, tirou-lhe outra pata e repetiu o mesmo gesto. Diante da remoção de mais uma pata e da mesma orientação para andar, o caranguejo demorou um pouco mas conseguiu.

Assim foi até o dia em que lhe restava somente uma pata. O cientista se preparou para concluir o experimento.

Removeu a pata e repetiu gesto e palavra.

Empurrando delicadamente o caranguejo, disse-lhe; anda.

O caranguejo não andou.

Repetiu.

Empurrou delicadamente o caranguejo e lhe disse; anda.

O caranguejo não andou.

Pela terceira e última vez repetiu a sequência.

Empurrou delicadamente o caranguejo e outra vez; anda.

O caranguejo não andou.

O cientista então “fechou” o trabalho e publicou.

A conclusão chamou a atenção:

“Sem as pernas, o caranguejo fica surdo”.

Você consegue imaginar quanto os endodontistas sofreram com a famosa passagem da lima K 20 para a 25 em canais curvos, como o MV dos molares?

Não, não consegue.

Só os que passaram por isso sabem como era.

Hoje é fácil, não é?

Pois é, houve um tempo em que não era.

Pelo contrário, era difícil.

Não existiam as técnicas que conhecemos e principalmente não tínhamos os instrumentos que temos hoje.

Mas era obrigatório.

– Professor, não consigo “levar” até a 25.

– Tem que levar.

Era assim até um tempo não muito distante.

Foram muitos os desvios.

Inimagináveis para os tempos atuais.

Quando comecei a pensar com a minha cabeça e a andar com as minhas pernas, resolvi eliminar algumas correntes que me mantinham preso ao imutável.

E aí comecei a perceber algumas coisas.

Uma das mudanças foi justamente nessa dificuldade de “levar até a 25”.

Passei então a instrumentar bem com a lima 20 e tentava com a 25. Ela não chegava.

Repetia a lima 20, instrumentava bem e novamente a 25. Chegava um pouco mais.

Nesse processo, algumas vezes, nem sempre, conseguia chegar no CT com a 25 e com ela trabalhar.

Mas quando não era possível (curvatura mais acentuada), encerrava o preparo e obturava o canal.

Como não tinha instrumentado com a lima 25 ou não o tinha feito como desejava, o cone de guta percha nº 25 dificilmente chegava no CT.

Obturava com o cone 20.

Entretanto, não usava o cone 20 estandardizado. Além de flexível demais, ficaria folgado, porque nesse processo de alternância das limas 20-25, o canal, se não tinha sido ampliado ao ponto de permitir o cone 25, já não “aceitava” o 20 porque este ficava folgado.

Solução?

O cone acessório R 8, da Tanari.

Que absurdo!

Onde já se viu obturar com cone acessório?

Ninguém obturava canal com cone acessório como principal.

A “proibição” já estava no nome; cone principal, cone acessório.

Como e porque inverter, fazer do acessório o principal?

Inaceitável!

Mais rígido que o cone estandardizado, o cone R 8 da Tanari tinha um calibre que permitia obturar bem canais nessas condições.

Com uma lâmina de bisturi fazia os ajustes necessários (nunca gostei de fazer o corte da ponta do cone com tesoura).

Numa tentativa de me criticar e espalhar o meu “erro”, uma professora de Endodontia adorava dizer:

“Sabe qual é a mais nova de Ronaldo? Só instrumenta os canais agora até a lima 20 e obtura com cone acessório”.

Não lhe faltava quem quisesse ouvir e disseminar mais ainda “a mais nova de Ronaldo”.

Não é uma maravilha?

É a síndrome do caranguejo pela ótica do pesquisador aí em cima.

O pensador de Rodin

Por lhes arrancarem as pernas da imaginação, que lhes permitiria pensar, muitos se tornam surdos e não conseguem ouvir nada que exige reflexão.

Surdos, mudos não. Por isso falam bobagens.

Já há alguns anos estão usando cones acessórios que foram “transformados” em principais pela própria indústria.

Mas não devem ter percebido.

Aprendi que muitos não concluem pela análise do resultado, do fato.

A interpretação é o caminho escolhido.

O problema é quem interpreta.

Fazem da interpretação um atalho

Um atalho que se perde em si mesmo.

Por isso não andam.

E nós, endodontistas, que caminho iremos seguir?

Caminho a seguir

Incongruência

Não há vento favorável para quem não sabe a que porto se dirige

Por Ronaldo Souza

Estudos da anatomia tridimensional dos canais têm sido publicados mais recentemente.

Ótimo.

Já existiam antes.

Estudos clássicos e de grande importância, como os de Hess e Keller, mostraram não só muito da anatomia dos canais, mas também e sobretudo a inesgotável imaginação do homem.

No Brasil, o Prof. Pécora também dedicou parte do seu tempo a esse tema e como sempre o fez com a visão de quem se antecipa ao momento.

A sua dedicação, por exemplo, à discussão sobre o real diâmetro anatômico apical é digna de elogios.

No entanto, arrisco-me a dizer que é possível que ele tenha experimentado alguma sensação de decepção, ainda que esta seja uma palavra forte, por não ver ter sido levada adiante como deveria a discussão de tema tão importante para a Endodontia.

Discutir essa questão poderia, quem sabe, mostrar os equívocos cometidos quando se fala em instrumento único.

Ainda que motivados por razões desconhecidas, talvez até os pastores do instrumento único repensassem um pouco essa questão.

Menos gente seria enganada.

Mas, lamentavelmente, a abrangência do pensamento recíproco não é contemplada pela concepção do instrumento reciprocante.

Esta, concepção do instrumento reciprocante, tem limites contidos, restritivos, pequenos.

Não falo do instrumento, muito menos da sua cinemática.

Falo da concepção.

Esta é pequena.

E torna a Endodontia menor.

Para muitos, o conhecimento do real sentido e valor das coisas pode ser frustrante.

Por isso fazem a opção pelo caminho mais fácil.

E o caminho mais fácil é o da ilusão.

Se houvesse uma passagem bíblica sobre isso talvez fosse assim:

Engana-te a ti mesmo e serás feliz.

Hoje, a computação gráfica permite ir mais longe e o conhecimento já adquirido pode ser ampliado.

A tecnologia a favor do homem.

Quem tem pelo menos razoável conhecimento dessa ferramenta fantástica pode ter rico material nas mãos.

Mas é importante que se entenda que não basta possuir e apresentar os recursos visuais que podem ser explorados nesse material.

Apresenta-los é pouco se não se discutir o seu real significado e que impacto traz para a clínica.

De que adianta, por exemplo, o conhecimento da anatomia dos canais se na primeira esquina ele é jogado fora e se aponta para um instrumento como a solução dos problemas?

Daí surgem cantos da sereia, como o “domínio da anatomia”.

Dissemina-se a ideia de domínio da anatomia quando na verdade o que se faz é vender o instrumento.

A maravilha da computação gráfica nos mostra toda a complexidade do sistema de canais e no momento seguinte estamos falando de “domínio da anatomia” pelo instrumento dourado, vermelho, amarelo, cor de rosa…

E o que faz o instrumento?

Entra na curvatura e lá trabalha com mais fidelidade a ela.

Pouco?

Não.

Muito.

Mas ainda pouco.

Temos belos instrumentos, boas técnicas, tecnologia, computação gráfica, mas falta imaginação.

Dizer que temos o domínio da anatomia é a maior prova disso.

Estabelece-se assim a perversa indústria da seca.

A indústria da seca de imaginação se fortalece onde não há informação. Esta é negada ou distorcida.

A olhos vistos o conhecimento perde espaço para os “recentes avanços”.

Por onde ir?

Esta é a dúvida atual de muitos profissionais que percebem os descaminhos e se assombram com o rumo que a Endodontia está tomando.

Recentemente, uma experiente colega definiu assim o momento:

“A coisa está fora de controle”.

Não os vejo mais como professores, mas como “formadores” de opinião que precisam entender que a Endodontia não é um mar cor de rosa.

Nem azul.

Estamos precisando urgentemente voltar a falar de Endodontia.

Ainda que as mudanças de comportamento sejam comuns entre gerações, não é incomum que, cobertos de aplausos, alguns cheguem atropelando o que se construiu ao longo dos anos.

Em qualquer segmento profissional não é incomum que os “modernos” tenham a cabeça no passado.

O uso da simplificação como argumento muitas vezes constitui uma farsa e não passa do mais puro e cínico simplismo.

Geração de Ouro foi responsável pelas mais belas e importantes discussões da Endodontia brasileira.

Hoje, estamos às voltas com a geração do instrumento de ouro.

Marcante no momento atual, a pobreza mental tomou as rédeas das discussões endodônticas.

“Sufoco de ter somente isso à minha volta”.

Nenhuma ideia grande'

* A frase “Não há vento favorável para quem não sabe a que porto se dirige” é de Luis Carlos Prestes.
** Álvaro de Campos é na verdade um dos heterônimos de Fernando Pessoa, grande poeta português.
*** Editei o vídeo em que Bethânia declama Fernando Pessoa para “traze-lo” para a Endodontia. Como também o texto “Nenhuma ideia grande”.

Falando de Endodontia

Luz

Por Ronaldo Souza

Há algum tempo comecei a encaminhar vídeos para o YouTube.

Não tinha nenhuma preocupação com o “tipo” de vídeo. Ora eu falava de política, ora de futebol, música, cinema…

Era mesmo um “falando da vida”.

Não há, porém, como não reconhecer que era fundamentalmente sobre política.

O momento não me permitia ficar alheio ao que vinha acontecendo há algum tempo.

A vida me leva e o momento me faz.

Recebi então um comunicado do YouTube dizendo que “eles”, do YouTube, tinham criado um canal para mim.

Assim fiquei sabendo que tinha um canal lá.

Segundo uma aluna de graduação da Bahiana, agora eu era um “youtuber”.

Eu poderia criar uma frase de efeito como a vida não lhe manda recado, faz.

Mas não direi isso.

Por uma razão bem simples.

Ela me manda recados.

Já fez isso comigo algumas vezes.

Aprendi a prestar atenção neles.

Atento, vi outro momento surgir e me dizer; agora vá por ali.

Fui.

Por um direcionamento que me parece não ter sido resolução minha e sim da vida, de repente me vi assistindo a alguns vídeos do YouTube sobre Endodontia, algo que não fazia.

Literalmente chocado.

Foi assim que me percebi.

Apesar de o tema ser Endodontia, pouco a Endodontia ganhava com os vídeos.

Muitos deles não tinham como objetivo, como não têm, dissemina-la. São outras as intenções.

Ocorreu-me então fazer alguns vídeos que falassem de Endodontia.

E aí um mundo novo se apresentou à minha frente.

Novo e desafiante, porque envolve muita coisa.

Tecnologia é uma delas.

E tecnologia tem custo.

Hoje poucas vezes vejo vídeos de Endodontia porque o que queria ver já vi.

Mas, como poderia negar que alguns que vi são muito bem feitos?

Imagem, som, iluminação…, sensacional!

Fiquei preocupado. Como pensar em apresentar vídeos que não terão esses recursos técnicos que os tornam tão atrativos?

Como desconsiderar os recursos da computação, a tecnologia de última geração, enfim, as produções spielberguianas?

Lembrei-me então que não era essa a minha proposta.

Pelo contrário, completamente diferente.

Fiz os vídeos e enviei para o YouTube.

E eis que surge um novo momento, que resolvi colocar em prática.

A criação de um novo canal.

O canal que foi criado pelo YouTube, e por isso sequer tinha um nome, será mantido, agora com o nome Falando da Vida, com todas as postagens que lá estão, inclusive os vídeos de Endodontia.

Mas estes vídeos de Endodontia já estão também no novo canal, o Falando de Endodontia.

Ou seja, os primeiros vídeos feitos sobre Endodontia já estão no canal Falando de Endodontia e os outros que agora virão serão postados somente lá.

A depender das orientações que espero receber do YouTube, com o tempo os vídeos sobre Endodontia deverão ser excluídos do Falando da Vida e serão encontrados somente no Falando de Endodontia.

No momento em que escrevo este texto, meu canal no YouTube, agora com o nome Falando da Vida, tem 3.571 inscritos.

Pela ordem de postagem dos quatro vídeos de Endodontia que estão nele, cada um tem 735, 943, 952 e 844 visualizações respectivamente. Além deles, o primeiro, um “piloto”, tem 288.

Por que falo sobre isso?

Porque não gostaria de perder esses números que registram as visualizações de colegas que prestigiam as minhas postagens e para isso vou tentar esse contato com a equipe do YouTube para ver o que pode ser feito.

http://www.youtube.com/watch?v=r90QMqFcUbA&t=8s%20

Portanto, aqui faço um pedido. Aqueles que se inscreveram no “primeiro” canal (agora chamado de Falando da Vida) só para acompanhar os vídeos de Endodontia, inscrevam-se no Falando de Endodontia porque os próximos vídeos sobre Endodontia serão postados somente lá.

Uma mudança foi feita também aqui no site. A seção que você se acostumou a ler como Conversando com o Clínico agora é Falando de Endodontia.

Seja qual for a solução que terei do YouTube, de agora em diante teremos lá dois canais; o Falando de Endodontia e o Falando da Vida.

Seja bem-vindo a ambos.

Para visitar o canal de Endodontia, clique aqui Falando de Endodontia.

A vida em um consultório

Tibet

Por Ronaldo Souza

Há alguns anos um paciente me foi encaminhado para tratamento endodôntico de um molar inferior.

Suíço, trabalhava em Brasília, no Itamaraty.

Contou-me que já tinha morado em vários lugares do mundo e que passara alguns anos no Tibet, onde aprendeu a fazer meditação em níveis profundos (por isso tinha ido para lá).

Naquele momento, entretanto, por opção pessoal estava trabalhando em Salvador, no governo de Waldir Pires.

Disse-me que Waldir Pires era o maior estadista do Brasil e tamanha era sua admiração por ele que, pelo fato de vir trabalhar por opção pessoal na Bahia, temporariamente perdia alguns direitos que tinha no Itamaraty, entre os quais tratamento grátis com dentista e médico.

Apesar das “perdas”, sentia-se honrado em trabalhar para o governo daquele homem.

Admirei-o.

Após procedimentos iniciais de conversa, preenchimento da ficha clínica… ele fez um pedido.

Queria fazer o tratamento sem anestesia.

Era um molar inferior com polpa viva.

Por que falei no Tibet?

Porque foi onde ele aprendeu a fazer meditação e graças a ela nunca tinha feito tratamento odontológico sob anestesia.

Um detalhe.

Nunca tinha feito tratamento endodôntico.

Expliquei a ele que era inimaginável faze-lo sem anestesia.

Firme na sua decisão, insistiu na intenção.

Só me pediu alguns minutos para fazer meditação e entrar num outro plano (aqui são palavras minhas).

Ele sentado na cadeira, eu no mocho.

Ele se concentrando, eu temendo o que me aguardava.

Ele pronto, eu ansioso.

Começamos.

Sempre olhei muito para o semblante do paciente enquanto o tratava.

Já durante a anestesia, paciente geralmente de olhos fechados, eu de olhos abertos, olhando bem para as suas reações. Desde o simples piscar de olhos (fechados) até movimentos de braços, pernas…

Nele, sem anestesia, quadrupliquei a atenção.

Nunca minhas mãos tinham sido tão leves como naquele dia.

Ele, tranquilo.

Parecia que nada havia naquela sala além dele.

A broca cortando esmalte, agora em dentina.

Ousei entrar no seu mundo.

– Tudo bem?

– Tudo.

Avancei mais com a broca, mas, sabendo da sua inexperiência (novinha, primeiro emprego, primeiro dente no qual trabalhava), pedi a ela que fosse o mais suave possível.

Ousei outra vez.

– Posso continuar?

– Pode.

Fui notando “mudanças”.

Mais pálido, as primeiras e tímidas gotas de suor.

De novo.

– Posso continuar?

– Pode.

A broca já carregava sentimentos de culpa e diminuiu seu ímpeto.

Pluma, minha mão passara a ser muito, muito leve.

Mais palidez, mais gotas de suor, já não mais tão tímidas.

A insustentável leveza das mãos.

E da voz.

– Quer parar?

– Não.

Olhava agora para uma vela branca, que se derretia sob o comando de algo incontrolável.

Era o calor das entranhas contorcendo-se para suportar o insuportável.

Ainda em dentina, não aguentei.

Ele também não.

Paramos.

Naqueles minutos de eternidade me vi um torturador.

Ainda que um torturador sem sensações sadomasoquistas.

E, para conforto da minha alma, com “autorização” do torturado.

Mas autorização que não conseguia afastar o meu desconforto.

Ele estava literalmente branco, encharcado de suor, que banhava também a cadeira.

Disse que nunca tinha sentido dor tão intensa, tão forte que lhe provocava um esforço cada vez maior na busca da serenidade da mente.

Pela primeira vez não conseguiu.

Pelo que vi e pelo seu relato imaginei vísceras ardendo em chamas.

Marcamos então outra consulta.

Dessa vez com anestesia.

Muitas vezes não a vemos, mas a vida passa todos os dias pelos nossos consultórios.

Para que eles usam localizador foraminal?

Por Ronaldo Souza

  1. O canal radicular é composto por canal dentinário e canal cementário.
  2. O local onde se encontram o canal dentinário e o cementário ficou conhecido como limite CDC (Cemento-Dentina-Canal).
  3. O tecido que se encontra no canal dentinário é pulpar.
  4. O tecido contido no canal cementário é uma invaginação do ligamento periodontal, portanto, é tecido periodontal.
  5. O campo de ação do endodontista é o canal dentinário.
  6. O limite CDC representa o ponto de maior constrição do canal radicular.

Estes são postulados clássicos da Endodontia.

Dito isto, vamos observa-los mais de perto.

Para começo de conversa, diria que até o item 4 não existem dúvidas nem interpretações que possam ser consideradas corretas ou equivocadas.

De maneira simples, direta e objetiva, podemos dizer; é aquilo e aquilo mesmo.

Dali em diante, talvez não.

O limite CDC é algo consagrado na literatura endodôntica.

A partir do conhecimento sobre os tecidos que o compõem e da definição dos seus limites espaciais, tornou-se muito forte o consenso de que ali era o ponto onde deveriam ser estabelecidos os limites apicais de instrumentação e de obturação dos canais.

Apesar de ser periodontal o tecido contido no canal cementário ficou conhecido como coto pulpar.

O respeito ao coto pulpar também é algo consagrado na literatura endodôntica.

Traumatiza-lo sempre esteve fora de cogitação.

Daí o conceito de que aquela porção final do canal era sagrada.

Ainda que o coto pulpar não mais estivesse vivo e sim necrosado, sem ou com lesão periapical, aquele limite tinha que ser respeitado.

Mas que limite?

O limite CDC.

“O comprimento de trabalho ideal, acordado entre a unanimidade dos autores desde os estudos de Grove, situa-se no limite CDC. Aparelhos eletrônicos promovem a detecção exata da constricção apical”.
Spironelli, CA e Bramante, CM

Sabendo-se que o canal cementário, e consequentemente o tecido que o compõe, não representavam o campo de ação do endodontista (este era representado pelo canal dentinário), era na constrição apical (CDC) o limite apical no qual deveria trabalhar o endodontista.

Ali ele instrumentava o canal, ali ele o obturava.

Então o comprimento de trabalho do endodontista era… era qual mesmo?

Observando a tabela acima, onde podemos ver uma pequena amostra da diversidade de comprimentos de trabalho recomendada, parecem ficar claras as dificuldades existentes.

Onde finalmente era esse limite?

Onde finalmente o endodontista deveria “parar”?

Ela nos mostra que a depender do autor e da condição tecidual os comprimentos preconizados são os mais diversos possíveis.

Como recomendar tantas e tão diferentes medidas?

Como podiam os professores exigir precisão diante de tamanha imprecisão?

Afinal, era o conhecimento da anatomia e dos tecidos que constituem as porções finais do canal ou o “achar” de cada professor?

Em outras palavras, era o conhecimento ou a interpretação dele?

“Não há verdades definitivas. Apenas interpretações sobre a realidade, condicionadas pelo ponto de vista de quem as propõe”.
Nietszche

Apesar de esse tema não ter sido percebido e analisado sob essa perspectiva, a tabela nos diz algumas coisas, mas a principal delas:

Ninguém sabe onde é!

Foi nessa onda que chegaram os localizadores apicais eletrônicos.

E o mundo foi salvo.

Os endodontistas podiam “ver” agora com facilidade a impedância dos tecidos que compunham os canais dentinário e cementário.

Ao “apito” do aparelho, sabíamos; cheguei lá.

Cheguei no CDC.

Aqui é o meu limite.

Aqui é onde devo parar.

Pronto, dali por diante, depois da descoberta dos localizadores apicais eletrônicos, finalmente o coto pulpar podia descansar em paz. Estava definitivamente resguardado.

Finalmente, a medida exata, a precisão com que tanto sonháramos.

Saímos mundo afora cantando aos quatro ventos a oitava maravilha do mundo.

Baixaram um decreto.

“A partir de agora, quem não usar localizador apical eletrônico está ultrapassado”.

Mas o mundo não é perfeito.

O mundo da Ciência menos ainda.

Começaram a perceber que não era exatamente daquele jeito.

Ainda existiam problemas, dificuldades a serem contornadas e por razões diversas percebeu-se que a precisão ainda não tinha sido alcançada.

Se já tínhamos avançado para a impedância, avançávamos agora para a frequência.

Ângelo CT 1 fig. 2

Agora sim!

Novos aparelhos, novos conhecimentos, novos…

Sim, mas… e a exatidão?

“A nova geração dos localizadores eletrônicos foraminais nos dá uma segurança de 100% na localização do limite CDC”.

Resta ainda alguma dúvida?

Não. Segundo muitos profissionais, questão resolvida.

Então vamos adiante.

Ser ou não ser. A anatomia é a questão

“A constrição apical parece ser mais um mito do que uma realidade”.
Walton, R. Princípios e Prática em Endodontia – 1997

“A constrição apical geralmente não existe”.
Wu, MK et al. O Surg O Med O Pathol Jan 2000

“A localização clínica do limite CDC é impossível”.
Ponce, EH e Vilar Fernández, JÁ. J Endod, 2003

“Os nossos resultados indicam que o limite CDC e a constrição apical são dois pontos distintos e que o diâmetro do canal no CDC é sempre maior do que o da constrição apical”.
Hassanien, EE et al. J Endod Abr 2008

Observe duas coisas.

Não falo desse ou daquele profissional, desse ou daquele autor.

Muitos são citados neste e em outros textos que escrevo. Com alguns deles concordo, de outros discordo.

A discussão é feita em cima de ideias, não importa de quem sejam.

A outra questão é a seguinte.

O localizador é mais um recurso importante para o tratamento endodôntico e muito bem-vindo. A questão, mais uma vez, é a conotação que deram e dão. Querem por exatidão onde não existe.

Há muito tempo os estudos de anatomia já mostram as peculiaridades dos canais, particularmente no terço apical.

“A constrição do canal só pode ser observada na secção adequada de um corte histológico e este é o único método que permite a determinação do comprimento de trabalho”.
Langeland, K. 1995

O diálogo

Se você ainda não leu Os limites na Endodontia, convido-o a fazer isso para nos entendermos melhor. Trago de lá a imagem abaixo.

Limites

Pelo que observamos naquele texto e na imagem acima, como é possível determinar com precisão o limite CDC se em um mesmo canal há uma grande variabilidade na extensão do cemento?

Existem alguns e não um limite CDC.

Como querer precisão nessas condições?

Voltemos à figura 2 e à frase que diz que “para que o localizador tenha a eficiência desejada, é necessário que o instrumento atinja o forame…”.

Por que ele tem que atingir o forame?

Por uma razão bem simples.

Porque, graças à complexidade da anatomia naquele segmento do canal, o localizador não é capaz de fazer a leitura perfeita, aquela que todos desejam e dizem existir.

Então ele precisa ir até o forame apical e de lá perguntar ao endodontista.

– Cheguei. Já estou aqui no forame apical e pelo caminho fui vendo que existem alguns pontos em que a dentina se encontra com o cemento. Qual deles escolho para você registrar aí como seu limite CDC? Ou você prefere que eu recue de acordo com o protocolo que você segue?

O que fazem nessa hora?

Daquela medida registrada pelo localizador no forame, recua-se o necessário de acordo com o limite que o profissional usa, geralmente a depender da escola que ele segue.

Numa grande quantidade de vezes, esse recuo é de 1 mm.

O CT será então 1 mm aquém do registro do localizador.

Confere?

Ou você conhece alguém que usa 0,5 aquém nos pacientes jovens e 0,7 nos pacientes idosos, como detalhou Kuttler em 1955?

Sabendo-se que essas medidas representam médias e, portanto, existem inúmeras outras, como 0,2 ou 0,3 ou ainda 0,8 e 0,9, algum localizador registra assim o limite CDC?

Posso lhe fazer uma pergunta?

Por que inicialmente foram chamados de localizadores apicais eletrônicos, como os tratei até aqui, e agora são chamados de localizadores foraminais eletrônicos?

A precisão desnecessária

Voltemos novamente à figura 2, à primeira parte da frase superior.

“Por décadas, trabalhamos além do forame apical sem saber”.

Uma evidente crítica à possibilidade de a radiografia eventualmente nos dar a falsa impressão de estarmos dentro do canal.

Ora, se “para que o localizador tenha a eficiência desejada, é necessário que o instrumento atinja o forame…”, ele já está fora do canal.

Fora do canal, ele já está nos tecidos periapicais!

Se alguém imagina o contrário, desconhece anatomia apical.

No forame 1

Observe a figura acima. A lima está “dentro” do forame, porém, vista numa visão mais próxima na figura abaixo, ela aparece dentro do forame sob a perspectiva da parede que está “atrás” dela (como se fosse a face palatina), mas está 1 mm fora sob a perspectiva da parede anterior (como se fosse a face vestibular).

No forame 2

E o que dizer das imagens na figura abaixo, do trabalho de Blaskovic-Subat e colaboradores?

No forame''

A radiografia nos daria “uma falsa impressão do instrumento dentro do canal, pela angulação e formação do halo apical”.

Verdade.

Para os mais jovens, o halo de que se fala corresponde à quantidade de tecido mineralizado que está “por trás” da lima na figura acima, cuja extensão é mostrada pela seta dupla preta pontilhada (letra C).

Pela radiopacidade desse tecido “em volta e acima” do instrumento que apareceria na imagem da radiografia periapical, imaginaríamos que o instrumento está dentro do canal, quando, na verdade, está fora.

E o que nos diria o localizador foraminal? Pela parede “palatina” ele ainda está ligeiramente aquém da abertura foraminal, portanto, “dentro do forame”, mas pela parede “vestibular” ele está além do forame apical.

Aí o localizador daria um alerta.

– Doutor, cuidado! Pela parede “palatina” o instrumento ainda está ligeiramente aquém do forame e pelas proximais, mesial e distal, ligeiramente fora. Mas pela parede “vestibular” ele está completamente além do forame apical, portanto, nos tecidos periapicais.

É assim?

Estou enganado ou posso dizer que não é?

Sendo assim, mesmo com o localizador e sua “precisão não tão precisa”, não teríamos ainda alguma possibilidade de trabalhar “por décadas… além do forame apical sem saber”?

E que história é essa de que só estamos em tecidos periapicais quando estamos além do forame apical?

Qual é o tecido que invagina e preenche o canal cementário?

Coto pulpar

O ligamento periodontal. Observe como é ele que penetra no canal cementário.

Ali, ele é tecido periodontal apical. Sendo assim, o instrumento não precisa estar além do forame para estar em tecido periapical.

Digamos, porém, que existisse um único limite CDC e este fosse detectado pelo localizador com precisão.

Ótimo.

Para que?

Duas questões devem ser consideradas.

A ampla, total e irrestrita ampliação foraminal que fazem em todos os tratamentos endodônticos e a enorme quantidade de material obturador que jogam nos tecidos periapicais.

Surplus''

Surplus'''

Como pode alguém que preconiza, ensina e estimula isso falar de cuidados e preocupações com os tecidos periapicais?

Como explicar o Glória nas Alturas pelos localizadores e as cabecinhas balançando no amém, amém, amém pelo “surplus”?

Fronteiras

O que são fronteiras?

Vamos pegar uma parte da definição do Wikipédia.

“Fronteira é o limite entre dois países… As fronteiras podem ser naturais, geométricas ou arbitrárias…”.

Vamos simplificar?

Esses limites determinam que as pessoas de um país não ultrapassem a fronteira e entrem no outro sem a devida autorização. 

Cada país mantém nas suas fronteiras funcionários devidamente treinados para não permitir que os limites existentes sejam invadidos por pessoas “estranhas” a aquele país.

A indevida ultrapassagem das fronteiras gera desconforto e consequências diplomáticas entre os países fronteiriços.

Imagine a seguinte situação.

O mundo resolve acabar com as fronteiras.

Não há mais fronteiras, não há mais limites de circulação entre os países.

Diante dessa perspectiva, você acha que os países manteriam as suas fronteiras com quadros de funcionários treinados e bem remunerados para essa função específica para que as fronteiras fossem respeitadas?

Para que?

Para que serviriam eles?

Já imaginou para onde vamos agora?

Isso mesmo, para a Endodontia.

Consideremos os “países” dos tecidos apicais-periapicais; cemento-dentina-canal-tecidos periapicais. Por razões óbvias, vamos deixar de lado a questão da fronteira geométrica.

Aceitemos o limite CDC como a fronteira natural entre cemento e dentina.

Seria ali a fronteira entre o que se considera o campo de ação do endodontista, canal dentinário, e os tecidos periapicais.

Os deuses da endodontia moderna, que falam pelos instrumentos e aparelhos e não pela Endodontia, precisam entender que era esse limite que ditava os procedimentos do tratamento endodôntico.

Se certos ou errados é outra questão.

Não se trata de concordar ou discordar da concepção, essa é outra questão, mas a proposta do localizador era, por ser preciso na detecção do limite CDC, não traumatizar tecidos adjacentes, aqueles que não estariam inseridos no contexto do preparo e obturação do canal.

Lembre que, concordando ou não, o canal cementário não era incluído no preparo do canal nem na obturação e muito menos os tecidos periapicais.

A louvada precisão de 100% do localizador significa então que você vai usar uma ferramenta para detectar com exatidão o limite CDC (maravilha!) para logo em seguida destruí-lo com a ampliação foraminal e jogar uma enorme quantidade de material obturador nos tecidos periapicais.

Não é um espetáculo?

A louvada e inexistente precisão de 100%, diga-se de passagem.

Por que todo esse encantamento e interesse em disseminar uma ferramenta que “detecta” o limite CDC com precisão de 100%, se na “excelência em endodontia”, da qual se fala todo dia, invadem e destroem a fronteira natural entre cemento-dentina-canal-tecidos periapicais em todos os tratamentos endodônticos?

Por que cantam em prosa e verso a necessidade da precisão do localizador se destroem o limite que ele registrou com precisão e é por ali que inundam os tecidos periapicais com material obturador?

Não percebem a contradição?

Usa-se, na verdade, a fronteira arbitrária para se determinar o comprimento de trabalho.

Vai-se ao forame com o localizador foraminal e de lá se faz o recuo de acordo com o protocolo da escola que seguem.

Qual é o mais utilizado?

1 mm aquém.

…com frequência, se processa uma separação definitiva entre o falado e o vivido, e a ciência se torna um jogo de conceitos… Malabarismo verbal, virtuosismo conceitual.
Rubem Alves – Conversas com quem gosta de ensinar, 2002

O sucesso ao seu alcance na Endodontia

Olá pessoal,

Agora será em Aracaju.

Divulgação

Como curso com carga horária de 4 horas, terá uma programação mais abrangente. Veja.

O sucesso ao seu alcance na Endodontia
Análise crítica do momento atual do tratamento endodôntico

  • A importância do limite apical de trabalho
  • Como obter excelência nas suas obturações