Sentidos opostos

Moro, MP, PF e escárnio

Por Ronaldo Souza

Ao juiz Sergio Moro, Ministério Público, Polícia Federal, Supremo Tribunal Federal.

Deixemos de lado todos os acontecimentos anteriores; vazamentos extremamente seletivos, prisões irregulares, coerção, torturas psicológicas e mesmo físicas pelas condições impostas.

Vamos somente aos fatos mais recentes.

Vindo à tona, o vídeo do depoimento do Sr. Paulo Roberto Costa o mostra dizendo o seguinte:

“Então, assim, eu conheço ele, mas nunca tratei de nenhum assunto desses com ele, nem põe o nome dele aí porque ele, não, ele não participava disso”.

É verdade que Vossa Excelência e a operação sob o seu comando, conhecida como Lava Jato, não incorporaram as declarações do Sr. Costa ao processo, mas aos autos foi incorporada a “sua” interpretação, oficialmente chamada de “transcrição”?

Se isso é verdade, permita-me convida-lo para uma interpretação conjunta.

Por favor, não interprete como insolência da minha parte. É que também tenho o hábito de querer interpretar as coisas.

Depoimento do Sr. Paulo Roberto Costa:

“…eu conheço ele (Marcelo Odebrecht), mas nunca tratei de nenhum assunto desses com ele, nem põe o nome dele aí porque ele, não, ele não participava disso.

Ao dizer que ”… nunca tratei de nenhum assunto desses com ele, nem põe o nome dele aí porque ele, não, ele não participava disso, a impressão que tive foi a de que Paulo Roberto Costa disse que ele, o Sr. Marcelo Odebrecht, “não participava disso, ou seja, das falcatruas a ele atribuídas.

Com a supressão do vídeo e a incorporação da transcrição aos autos da afirmativa “a despeito de não ter tratado diretamente o pagamento de vantagens indevidas com Marcelo Odebrecht”, a interpretação que foi dada pelo senhor e a sua laboriosa equipe não estaria equivocada?

Peço desculpas por ser, digamos, repetitivo, e tomar o seu precioso tempo, mas mesmo temendo ter como resposta um “não vem ao caso”, peço-lhe que me corrija se eu estiver errado.

Quando o senhor desconsidera “nem põe o nome dele aí porque ele, não, ele não participava disso e diz que “a despeito de não ter tratado diretamente o pagamento de vantagens indevidas com Marcelo Odebrecht” o senhor quis dizer pode pôr o nome dele aí porque ele participava disso?

Se assim for meritíssimo com todos os méritos, ao contrário do que disse o delator bastante premiado, Vossa Excelência afirma, nos autos sem o vídeo, que o Sr. Marcelo Odebrecht fez “o pagamento de vantagens indevidas”.

Estaria correta a minha interpretação?

Mesmo após tentativas diversas de conte-la, aproximando-me do impossível, um esforço hercúleo, não alcancei o meu intento (peço que entenda e aceite o meu modo de falar, é uma tentativa desesperada, provavelmente vã, de me aproximar daquele linguajar que nos deixa encantados nos tribunais), ela veio.

A dúvida atroz e avassaladora se transformou em palavras (por aí, meritíssimo, no meio desse povo inculto, vulgarizam chamando esse momento de profunda introspecção de “a pergunta que não quer calar”. Veja [opa] que absurdo).

Para que delatores bastante premiados?

Para que delações bastante premiadas?

Não seriam melhores, mais rápidas, mais práticas e cômodas somente as transcrições?

Excelência, só mais dois minutinhos.

Diante da perplexidade que se apossou do meu ser (permita-me continuar sonhando o sonho impossível, já exposto aí em cima), ia fazer também algumas considerações sobre a não gravação da delação contra o Sr. José Dirceu.

No entanto, o tempo (in)disponível e a leitura do texto de Renato Rovai me fizeram ver que dificilmente seria tão feliz no texto como foi o jornalista.

Por isso faço a transcrição, literal, sem interpretações, do depoimento dele.

Os negritos são meus.

“É inexplicável a ausência de gravação em delação contra Zé Dirceu

Por Renato Rovai

Fernando Moura fez um acordo de delação premiada e deixou a prisão. O que se sabia até ele ser ouvido pelo juiz Sérgio Moro, no dia 22, última sexta-feira, era que ele revelara como o ex-ministro José Dirceu organizou, a partir da diretoria de Serviços da Petrobras, controlada por Renato Duque, uma parte do que seria um caixa dois do PT.

Acontece que Fernando Moura, confrontado por Moro com as suas supostas declarações, não as confirmou. E como José Dirceu é citado na delação que agora Moura nega, Roberto Podval, advogado do ex-ministro, fez o óbvio e solicitou as gravações do que estava transcrito. Áudio, vídeo, sinal de fumaça, qualquer coisa.

E a resposta do Ministério Público foi a de que elas não existem.

Não faz o menor sentido não gravar uma delação tão explosiva quanto essa numa investigação do porte e do risco da Lava Jato.

Qualquer estagiário de jornalismo sabe que se chegar na redação com uma história dessas sem qualquer prova e tiver um editor responsável, ela não é publicada.

Ou seja, a ausência de gravação não cola.

Nelson Rodrigues poderia atribuir isso ao Sobrenatural de Almeida ou poderíamos dizer que se trata do inexplicável futebol clube. Mas em casos de investigação criminal o inexplicável não condena ninguém. Absolve. Se não tiver como explicar e provar, não vale.

O MP e a PF parecem ter aberto a temporada de brincar com fogo. O nome da Operação de hoje, Triple X, também é mais político do que qualquer outra coisa. Há uma sanha persecutória em alguns ambientes que hoje atinge uns, mas que amanhã pode atingir outros.

Nunca é tarde demais para lembrar que o Estado de Direito deve ser sempre o limite da democracia. E brincar com ele é brincar com ela”.

“Processo marcha para a frente”

Essas foram as palavras do juiz Moro ao justificar a negativa de acesso aos vídeos aos advogados.

Excelência, se eu disser que negar aos advogados acesso ao depoimento dos seus clientes soa absolutamente incompreensível e injustificável em qualquer julgamento estarei errado?

E agora, com a delação de Fernando Moura favorável a José Dirceu, à qual os advogados também quiseram ter acesso, os órgãos à frente da Lava Jato dizem ao país que a delação contra José Dirceu não foi gravada e por isso José Dirceu será prejudicado.

E o que disse Fernando Moura?

Simplesmente disse ao Dr. Moro que se ele observar bem o vídeo com seu depoimento inicial vai perceber que ele nunca falou o que está na transcrição.

Em outras palavras, nunca acusou José Dirceu.

Será que estamos novamente diante de transcrições do que não foi dito?

Fala-se uma coisa e os procuradores escrevem outra? O que vaza para a imprensa, o que os delatores dizem ou o que os procuradores transcrevem?

O juiz Moro foi “convidado” a ver o erro no vídeo e aí, acuado e temendo o que surgiria, disse que o vídeo não existia porque não foi feita a gravação?

Sabe como fica a situação, Excelência?

Como disse Fernando Brito do Tijolaço, “o delator Fernando Moura, como se sabe, disse que não disse o que o Ministério Público disse que ele disse sobre o ex-ministro José Dirceu”.

Qual será a transcrição que irá para os autos?

Alguém faz alguma ideia?

Dr. Moro, a delação contra José Dirceu não foi gravada???!!!

Sabe aquilo que falei “mesmo após tentativas diversas de conte-la, aproximando-me do impossível, um esforço hercúleo, não alcancei o meu intento”? Aconteceu outra vez.

Diante do estarrecimento de todos frente a comportamento tão estranho e incomum à própria Lava Jato ou qualquer outra operação, a não gravação das delações, torna-se inevitável o questionamento.

Vossas Excelências se acham realmente sérias e dignas?

Se o “processo marcha para a frente”, como disse o juiz, o povo brasileiro começa a ter a clara percepção de que o Poder Judiciário não vai no mesmo sentido.

E faz o Brasil também marchar para trás.

Dr. Moro, o que mais a sociedade brasileira pode esperar de Vossa Excelência e dos senhores membros do Ministério Público, Polícia Federal, Supremo Tribunal Federal…?

Obs. Quando já tinha fechado esse artigo li a notícia de que Fernando Moura voltou atrás e resolveu culpar José Dirceu. Depois de convidar o juiz Moro a ver que na gravação ele nunca culpou Dirceu, não saberemos como se deu essa reviravolta na delação.

Obs 2. Os advogados do delator consideraram estranha essa nova postura de Fernando Moura. Resultado; todos deixaram o caso.

Obs 3. Pelo visto o processo nem sempre marcha para a frente. Quando necessário, ele recua, dá alguns passos para trás, para então tomar um novo rumo. A vida é assim. Sempre cheia de mistérios insondáveis.

O empresário e o juiz

Por Ronaldo Souza

“Se sujar minha toalha de linho ou pedir Marmitex… vou pirar. Saudações Sindicais? Não mereço”.

Este teria sido o comentário de Isabela Odebrecht, esposa de Marcelo Odebrecht, ironizando o convite feito à sindicalista Juvandia Moreira, líder dos bancários em SP, para que ela participasse de um jantar em sua casa em torno do ex-presidente Lula.

Desse mesmo jantar participaram vários empresários, entre os quais Jorge Gerdau e João Roberto Marinho, dono da Rede Globo.

Poderia tranquilamente dizer que é lamentável esse tipo de comentário e que na verdade refletiria a pobreza de espírito da senhora Odebrecht e que é típico dos membros que constituem a comunidade dos talheres de prata.

Tenho pontos de vista bem definidos sobre determinados segmentos da sociedade, mas não pretendo cair no que pode ser uma armadilha da hipocrisia ao analisar a frase sem inseri-la no devido contexto.

Fugindo dessa armadilha, ocorre-me a sensação de que me dirijo sem freios para outra.

O que você imagina ser o mundo empresarial?

Como imagina que funciona o universo das grandes empresas do mundo?

Como imagina ser um conglomerado que fatura cerca de R$ 100 bilhões por ano, atua em 23 países, inclusive Estados Unidos e países da Europa, e emprega 200 mil pessoas, segundo o Estadão de 20 de julho de 2014?

Só mesmo a ignorância ou razões escusas ou até mesmo ambas poderiam permitir uma visão simplista, boba e romântica sobre essa realidade. Ignorar as particularidades, magnitude e complexidade desse universo beira o retardo mental.

A essa altura da vida não posso me permitir observa-lo com o moralismo que reina no país nesse momento.

Quem somos nós de fato?

Como é a vida real?

O que é corrupção?

Rejeito a visão maniqueísta e tola do bem e do mal.

Imaginar Marcelo Odebrecht simplesmente como um corrupto ou corruptor abre um leque inimaginável de possibilidades.

Qualquer tentativa de se julgar alguém envolvido na Lava Jato exigiria que se deixasse de lado justamente o que mais se vê nos dias atuais:

A hipocrisia.

Uma vez que o empresário atua num universo de enormes possibilidades, como se dão verdadeiramente essas relações?

Quem, das relações do Sr. Odebrecht, estaria livre das mesmas acusações que lhe são feitas?

Marcelo Odebrecht e Moro 1'

Estariam alguns livres e outros não?

Se assim é, por que?

Marcelo Odebrecht é um puro sangue da elite brasileira.

As relações da sua empresa, como todos sabemos, se deram com todos os governos brasileiros.

Por que em algumas ele foi pecador e em outras santo?

Além disso, quem goza da sua relação pessoal?

Certamente não são pessoas que oferecem o risco de “sujar a toalha de linho ou pedir Marmitex…”

Em quem vota o eleitor Marcelo Odebrecht?

Em quem votou para presidente da república em 2014?

Alguém ainda tem dúvidas mesmo ele já tendo declarado o seu voto?

Você já ouviu falar em hipocrisia? Tem certeza de que sabe o que significa?

Por outro lado e sob perspectiva bem diferente, se alguém se dispuser a analisar a conduta do Juiz Sérgio Moro à frente da Lava Jato, terá que fazê-lo no mínimo com o mesmo rigor com que se tem julgado o senhor Odebrecht. Afinal, o mundo jurídico não permite, ou não deveria, a flexibilização de certos padrões que apontam para limites mais bem definidos, deixando claro que os homens da lei não deveriam ir além do que lhes permitem os rigores das normas jurídicas.

Vou me reportar somente ao juiz Moro por razões que me parecem óbvias, além do fato de considerar inexpressivos os seus pares, meras peças para a composição de um jogo.

Há quem diga que aos homens da lei cabe atuar estritamente dentro dela, com toda discrição, sobriedade, serenidade e certa reclusão em determinados momentos.

Diz-se também que alguma distância dos senhores da lei com determinados setores da sociedade deveria ser mantida e que ela deveria dar o tom nessas relações.

Não foi, entretanto, que assim se comportou o ex-ministro Joaquim Barbosa, que não mostrou nenhum constrangimento, muito pelo contrário, quando permitiu evidenciarem-se muito fortemente as características mais marcantes da sua personalidade e que dariam o tom da sua passagem pelo Supremo, particularmente quando esteve à frente da presidência; vaidade fora de controle, destempero emocional e belicosidade.

Barbosa e Gilmar 10

A ponto de ser considerado um dos ministros mais despreparados para o cargo.

Por sua vez, como justificar o ministro Ayres Britto ser autor do prefácio do livro de Merval Pereira, cujo título é “Mensalão”, quando o episódio em questão estava sob julgamento e ele era o presidente do STF? Um verdadeiro escândalo que certamente não permite colocar Ayres Britto como exemplo de nada que exija o mínimo de dignidade e bom senso.

Barbosa e Gilmar 4'

Ao mesmo tempo, ter Gilmar Mendes como uma das estrelas do lançamento do referido livro é também algo que agride frontalmente a dignidade e o bom senso, para dizer o mínimo, de qualquer cidadão que disponha de neurônios em atividade.

E, finalmente, por ser o protagonista dos episódios mais recentes nessa triste caminhada do poder judiciário brasileiro, o Juiz Moro dispensa esforço maior da memória para relembrar os feitos que o põem muito longe de ser modelo de qualquer coisa. Ainda que parcela significante da sociedade não consiga ver as evidências que apontam para um juiz que se perdeu naquilo que representa os mais elementares deveres de um guardião da Constituição.

Aceitar prêmios e homenagens de órgãos de imprensa que claramente assumiram papel de oposição partidária ao governo federal não deveria recomendar nenhum juiz numa Democracia séria e consolidada.

Diante de eventual dificuldade de compreensão do que digo acima, relembro a famosa frase dita em 2010 pela Sra. Maria Judith Brito, então presidente da Associação Nacional de Jornais (ANJ):

“Obviamente, esses meios de comunicação estão fazendo de fato a posição oposicionista deste país, já que a oposição está profundamente fragilizada”.

Um juiz que faz palestras em eventos patrocinados por revistas que francamente assumiram papel de oposição ao governo, como recentemente em evento da ANER (Associação Nacional de Editores de Revista), controlada pela Editora Abril, cuja campanha sistemática contra o governo é por demais conhecida, também não deve constituir um modelo a seguir.

Moro, Dória e ANER

Da mesma forma que o faz em eventos patrocinados por empresas de políticos em campanha eleitoral, como foi o caso do almoço-debate no Lide, de João Dória Jr., pré-candidato à prefeitura de São Paulo pelo PSDB de São Paulo.

Moro e holofotes

Certamente o recato deixou de ser uma característica do judiciário brasileiro.

Moro e Globo faz diferença

Diante disso, uma pergunta se faz inevitável.

Será que ainda corremos o risco de ver mais algum membro do poder judiciário brasileiro ser “homenageado” pela Globo em 2016?

Se isso acontecer novamente, não será acintoso demais?

Como ficarão essas instituições e como exercerão o seu poder na sociedade?

Como ficará a sociedade diante desses poderes?

Qual é o alcance do conceito de corrupção?

Só existe corrupção quando estão envolvidos valores financeiros ou também se corrompem sentimentos e valores e princípios da dignidade?

Quando a sociedade perceberá que a disfuncionalidade das instituições pode ter a sua origem num ato de corrupção que não necessariamente envolve valores financeiros?

Ao mesmo tempo, reza a Constituição Brasileira que o salário dos servidores públicos, onde se incluem juízes e desembargadores, obedece aos limites impostos como teto aos ministros do Supremo tribunal Federal, R$ 33,763,00.

No entanto, já foi amplamente divulgado que o juiz Moro recebe bem acima desse teto, numa média de R$ 77.423,66, como se pode ver no site jurídico do Conjur e também em depoimento do deputado Wadih Damous, ex-presidente da OAB Rio de Janeiro, no vídeo abaixo.

Não parece razoável que um guardião da Constituição seja um infrator dessa mesma Constituição. Se os órgãos de comunicação, ávidos por bem informar ao povo brasileiro, vazassem essa informação para a sociedade, como seria visto o juiz?

Se os valores relativos aos honorários do Dr. Moro tivessem a dimensão dos valores tratados em grandes obras entre empreiteiras e governos e essas informações vazassem para órgãos de comunicação e estes abrissem manchetes escandalosas sobre o fato de que um juiz estaria recebendo o dobro do que deveria receber, que tipo de impacto causaria na sociedade?

Que tratamento seria dispensado a um empresário que em negociações com o governo recebe deste o dobro do que deveria ser legalmente pago?

Como o juiz Sérgio Moro da Lava Jato julgaria o juiz Sérgio Moro que percebe um salário mais que o dobro acima do que determina a Constituição?

Por fim, o que dizer quando vem à tona que o delator Paulo Roberto Costa afirma que Marcelo Odebrecht não está envolvido nos episódios sob investigação da Lava Jato e esta parte do seu depoimento gravado foi retirada e alterada na transcrição para os autos, como denuncia Janio de Freitas, um dos jornalistas mais respeitados do Brasil? (veja o vídeo no final do texto).

Trago esses 3 parágrafos:

“Já como transcrição na Lava Jato do que disse e gravou o delator muito premiado, consta o seguinte: “Paulo Roberto Costa, quando de seu depoimento perante as autoridades policiais em 14.7.15, consignou que, a despeito de não ter tratado diretamente o pagamento de vantagens indevidas com Marcelo Odebrecht” –e segue no que respeitaria a outros.

As palavras de Paulo Roberto que os procuradores assim transcreveram foram, na verdade, as seguintes: “Então, assim, eu conheço ele, mas nunca tratei de nenhum assunto desses com ele, nem põe o nome dele aí porque ele, não, ele não participava disso”.

É chocante a diferença entre a transcrição e o original, entre “não ter tratado diretamente com Marcelo Odebrecht” e “nem põe o nome dele aí por que ele, não, ele não participava disso”. A reformulação da frase e do seu vigor afirmativo só pode ter sido deliberada. E é muito difícil imaginar que não o fosse com dose forte de má-fé. Do contrário, por que alterá-la?”

Leia aqui o texto de Janio

Para não nos alongarmos em demasia com detalhes que, mesmo interessantes, talvez se tornassem cansativos, o recente manifesto de 103 advogados, juristas e professores de Direito chama a atenção para as arbitrariedades do juiz Moro, na condução da operação Lava Jato, algo que, segundo eles, não foi visto nem no período da ditadura.

A imprensa, mais uma vez, tentou blindar o juiz e dar ao seu público a interpretação de que o manifesto não tinha validade porque expressava tão somente as queixas de advogados que, por serem defensores dos réus da Lava Jato, teriam os seus interesses contrariados pelo juiz.

A imprensa só não diz que dos 103 signatários, apenas 39 representam os réus da Lava Jato.

No momento em que Marcelo Odebrecht está sendo visto como um homem que cometeu todos os pecados do mundo, aguça-me a curiosidade de saber se, livre estivesse, teria amigos à sua volta num jantar a céu aberto na sua terra, a Bahia, onde certamente deve ter muitos amigos de infância e adolescência.

Digo a céu aberto (restaurante), porque fora do conforto e segurança do que imagino ser a casa de Marcelo Odebrecht e estando ao alcance da vista da sociedade, estariam os amigos dispostos e à vontade para encarar esse jantar com o pecador dos pecadores?

Pecador esse que os amigos, possivelmente inebriados com o fato de serem amigos do comandante da Odebrecht, não podiam imaginar que ele fosse. Afinal, gravitar em torno do poder sempre exigiu inocência e pureza.

Assim caminha a humanidade.

Insisto, não pretendo colocar Marcelo Odebrecht ou a sua empresa entre os mais inocentes e puros. Essa discussão é muito mais complexa do que querem fazer crer, mas a hipocrisia é inegável.

Não é preciso ser advogado, jurista ou professor de Direito para saber que direitos constitucionais elementares foram e estão sendo negados, o que talvez represente grande risco para a operação.

É possível que o juiz Moro esteja correndo um risco que não foi devidamente calculado.

É possível que todo esse imbróglio, cujos fatos e transparência têm sido insistentemente negados ao povo brasileiro, venha a ter um desfecho que não entrou nas previsões do juiz.

Ainda existe dignidade nessa história?

Se existe, de que lado estaria ela?

Não sei.

Mas não consigo vê-la do lado do juiz.

Desmoralização total do juiz Moro e da Lava Jato

Desmoralização total do juiz Moro e da Lava Jato.

Se você ainda tinha dúvida, leia esse artigo de Janio de Freitas.

Umas palavras (e outras)

Por Janio de Freitas, na Folha

Ainda com a carta pública dos 104 advogados fervilhando entre apoiadores e discordantes, a também discutida retenção de Marcelo Odebrecht na prisão dá margem a mais um incidente processual do gênero criticado na Lava Jato. Em princípio, trata-se de estranha omissão ao ser transcrita, da gravação para o processo, da parte da delação premiada de Paulo Roberto Costa que inocenta Marcelo de participação nos subornos ali delatados. Mas o problema extrapolou a omissão.

Já como transcrição na Lava Jato do que disse e gravou o delator muito premiado, consta o seguinte: “Paulo Roberto Costa, quando de seu depoimento perante as autoridades policiais em 14.7.15, consignou que, a despeito de não ter tratado diretamente o pagamento de vantagens indevidas com Marcelo Odebrecht” –e segue no que respeitaria a outros.

As palavras de Paulo Roberto que os procuradores assim transcreveram foram, na verdade, as seguintes: “Então, assim, eu conheço ele, mas nunca tratei de nenhum assunto desses com ele, nem põe o nome dele aí porque ele, não, ele não participava disso”.

É chocante a diferença entre a transcrição e o original, entre “não ter tratado diretamente com Marcelo Odebrecht” e “nem põe o nome dele aí por que ele, não, ele não participava disso”. A reformulação da frase e do seu vigor afirmativo só pode ter sido deliberada. E é muito difícil imaginar que não o fosse com dose forte de má-fé. Do contrário, por que alterá-la?

Não é o caso de esperar por esclarecimento da adulteração, seu autor e seu propósito. Seria muita concessão aos direitos dos cidadãos de serem informados pelos que falam em transparência. No plano do possível, a defesa de Marcelo Odebrecht, constatada a adulteração, requereu a volta à instrução processual, do seu início e com a inclusão de todos os vídeos da delação, na íntegra e não só em alegadas transcrições.

O juiz Sergio Moro decidiu contra o requerido. Considerou os pedidos “intempestivos, já que a instrução há muito se encerrou, além das provas pretendidas serem manifestamente desnecessárias ou irrelevantes, tendo caráter meramente protelatório”. E, definitivo: “O processo é uma marcha para frente. Não se retornam às fases já superadas”.

Não é a resposta própria de um magistrado com as qualificações do juiz Sergio Moro. É só uma decisão. Baseada em vontade. Resposta, mesmo reconhecendo-se a situação delicada do juiz Sergio Moro, seriam as razões propriamente jurídicas (se existem) para negar o pedido.

“Intempestivos” os pedidos não são. Se apenas agora foi constatada a transcrição inverdadeira, não havia como pedir antes qualquer medida a partir dela. Logo, tempestivo este pedido é. Uma instrução está “encerrada” quando não há mais o que precise ou possa ser apurado, como complemento ou aperfeiçoamento. Se há uma transcrição infiel, ou qualquer outro elemento incorreto, as provas que o corrijam são “necessárias e relevantes” porque o erro prejudica a acusação ou a defesa, ou seja, compromete o próprio julgamento de valor entre culpa e inocência. Se está demonstrada a necessidade objetiva de correção, não há “caráter protelatório”, há o indispensável caráter corretivo.

“Processo” é, por definição, um movimento que implica todas as variações, de ritmo, de sentido, de direção, de avanço ou recuo, e mesmo de intervalos de paralisação. Processo não é só “marcha para a frente”. E, no caso dos processos judiciais, se o fossem, não haveria –talvez para alegria da Lava Jato– segunda e terceira instâncias de julgamento, que são diferentes retornos às entranhas dos processos.

Como se tem visto, o decidido, decidido está. Mas o provável é que não sobreviva à instância superior, se lá chegar e seja qual for a posição de Marcelo Odebrecht entre a inocência e a culpa.

Falando da Vida: Editei este vídeo para um texto meu que já está quase pronto e será postado aqui, mas antecipo e o trago para o texto de Janio de Freitas.

Opinião publicada

Por Ronaldo Souza

Você sabe o que é opinião pública e opinião publicada?

Sabe como é que se forma a opinião publicada?

Vejamos.

Como aconteceu com as notícias anteriores, se o processo continuasse na Vara do juiz Moro não saberíamos dessa notícia. Ela não ia acontecer.

Teve que sair de lá e cair em outra Vara para existir.

Mesmo assim, a imprensa faz malabarismo, contorcionismo, ocultismo, Fernandismo, para esconder.

Observe a “manchete” da Folha na imagem 1. Esta é a original.

FHC e corrupção na Petrobras 1

Perceba que ela diz que a “Justiça aceita denúncia sobre corrupção na Petrobras desde 1999”.

“… desde 1999” é um período muito abrangente e não dá nenhum detalhe. E mais, a “Justiça aceita denúncia”.

Percebe?

Na imagem 2 chamo a atenção para o que foi manipulado. Escondeu-se que o governo era o de FHC.

FHC e corrupção na Petrobras 2

Começou no governo dele, mas não foi só em 1999. Foi antes.

Mas, relevemos.

Agora veja na imagem 3 como seria a manchete se fosse só no governo daquele, aquele outro.

FHC e corrupção na Petrobras 3

Não seria “Justiça aceita denúncia”. E ainda teria foto e tudo mais que pudesse.

Aí os segmentos privilegiados da sociedade, leia-se classe média, aquela que vive ensaiando passos para alcançar o altar das elites, na sua convicção da boa informação se torna membro efetivo, com todos os méritos, da opinião publicada.

Ah se não fosse a Internet!

“More is less”

Estados Unidos do Brasil

Por Ronaldo Souza

Há alguns anos, em uma das idas ao Rio de Janeiro, meu cunhado me pegou no aeroporto e fomos pela Barra da Tijuca.

Fiquei chocado.

Tudo era em inglês.

Off, rent a car… e por aí vai.

Dali a dois ou três dias o que me chocou estava retratado em uma das crônicas de João Ubaldo. Ele começava dizendo:

“Essa crônica devia ser escrita em inglês. Pelo menos na Barra eu seria mais lido”.

Como sempre, João Ubaldo usava todo seu talento para trazer luz ao dia-a-dia.

E dessa luz Ariano Suassuna também sabia que muitos precisavam.

Também há alguns anos em um encontro de intelectuais, por coincidência no Rio, Suassuna mais uma vez se posicionou.

Na sua palestra fez algumas considerações e disse:

“Oh, por exemplo, depois da minha conversa com vocês vai ter um cofffféééééé breaki”, puxando pelo sotaque nordestino bem arrastado, ele que já tinha um sotaque forte.

Claro, o auditório foi às gargalhadas.

Suassuna conseguira seu objetivo; trouxe a plateia para ele.

Infância e adolescência vividas sob grande influência dos Estados Unidos, tinha naquele país, no seu cinema, na sua música, as minhas referências.

Desde cedo, Gary Cooper, John Wayne, Rock Hudson, Elizabeth Taylor, Elvis Presley (graças a ele, para mim o Havaí era o paraíso na terra), Frank Sinatra, Jonnhy Mathis… eram os meus artistas preferidos.

Nenhum brasileiro.

Mas já na adolescência, Elis Regina e Jair Rodrigues (o inesquecível “Dois na Bossa”), Chico Buarque, Edu Lobo, Caetano, Gil, Gal, Bethania, Tom, Vinicius, Gonzaguinha… começavam a aparecer na minha vida.

O cinema brasileiro só tempos depois, quando já entrara na vida adulta.

Eu começava a nascer para mim mesmo.

E quando se nasce para si mesmo, o mundo já não é o mesmo.

Entretanto, mesmo quando ainda era forte aquele traço cultural de idolatria aos Estados Unidos, ao “american way of life”, que só anos depois perceberia com clareza o que de fato significava, começava a se manifestar em mim o encantamento pela língua portuguesa.

Mesmo até hoje sendo alguém em eterno débito com ela, tenho esse sentimento.

Muitos relatam que os franceses se aborrecem quando estrangeiros procuram se comunicar em inglês na França.

Eventuais exageros dos franceses à parte, nós, que costumamos exaltar as qualidades dos outros, temos realmente muito a aprender com eles

Enquanto na França se protege o francês, aqui é grande o desrespeito à nossa língua.

Less is more.

Não, less não é more.

More is less.

More is less porque tudo que torna menor é menos.

“Minha Pátria é minha língua”, já dizia Fernando Pessoa e que Caetano pôs numa de suas belas músicas.

As agressões à língua portuguesa, nossa língua, nossa Pátria, tornam-na menos importante, menor.

Aqui menos é mais e mais é menos.

Simples assim.

Aqui, tudo será menos sempre que afrontar o país, o seu povo, a sua língua, os seus costumes, os seus hábitos, a sua soberania.

Aqui tudo será mais sempre que enaltecer o nosso povo, a nossa cultura, o nosso modo de ser, de falar, de escrever.

Aqui tudo será mais sempre que elevar a nossa autoestima.

Aqui tudo será mais sempre que ratificar a nossa soberania.

Eu não pediria a Nelson Rodrigues, pernambucano que se tornou carioca e torcedor do Fluminense, para emitir uma opinião sobre essa questão.

Apaixonado pelo futebol e conhecedor do seu povo, ele era chegado a opiniões muito fortes.

Foi ele quem disse que o brasileiro tinha “complexo de vira-lata”.

Mas, apesar de brilhante, certamente Nelson Rodrigues não era um Fernando Pessoa.

Nem tinha a leveza de Ariano Suassuna.

Suassuna perguntaria; meu filho, por que você não usa a beleza e a riqueza da sua língua. Você sabia que ela é tida como uma das mais ricas e belas?

Suassuna diria:

“Oh, depois da minha conversa com vocês vai ter uma palestra danada de boa. Vejam só o título; ‘Menos é mais’. Enigmático, não é? Não parece interessante? Até eu vou ficar para assistir”.

Não sei quantos sabem que ele era um ferrenho defensor da língua portuguesa e fazia disso uma luta diária.

Talvez por pensar como Fernando Pessoa e achar que sua língua era sua Pátria.

Bobagem.

Just my two cents.

Deuses importunados

Chico Buarque 2

Por Ronaldo Souza

Chegara a minha vez.

Distraído, sem levantar a cabeça ponho os 2 produtos para que a moça do caixa registre o valor e eu possa pagar.

Cartão já para inserir na “maquininha”, só aí me dei conta de que não tinha dado boa tarde a ela.

Cumprimentei-a então e pedi desculpas tentando me justificar.

– Estava tão distraído que não falei com você. É que estava lendo aqui (no celular) que mais um imbecil agrediu Chico Buarque (acho que precisei desabafar).

– Ah, o poeta, ela respondeu.

– Não, ele é cantor.

Tinha entrado na conversa uma jovem de cerca de 30 anos, bonita, bem vestida, a próxima da fila a chegar ao caixa.

– Eu sei, falei poeta porque ele tem coisas bonitas. É um poeta!

Respondeu a caixa.

A nossa mania de pré-julgar.

Espantei-me que uma caixa de supermercado sabia quem era Chico e a mocinha bonitinha e bem vestida não sabia.

“Cantor”.

Sei que ele é também cantor.

Mas na cabeça dela, da mocinha bonitinha, Chico era um “cantor”.

Percebe?

Pablo é cantor, Fábio Júnior é cantor, Michel Teló é cantor, Wesley Safadão é cantor, Durval Lelis é cantor…

Fico com a caixa.

Poeta.

O novo imbecil que agredira a família Buarque é um colunista.

Tinha entrado no Instagram da filha de Chico, Silvia Buarque, que postou uma foto dela com a irmã e o pai, o “cantor”, e agredira a família.

“Família de ladrões” e mais um monte de asneiras.

Entram no Instagram ou no face book de alguém e, gratuitamente, agridem.

Geralmente carregadas de grande teor de inteligência, sensibilidade e profundo conhecimento sócio-político, as ofensas obedecem a um padrão:

“Você é um idiota”.

Esses microcéfalos se reproduzem disseminando um Zika vírus específico que ataca o cérebro de jovens e adultos.

Saíram dos teclados e foram para as ruas, avenidas, restaurantes, hospitais, velórios, maternidades para agredir os que pensam, os “idiotas”.

Parece haver um comando de caça aos “idiotas”.

Nem o “cantor” escapou.

Com derivações que vão pelo mesmo caminho e com a mesma profundidade:

“Você é petista e petista é merda”.

E todos eles estavam ali, naquele momento, agredindo Chico.

Todos se viram representados naquele momento de glória em que, ao interpelar Chico, viram-se no mesmo andar dele.

Sem fazer a menor ideia de quem é aquele “cantor”.

Diz a Bíblia que o homem foi criado à imagem e semelhança de Deus.

Adão teria sido então o primeiro homem a mostrar o fracasso da tentativa de Deus.

Lembro de uma das respostas de Miguel Nicolelis, cientista brasileiro, um dos maiores do mundo na área de Neurologia, quando lhe perguntaram se Deus existe.

– Não, para a Ciência não existe Deus. Para a Ciência existe Ciência.

Será sempre difícil falar de Deus

Mas talvez não dos Deuses.

Da mitologia grega, por exemplo.

Existem muitos deuses, inclusive os falsos.

Os deuses de barro.

Aproxime-se um pouco mais deles e os identificará com relativa facilidade.

O desencontro que parece haver entre a aceitação da existência de Deus e a Ciência não deve ser maior que o existente entre Deus e o homem, Criador e criatura.

O homem perdeu a dimensão do que é ser grande e claro isso o tornou muito pequeno.

A noção da grandeza de espírito se perdeu na imensidão da pequenez do homem.

E como se tornou imensa a imensidão da pequenez do homem!

Mas há homens que se transformam em deuses.

Irradiam luz por onde passam, quando falam, quando calam, no gesto, na palavra simples, na atitude.

Em determinados momentos, os deuses podem, mesmo que não seja essa a intenção, num gesto simples nos mostrar toda a sua grandeza e assim nos fazer ver mais facilmente ainda a distância que existe entre eles e os mortais.

Principalmente mortais que sequer se sabem diante deles.

Mas, estando, desaparecem, sem nunca terem realmente aparecido.

Esses deuses crescem e se iluminam na discussão que não houve.

Que não deixaram acontecer.

Lixo

Por Ronaldo Souza

Ninguém que tenha o mínimo de responsabilidade faz acusações desse tipo, citando nominalmente as pessoas, inclusive poderosos como Fernando Henrique Cardoso, Daniel Dantas e José Serra, gratuitamente, sem provas.

Por que diante de acusações tão graves contra ele e a filha, Serra só se limita a dizer é lixo, lixo, lixo???

Você sabia que Amaury Ribeiro Jr, autor do livro “A Privataria Tucana”, já ganhou os mais importantes prêmios do Brasil como repórter investigativo?

Por que eles todos e o PSDB não processam Amaury Ribeiro Jr?

Será que é porque ao processar se expõem mais ainda e tudo, provado, terá que vir a público pela imprensa?

Você sabia que diante de um processo desse tipo, o autor do livro adquire o direito de ter acesso a mais documentos?

Você sabia que foi assim que Amaury Ribeiro Jr conseguiu toda a documentação que comprova a corrupção do governo FHC (interessante, esses são sigilosos, não vazam)?

Foi processado há anos atrás por eles e graças a isso teve direito ao instrumento judicial conhecido como “exceção da verdade” e conseguiu mais documentos.

Você já ouviu falar da Ilha dos Urubus, uma ilha paradisíaca aqui na Bahia?

Sabia que várias reportagens mostraram que nos estertores (como diriam os cronistas mais antigos) do governo Paulo Souto ela foi doada a Gregorio Marin Preciado (leia uma delas aqui http://www.cartacapital.com.br/politica/ilha-do-urubu-o-paraiso-traido).

Sabia que o Tribunal de Justiça da Bahia estava tentando reverter essa doação?

Você sabe quem é Gregorio Marin Preciado?

É casado com uma prima de José Serra (é chamado de “primo” de Serra).

Sabia que Alexandre Bourgeois (genro de José Serra), Verônica Serra (filha de Serra) Verônica Dantas (irmã de Daniel Dantas e sócia da filha de Serra) estão nesse processo todo (leia aqui http://www.casacinepoa.com.br/o-blog/jorge-furtado/privataria-tucana).

Sabia que nas privatizações de FHC, Gregório Marin Preciado, com uma grande dívida no Banco do Brasil, foi beneficiário de três concessionárias de energia, a Coelba (isso mesmo, a daqui da Bahia), Cosern (do Rio Grande do Norte), e Celpe (de Pernambuco)?

E está tudo documentado lá, no livro “A Privataria Tucana”.

Amaury já desafiou várias vezes, inclusive pela televisão:

“Por que vocês não me processam”?

E quando um repórter, perdido na multidão, respira fundo e consegue perguntar a FHC sobre essas coisas, o que diz o príncipe dos sociólogos?

“São questões vagas, estão querendo misturar o PSDB com o PT”…

Entende porque ficam só falando lixo, lixo, lixo…?

É mais seguro.

Adoxografia

Elogio da Loucura

Por Ronaldo Souza

Há poucos dias me flagrei pensando em medalhas, comendas e certas homenagens que vejo serem prestadas.

Nunca escondi as minhas dificuldades com coisas desse tipo. Há sete anos cheguei a escrever um pequeno texto sobre esse tema.

Com pequenas modificações, eu o reescrevi e você pode ler aqui http://www.endodontiaclinica.odo.br/o-homenageado/.

Acho pouco provável que alguém pudesse ser mais feliz do que Aristóteles quando diz que “a grandeza não consiste em receber honras, mas em merecê-las”.

Uma vez ouvi o Prof. Humberto Castro Lima, fundador da Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública e homem de grande inteligência e cultura, dizer que já lhe era possível falar certas coisas porque a idade o colocara num patamar em que tudo, ou quase tudo, era permitido.

Ainda que não seja uma regra para todos, há sim um respeito que se adquire com a chegada da neve que tinge os nossos cabelos.

Entretanto, mesmo considerando-se a nenhuma convivência e as poucas vezes em que o vi falar, além dos cabelos brancos certamente o Prof. Castro Lima conquistou o direito de dizer quase tudo que lhe viesse à mente por outras razões e a sua trajetória está aí para confirmar.

Nos seus brilhantes discursos gostava de citar o “Elogio da Loucura”, livro de Erasmo de Rotterdam.

Enaltecendo o poder da retórica, a obra de Rotterdam se tornou um clássico da literatura universal e como tal exerceu grande influência, como por exemplo na arte da adoxografia.

Fernando Henrique Cardoso é a prova viva de que os cabelos brancos não permitem tudo.

Diria mais.

FHC em vários momentos

Fernando Henrique Cardoso é a negação da respeitabilidade que os cabelos brancos costumam trazer.

Há cerca de 10 dias, o jornalista e escritor Laurez Cerqueira escreveu um artigo cujo título era “Fernando Henrique carrega um general golpista dentro dele” (http://laurezcerqueira.com.br/488/florestan-fernandes-entrou-para-a-historia-pela-porta-da-frente-fernando-henrique-pela-porta-dos-fundos.html).

Transcrevo um trecho:

“No discurso de despedida de Fernando Henrique Cardoso, do Congresso Nacional, antes da posse para o exercício do seu primeiro mandato, estava no meio dos parlamentares, elegantemente vestido, sentado na cadeira de sempre, como um aluno disciplinado, já bastante debilitado pela doença hepática, segurando uma bengalinha, o Professor Florestan Fernandes, reeleito por São Paulo.

Fernando Henrique o viu no plenário. Pediu licença ao senador Humberto Lucena, que presidia a sessão, disse que quebraria o protocolo para cumprimentar uma pessoa.

Desceu os degraus do alto da Mesa, embrenhou-se entre os parlamentares que o assediavam calorosamente, postou-se frente ao mestre e o abraçou. Florestan desejou-lhe boa sorte e êxito no governo.

No final daquele momento, como que movido por um lampejo de confiança no ex-aluno, Florestan disse a Fernando Henrique: “Veja bem, Fernando: não crio gatos. Crio tigres”.

Disse isso sob forte emoção, certamente lembrando-se de que ele teria sido um dos professores mais influentes na formação acadêmica dele…

… Florestan teve uma conversa impactante com ele, falou sobre a Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da USP, sobre o curso de sociologia, e da importância de se formar sociólogos nas nossas universidades para ajudar nos estudos, nas pesquisas, sobretudo no desenvolvimento do pensamento e na interpretação do Brasil pelos próprios brasileiros.

Foi com base nessa conversa que Fernando Henrique decidiu fazer o exame para cursar sociologia na USP. Florestan foi professor dele, orientador no mestrado e no doutorado.

Ficaram tão amigos que Fernando Henrique mudou-se para a mesma rua que morava o mestre para conviver, frequentar a biblioteca e ouvi-lo mais. Florestan o tinha em alta consideração fraterna e intelectual.

Aquele momento de despedida de Fernando Henrique  foi marcante para Florestan, mais marcante ainda a decepção com o rumo dado por ele ao governo, que apenas se somou a outras decepções políticas acumuladas ao longo da carreira do ex-aluno presidente. Mas nada disso abalou a relação pessoal e o respeito que tinham um pelo outro.

Em 1996, Fernando Henrique havia dado um golpe na Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) que estava sendo debatida na Câmara, sob a coordenação do então deputado Florestan Fernandes, com apoio do Fórum Nacional de Educação.

Numa articulação comandada pelo seu vice-presidente Marco Maciel, ele aprovou no Senado o projeto de lei do governo tornando regimentalmente prejudicado o projeto de LDB da Câmara, que acabou sendo arquivado.

Esse fato deixou Florestan indignado e decepcionado, por ter sido colocado por terra anos de debate e de construção democrática, com a participação da sociedade, de uma proposta de educação que provocaria uma transformação profunda no país.

Dias depois, numa conversa sobre o golpe da LDB, ele sentado, tirou os óculos de hastes e lentes grossas, colocou-os sobre a mesa, passou os dedos nas sobrancelhas de fios compridos, e disse, referindo-se a Fernando Henrique, com todo o cuidado que tinha no trato com as pessoas: “É… Fernando está ficando politicamente irreconhecível”.

Não sei quantos sabem que FHC é filho de general, o que não quer dizer nada e que também nada tem a ver com o título do artigo de Cerqueira.

O título se reporta a outra coisa.

Trata de um homem que já algum tempo eliminou qualquer possibilidade de dúvida que ainda existisse sobre o que significa de fato o “esqueçam tudo que eu escrevi”.

Não há mais limites.

As histórias de traição de FHC às coisas e pessoas sérias que conviveram com ele são conhecidas.

Um dos seus ministros mais respeitáveis, o professor Adib Jatene, já disse mais de uma vez para quem quis ouvir que ele não cumpriu a palavra com ele. Uma das vezes em que isso ocorreu foi no programa Canal Livre, da Band.

FHC é hoje um dos poucos homens que conseguem falar de democracia e golpe na mesma frase com tamanho despudor que os fazem parecer sinônimos.

Ah, quase esquecia.

Adoxografia – Enaltecimento desmerecido sobre algo ou alguém; elogio imerecido.

É a “arte” de se fazer o elogio imerecido de pessoas ou coisas sem valor, pessoas vulgares.

A mídia brasileira se tornou um ícone na arte da adoxografia.

Indiferença cínica

Por Ronaldo Souza

Essa história é conhecida.

Joel Rennó era presidente da Petrobras no governo de FHC e usou, como pessoa física, todo o poder da empresa para sufocar Paulo Francis.

A omissão de FHC foi enorme e comentada à época.

“Ele retirou a ação?”

A essa altura da vida, o ex-presidente da república não saber se uma ação movida nos mais altos escalões do seu governo, do presidente da maior empresa do país (que ele tentou privatizar) contra um dos mais renomados jornalistas do país é covardia ou cinismo? Ou os dois juntos?

Essa “indiferença” de FHC é uma ofensa ao Brasil.

Os depoimentos no vídeo confirmam o que sempre se comentou. Foi um verdadeiro assassinato.

O que restou da época é que Paulo Francis estaria certo, só errou na forma como abordou a questão.

E a FHC restou a reconhecida falta de comando.

E dizem que é um estadista.

– Ele retirou a ação???

O homenageado

Aristóteles

Por Ronaldo Souza

Não me lembro de tê-lo visto de perto. Conhecia-o muito de nome e tinha natural curiosidade pelas suas coisas porque era padrinho de um amigo da adolescência.

Era um político local com alguma influência (todos eles têm “alguma” influência).

Homem violento, tinha um “anjo da guarda”, que alguns chamavam de capanga (pura inveja, maldade do povo) e resolvia muitas das suas pendências à bala ou na porrada (através do “anjo da guarda”).

Um dia, vejo-o na televisão recebendo uma dessas medalhas que se distribuem pela vida.

Aquela me chamou a atenção. Não lembro exatamente o nome, mas era algo como “Mérito ao Pacificador”.

Não tive um infarto porque, saindo da adolescência para a fase adulta, as coronárias ainda não apresentavam nenhuma possibilidade de aterosclerose e suportavam qualquer tranco.

A partir daquele dia, boa parte da minha inocência de menino do interior (a minha querida e sofrida Juazeiro, da Bahia) foi-se embora e perdi quase que por inteiro o respeito por medalhas, comendas, etc.

Por isso já recusei. Houve quem não gostasse.

Medalhas, comendas, títulos de imortalidade, são dados graciosamente. Hoje fazem parte de qualquer solenidade que se pretende um pouco mais pomposa.

Valor?

Deixo a seu critério.

Segundo Aristóteles, “a grandeza não consiste em receber honras, mas em merecê-las”.