Caso Gushiken: um momento indigno do MPF

Por Luis Nassif 

Embora sem a retórica dos demais advogados, a defesa de Luiz Gushiken, do advogado Luis Justiniano de Arantes Fernandes, constitui-se em um dos momentos mais chocantes do julgamento do mensalão.

Calmo, sem levantar a voz, com uma indignação contida, mostrou que havia um laudo de 2007 inocentando Gushiken, demonstrando que todos os procedimentos de liberação de verbas da Visanet haviam sido regulares. E o MPF negou o acesso ao laudo aos advogados de defesa e ao próprio Banco do Brasil.

Se os laudos tivessem sido juntados aos autos, em uma das reuniões do STF, bastaria um único voto a mais para que denúncia não tivesse sido recebida e Gushiken fosse inocentado.

Em agosto de 2007 o MPF estava convicto de que não tinha elementos sequer para instruir uma ação civil. Mas insistiu na corte para o recebimento da denúncia,

O MP só disponibilizou às partes após o recebimento da denúncia pelo STF. E na peça do procurador geral Roberto Gurgel, aceita-se a inocência de Gushiken.

Cinco anos de tortura, sabendo ser Gushiken inocente, uma maldade que certamente ajudou no agravamento da doença que o acomete.

Se não houver explicações adequadas da parte do MPF, esse capítulo é uma mancha na carreira do Procurador Geral Antonio Fernando de Souza e do atual Roberto Gurgel.

Na sequência, José Augusto Leal acusou Antonio Fernando de Souza de ter extirpado do inquérito declarações que eram favoráveis a Gushiken.

Mensalão. Ministros do Supremo burlam a lei

Por Wálter Fanganiello Maierovitch*
(http://terramagazine.terra.com.br/semfronteiras/blog/2012/08/09/mensalao-ministros-do-supremo-burlam-a-lei/)

Um grupo de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) está, com o compromisso de seus nomes não serem revelados, a falar em “off the record” sobre o Mensalão com jornalistas da Folha de S.Paulo, conforme matéria estampada na capa da edição de hoje do jornal. Ontem, eles falaram, sempre em “off”, ao jornal O Estado de S.Paulo.
 
Os dois jornais “estão na deles”, para usar uma expressão muito empregada pelos jovens.
 
Mas, enquanto os jornais publicam, “na deles”, o furo de antecipar opinião de ministros sobre a prova, o que dizer dos julgadores supremos?
 
A resposta é fácil. Até os bacharéis em Direito que ainda não foram aprovados no exame da Ordem dos Advogados sabem que o magistrado não pode antecipar juízos. A lei estabelece que só o ministro, sobre questões “sub-judice”,  pode falar nos autos e em determinados momentos processuais. Mais ainda, não pode prejulgar, nem dizer sobre validade de provas na formação do seu convencimento.
 
Os ministros que falam a aparelhos desligados e com garantia de que os seus nomes não serão revelados burlam a lei.
 
Como ministros do STF não têm corregedor e não estão sujeitos ao Conselho Nacional de Justiça, eles, no particular, abusam. E, pior, escondem-se covardemente ao  falar apenas em “off”. Covardemente porque sabem que estão proibidos de falar por lei e desafiam a proibição recorrendo ao anonimato. São  “moitas supremos”.
 
Pano rápido. A que ponto chegamos. Os garantidores da Constituição e aplicadores da lei são seus descumpridores. No popular: em casa de ferreiro o espeto é de pau.

 

* Wálter Fanganiello Maierovitch – Jurista e membro das Academia Paulista de História e Ac. Paulista de Letras Jurídicas; desembargador aposentado do TJ-SP. Colunista de Carta Capital, comentarista na CBN e assessor internacional para União Europeia.

Indignação justa, porém…

Já houve coisa bem pior, mas a derrota do Bahia para o Grêmio foi sim, um escândalo. Entretanto, antes de qualquer comentário, gostaria que você voltasse comigo um pouco no tempo.

Em 1981, Atlético (MG) e Flamengo estavam empatados na decisão pela Libertadores das Américas. Os dois times decidiram realizar uma partida extra no estádio Serra Dourada, em Goiânia (GO). Antes mesmo do jogo já havia polêmica. O árbitro escolhido para apitar a partida foi José Roberto Wright, que viajou junto com a delegação carioca do Rio até Goiás, algo, no mínimo, não recomendável. Mas o que gerou mais desconfiança foi que simplesmente Wright ficou hospedado no mesmo hotel que o Flamengo.

Aos 10 minutos do primeiro tempo, Reinaldo (para os mais jovens, um dos maiores centroavantes que o Brasil já teve e fundamental para o Atlético) fez falta normal em Zico e imediatamente Wright mostrou o cartão vermelho. Reinaldo ficou perplexo e tentou se explicar, mas de nada adiantou. E não demorou muito para nova expulsão, sendo Éder a vítima dessa vez. Aos 34 minutos (ainda primeiro tempo), ele já tinha expulsado mais três do Galo. O que? Não ouvi direito. Você perguntou quem se classificou?

Vasco e Flamengo, final da Taça Guanabara de 1982. Em uma combinação com a Rede Globo, José Roberto Wright apitou o jogo com um microfone escondido na roupa. Relato dos jogadores diz que ele pressionou todo o tempo alguns jogadores do Vasco, principalmente Giovani. Resultado; Flamengo campeão.

Você sabia que alguns anos depois Wright se tornou comentarista de arbitragem da Globo?

Por causa de uma vitória arranjada contra o Sport de Recife em 1982, o Flamengo continuou no campeonato e se tornou Campeão Brasileiro. Veja só um pouquinho da história aqui http://www.youtube.com/watch?v=U-UqWslpJGU&feature=related. Existem muitos episódios desse tipo envolvendo alguns árbitros em determinados jogos que são facilmente encontrados na Internet.

Voltemos aos dias atuais.

Bem recentemente, após a vitória do Flamengo sobre o Bahia com um pênalti escandalosamente marcado a favor do Flamengo pelo árbitro Francisco Carlos Nascimento, o jornalista Cosme Rímoli (Rede Record de São Paulo) fez um artigo com o título “A diretoria do Bahia deve se respeitar. E enfrentar a Comissão de Arbitragem. Francisco Carlos Nascimento deu a vitória ao Flamengo em Pituaçu. Uma vergonha…”

Carlos Rímoli esqueceu que poucas rodadas antes, o Flamengo tinha ganho de 1X0 para o Santos, gol de pênalti, também inexistente, “cometido” sobre o mesmo jogador, marcado pelo… mesmo árbitro: Francisco Carlos Nascimento.

Quem tem mais força política para reclamar, Bahia ou Santos? Por que a diretoria do Santos não se fez respeitar e enfrentou a Comissão de Arbitragem?

Finalmente, Grêmio e Bahia. Mas não vou falar dos absurdos que o árbitro fez no jogo.

Começo com perguntas bem simples. Por que os jogos no Nordeste contra os times do Sul/Sudeste são apitados por “bons” árbitros (árbitros FIFA, como são conhecidos)? Por que os jogos dos times do Nordeste “lá” são apitados por árbitros desejosos de acertar? Muito sutilmente (!!), a imprensa gaúcha fez pressão sobre o trio de arbitragem sergipano, aquelas coisas como lançar dúvidas sobre a sua capacidade, etc.

Conhecido e respeitado em todo o Brasil pela sua competência, Paulo Angioni já é gestor de futebol do Bahia há quase três anos e nesse tempo nunca houve um único episódio que o fizesse perder a serenidade. Dessa vez, no entanto, não conseguiu conter a sua indignação e no seu comentário sutilmente se reportou a essa questão: "Nunca vi uma arbitragem dessa. Lógico que o árbitro deve ter vindo pra cá comprometido porque ele é sergipano. O grande erro de tudo, lamentavelmente, foi exatamente indicar um árbitro de Sergipe para cá. A crônica daqui de Porto Alegre criticou muito e ele é humano, vê televisão e com certeza estava pressionado".

Como agradar diante de tamanha pressão? Não será ao politicamente mais fraco. Por que o custo tão mais elevado de mobilização de juízes de tão longe, do Nordeste para o Rio Grande do Sul, tendo ali perto inúmeros outros?

Com justa indignação o presidente do Bahia disse que “já falei com o presidente da Federação Baiana de Futebol, que está nas Olimpíadas em Londres”. Não diria que o referido presidente da Federação Baiana de Futebol é um homem habilidoso, acho que prefiro chama-lo de jeitoso. Daí que nada sairá, nada acontecerá. Ainda mais considerando-se que nesse momento ele deve estar muito ocupado, mergulhado em problemas, tratando dos assuntos da Federação lá em Londres.

A imprensa já registrou que nas reuniões da CBF para definição dos jogos do Campeonato Brasileiro, está lá, sentado, definindo os rumos do futebol brasileiro, um dirigente da Globo. Os dirigentes, tanto faz se do Santos, do Bahia ou dos outros times, ficam pisando em ovos porque sabem que muito pouco adianta reclamar da CBF. Têm que reclamar de quem define.

Lembra da partida final da Liga dos Campeões 2012 entre Bayern e Chelsea? Procure saber onde estavam os dirigentes dos clubes brasileiros, inclusive Bahia e Vitória, naquele momento. Procure saber de quem eram convidados. Uma dica; dizem que não eram convidados da CBF. Como reclamar?

Tiveram a chance de mudar todo o atual panorama do futebol brasileiro e tentar traze-lo para um patamar mais digno no momento da decisão de quem transmitiria os Campeonatos Brasileiros de 2013, 3014 e 2015. Todos sabem que a proposta financeira da Rede Record para os clubes era bem melhor que a da Rede Globo. Como a Globo saiu do páreo e, por fora, conseguiu o Campeonatao Brasileiro de 2012, 2013 e 2014? Com a palavra os dirigentes dos nossos clubes.

A indignação da torcida é mais do que justa, mas pouco ou nada ela pode fazer. A indignação dos dirigentes também é justa, porém…

Finalmente, entendo a posição de quantos já passaram por aqui, mas é a primeira vez que vejo um treinador de futebol, nascido e habituado a treinar os times do sul/sudeste do país, dizer que “nunca tinha sentido na pele o que senti hoje e que vocês do Nordeste sempre sentiram”. Pode parecer, mas não é uma coisa simples.

Gostei da contratação de Caio Júnior desde o início e não h&aacut
e; como negar que o time melhorou muito depois da sua chegada. Mas, certamente, a percepção e a coragem contidas na sua declaração o trazem para bem perto da torcida, quem sabe num processo de identificação semelhante ao de Evaristo de Macedo. Aceito a sua conclamação para jogar com o time. Se estávamos nos queixando, e com razão, da apatia, da falta de alma do time, foram surpreendentes e tocantes a postura e a reação dos jogadores.

Torcida tricolor, apesar de tudo, o time sentiu que pode render mais do que já começava a mostrar nos últimos jogos. Mais do que nunca, vamos a Pituaçu na quarta-feira. Vamos jogar com o time. Vamos mostrar porque somos considerados a “Torcida de Ouro”.

O boicote da Globo às Olimpíadas

Por Marco Antonio L.
Do Yahoo

Quanto de Olimpíada deve ter no noticiário da Globo?

Diferentemente do que ocorreu em edições anteriores, a Rede Globo não transmitirá os Jogos Olímpicos de Londres, evento exclusivo da Record na TV aberta e que só compartilhou com as emissoras fechadas SporTV, canal da  Globosat,  ESPN  e  BandSports a exibição da Olimpíada no país.

Sem os direitos da competição, a pergunta que se faz é: quanto a Globo, maior TV do país e com audiência muito acima de qualquer outra, deve falar sobre Olimpíada em seus noticiários, os esportivos e também aqueles mais gerais? A meu ver, essa é uma decisão da TV Globo, que pode, sim, dar tratamento não tão especial, porém ignorar por completo os Jogos de Londres ou mesmo condená-los a um cantinho qualquer em seus programas é fazer mau jornalismo. Um erro.

Os telespectadores da Globo, bem como os do SBT, Bandeirantes, TV Cultura, Rede TV!, entre outros canais da televisão aberta devem ser informados sobre o maior evento esportivo do mundo. Quem se propõe a levar a sério jornalismo em sua grade de programação tem a obrigação de falar de Olimpíada. É notícia. Das mais importantes. Não é opcional dar ou não informação sobre o que rola na Inglaterra. É compromisso com o telespectador. Só um canal que assumidamente não dê importância a jornalismo deixa de cobrir os Jogos de Londres.

Não serve nem a desculpa de que a Record cedeu poucos minutos em imagens oficiais da Olimpíada. Se não tem fartura de imagem, que use a criatividade, pegue outras de arquivo relacionadas à notícia ou mesmo à reportagem sobre o fato a ser relatado. Não há o que justifique a falta de compromisso com a notícia.

O que não pode é o apresentador do Globo Esporte, Tiago Leifert, em participação no SPTV, justificar que terça-feira é um dia com poucas notícias e optar por extensa reportagem sobre torneio de sumô em lugar de matérias sobre as seleções olímpicas feminina e masculina de futebol, que estreiam, respectivamente, amanhã e depois de amanhã. Lamentável.

Só as crianças brancas crescem

A Crescer e suas crianças brancas

Mãe não é só quem põe no mundo, é quem cria, quem brinca, quem canta, quem paga pelo Netflix e vê mais a Galinha Pintadinha e a Dora do que os próprios filmes e seriados, que tira onda com as descobertas do filhote e também quem entende nada do assunto e tenta aprender um pouquinho sobre esse universo nas revistas.

E foi assim que eu abri a revista Crescer pela primeira vez. Com curiosidade de mãe, de jornalista e de revisteira. Eis que lá pelo 3º mês de acompanhamento eu me perguntei: isso é revista de europeu? cadê as crianças negras? Achei que era implicância minha, então fui atrás das capas. Separei as de junho de 2011 até junho de 2012 (estão fora de ordem cronológica, o que não vai afetar a análise). Acompanhem-me:

Para ver todas as imagens clique aqui

E aí que eu me senti bastante incomodada com isso de só ter crianças brancas na capa de revista em um ano inteiro. Mandei um email bem civilizado pra eles no início de junho, assim que comprei a revista do mês.

Olá, bom dia!
Acompanho a revista Crescer há um ano e desde a edição de julho do ano passado percebi que vocês não colocaram nenhuma criança negra, parda ou com traços asiáticos, ou mesmo crianças brancas com cabelos crespos na capa. Entrando no site percebi, ainda, que pelo menos, desde outubro de 2010 só há crianças brancas (e a maioria de olhos claros!). Talvez seja uma situação que acontece há muito mais tempo, mas o site dá erro nas páginas anteriores a essa data. Há alguma restrição editorial sobre isso? Como mãe e jornalista fico bastante incomodada com essa situação. Gostaria de deixar bem claro que não tenho preconceitos com crianças brancas e/ou dos olhos azuis, mas creio que uma revista deve reproduzir características e comportamentos do país em que ela circula. As crianças mostradas nas capas são maioria na publicação, mas não no Brasil. Numa época em que a gente ensina os nossos filhos que eles não devem julgar pessoas pela cor da pele, vocês simplesmente ignoram que no Brasil existem crianças de várias “cores” e que todas elas são igualmente lindas para ser capa da Crescer. Cadê a diversidade?

Aguardo resposta.
Atenciosamente,
Ericka Guimarães

Dois de Julho: Independência do Brasil (na Bahia)

Por Paulo Costa Lima 
(http://terramagazine.terra.com.br/interna/0,,OI1719152-EI8214,00.html)

Nasce o sol a dois de julho
Brilha mais que no primeiro
É sinal que neste dia
Até o sol, até o sol é brasileiro…
Nunca mais, nunca mais o despotismo
Regerá, regerá nossas ações

Poucas pessoas fora da Bahia conhecem a força do 2 de julho. É uma falha enorme de informação histórica, pois trata-se do processo de independência do Brasil, e não da independência da Bahia, como até hoje muita gente fala. Uma coisa é dar o grito do Ipiranga, outra coisa é garantir pleno domínio sobre o território nacional.

Entre as duas pontas, uma guerra. A guerra da Bahia, onde brilhou o heroísmo popular, além de lideranças como Labatut, Lima e Silva, João das Botas, Maria Quitéria, entre tantos outros. Em carta a José Bonifácio, Labatut registra: "Nenhum filho de dono de engenho se alistou para lutar". A consciência da possibilidade de uma nação surgiu de baixo.

Foram meses de luta, batalhas em diversos pontos do Recôncavo Baiano, sendo a mais famosa a de Pirajá, onde segundo consta, o corneteiro Lopes decidiu a vitória tocando ‘avançar’ quando havia sido instruído para fazer o contrário. Vitória brasileira.

Que espécie de sol é esse – ‘brilha mais que no primeiro’? Que espécie de chamado convoca e reúne cerca de 500.000 pessoas em Salvador a cada 2 de julho, há 184 anos, em torno de um cortejo, que na verdade é espelho vivo de nós mesmos, uma construção existencial baiana, encontro e pororoca de atitudes culturais as mais distintas?

Na verdade, basta olhar o carro do caboclo para exemplificar o que é mesmo diversidade: tem lança de madeira apontada para um dragão, cocar, muitas penas, armadura de ferro em estilo medieval, baionetas, anjinhos barrocos, placas com nomes de heróis, colares diversos, alforjes, bandeiras, folhas e mais folhas, entre outras tantas coisas.

Não é uma festa para se ver pela televisão ou para entender através da mídia. Não adianta focalizar em momentos, mesmo que solenes e oficiais, reunindo poderes constituídos e povo. É uma festa para participar. Só sabe do que se trata quem vai lá, quem sente a emoção fluindo, quem vê o interesse do povo em festejar e manter a tradição, desde a alvorada no largo da Lapinha até o Campo Grande.

No meio de tudo isso a figura inesquecível de Maria Quitéria, uma mulher que se fez soldado, e que foi oficialmente aceita por D. Pedro I como membro do Exército Nacional, com direito a ostentar sua insígnia pelo resto da vida. Lutou bravamente, desafiou a todos, inclusive ao pai, que a queria longe da luta.

Segundo a historiadora inglesa Maria Graham, que deixou registrado um perfil da heroína, a moça era bastante feminina, ninguém duvidava de sua virtude mesmo depois de meses de acampamento com os homens. Gostava de comer ovo ao meio dia e peixe com farinha no jantar. Fumava um cigarro de palha após as refeições. Entendia as coisas com rapidez e naturalidade. Depois da guerra voltou para sua terra, casou-se e teve uma filha. Entrou em Salvador acompanhando o General Lima e Silva e foi agraciada com uma coroa de flores no Convento da Soledade.

É mesmo impressionante verificar que o espírito de 1823, da entrada triunfante de nossos combatentes e da visão libertadora compartilhada por Recôncavo e Cidade da Bahia, tenha sido preservado durante todo esse tempo, e que ainda continuará dessa forma por muitos e muitos anos. Qual o segredo da longevidade?

Não existe segredo. Enquanto a população sentir que o 2 de julho lhe pertence, haverá 2 de julho. E portanto, para falar disso que emana da festa, devemos esquecer os chavões do civismo, aquela noção de bandeirantes fardados e perfilados, pois o território do nosso civismo é outro – é mais caboclo. E não é território de exclusão, celebra caboclo e cabocla. Portanto, entre folhas, armadura, dragão e celebração o que emerge é o próprio território cultural da Bahia. Território matriz que não está interessado em meros separatismos, e sim na invenção de uma nova idéia de coletivo.

Na verdade esse civismo de pertencimento, que não depende de efígies gregas, máximas latinas ou princípios positivistas (mas que também não os rejeita), se realimenta a cada ano com a própria participação dos atores e autores populares, os quais garantem permanência à celebração, simplesmente por se sentirem parte dela.

Muito antes do atual discurso sobre inclusão, lá estava o símbolo pronto de um País, o qual só lentamente vai se aproximando da densidade da construção simbólica de origem. Coisas que eram apenas vetores em 1822-23 foram aos poucos virando realidade – abolição, república, protagonismo feminino…

Na verdade, na verdade, o mais bonito é pensar que o 2 de Julho é o nosso destino, e que certamente um dia estaremos plenamente à altura da força e dignidade que evoca e constitui.

Bobagem que se repete até hoje

Mais diferenças que semelhanças entre Lula e FHC na economia

Por José Paulo Kupfer

(Veja aqui o original no Estadão http://blogs.estadao.com.br/jpkupfer/mais-diferencas-que-semelhancas-entre-lula-e-fhc-na-economia/)

Enquanto o fracasso é órfão de pai e mãe, o sucesso costuma dar briga de tapa pela paternidade. Nem se sabe ao certo quanto pode durar o êxito da política econômica do governo Lula, mas é recorrente a disputa pela autoria do feito. Num certo tipo de ambiente, o mote de que a única coisa boa da economia de Lula é a continuidade do que foi feito no governo Fernando Henrique pipoca mais do que catapora.

De tão repetido, já parece um daqueles lugares-comuns* que acabam soando falsos ou como solução de estilo preguiçosa. Assim como toda desculpa é esfarrapada, toda dúvida é atroz, toda ascensão é meteórica, e toda mentira é deslavada, há quem não consiga mencionar o sucesso da economia de Lula sem a fatal ressalva de que isso não passa de continuidade do governo FHC. Percebe-se, facilmente, até pela especialidade profissional dos falantes e escreventes, muitas vezes longe da economia, que a maioria não sabe bem onde está metendo a colher. Mas isso não tem importância, não é mesmo?

O governo Lula seguiu o padrão do anterior – prioridade com a estabilidade da moeda, ênfase em reformas microeconômicas – em parte de seu primeiro mandato, com Antonio Palocci à frente da economia. Mesmo ainda com Palocci e, depois, mais francamente com Guido Mantega, a política econômica descolou da anterior de tal forma que só mesmo uma miopia ideológica para explicar a insistência na visão distorcida.

Pode-se até discordar do que passou a dar dinâmica à economia, mas nunca enfiar as políticas adotadas no governo atual no mesmo saco das implantadas ou, pelo menos desenhadas, na quadra anterior. Não há comparação, por exemplo, na política de valorização real do salário mínimo, adotada contra muitos bem pensantes de luvas de pelica. Muito menos na expansão do crédito – com destaque, para o bem e para o mal, da modalidade de crédito consignado – e, por fim, mas não por último, a maneira de encarar a previdência social. Onde dá mais para comparar, o setor fiscal, os nostálgicos de FHC preferem não bater o bumbo. De fato, carga tributária e endividamento, que explodiram com FHC, ainda não desinflaram com Lula.

Nem mesmo os programas de transferência condicionada de renda, tão invocados como prova de continuidade, se sustentam como tal. Há nítidas diferenças – no foco, na abrangência, no acompanhamento e até nas falhas – entre as bolsas-escola de origem e o bolsa-família de hoje. Sem falar em outros programas menos votados, como o “Luz para todos”, e no famoso PAC, de que muitos duvidam e malham por antecipação, embora fosse mais prudente aguardar um pouco mais antes de cair de pau.

Até a política monetária, que se concentra no cumprimento das metas de inflação, adotadas em 1999 – e, essa sim, mantém desde então o mesmo curso -, começa a se ver diante de novidades. Há, mais recentemente, fora do Banco Central, uma escalada no governo em busca de saídas não monetárias, na tentativa de desviar o rumo de elementos macroeconômicos centrais, como os juros e o câmbio, do inglório destino determinado por uma ortodoxia já fora de moda
– ver, a propósito, a atuação do BC americano.

Além de medidas já adotadas – IOF em aplicações financeiras de estrangeiros e fim da cobertura cambial para exportadores -, está previsto para logo um pacote de benefícios tributários de estímulo às exportações de manufaturados e à inovação tecnológica, que o ministro do Desenvolvimento, Miguel Jorge, chama de política industrial. Se essas medidas vão funcionar – ou mesmo se serão implantadas por completo – também ainda é cedo para garantir. Mas a direção, que conta com o apoio aberto do presidente Lula, é clara. E não tem muito a ver com o que se procurou implantar no governo de FHC.

(*) Os lugares-comuns citados na sentença seguinte fazem parte de uma longa lista coligida pelo jornalista Sérgio Rodrigues, do blog Todoprosa  www.todoprosa.com.br), a quem o autor agradece a cessão.

Marcelo Lomba e o (pobre) “jornalista” esportivo

Há coisas sutis e grosseiras na vida e entre esses dois pontos há um mundo muitas vezes inimaginável.

Desde que me chamou a atenção a importância da imprensa e o que ela tem feito no nosso país, passei a ler e ver, sempre que posso, tudo que diz respeito a esse segmento profissional, inclusive a sua participação em momentos importantes do país há muitos anos.

A conclusão, particularmente neste momento da minha vida em que a vivencio e  acompanho literalmente todos os dias, é de provocar depressão em qualquer ser humano provido de alguma sensibilidade e o mínimo de conhecimento da vida sócio-cultural-política do país.

Sutil ou grosseira, a imprensa, toda ela, sabe muito bem do seu poder e aí entra também a imprensa esportiva. Muitos jornalistas esportivos são competentes, não há dúvidas, no entanto, quero me reportar à nossa imprensa esportiva, a de Salvador.

Um desastre. Apesar de não acompanha-la diariamente, é bem possível que nela ainda existam profissionais competentes, acredito nisso. Assisto à televisão para ver os gols e, claro, termino vendo alguns comentários. Aí ainda se encontra algo mais sóbrio e discreto, com eventuais deslizes, mas aceitáveis.

Há cerca de 3 anos, ao ligar o rádio para ouvir quanto estava um jogo, ouvi um comentarista dizer em resposta a algum comentário feito não sei por quem, “ah, ele deve estar menstruado”. Perceba, “ele deve estar menstruado”. Não se trata de uma mulher, o que já seria um absurdo e de baixíssimo nível, mas de um homem menstruado. Desliguei.

Há muito pouco tempo ocorreu um degradante e hoje famoso episódio envolvendo uma repórter da Band Bahia e um jovem preso, que mostra a atual tendência do jornalismo brasileiro; manipular, distorcer, humilhar, destruir reputações. Que se registre, a emissora responsável pelo programa e o “jornalista” que o comanda (que também mostrou o seu baixíssimo nível) precisam responder pelo ocorrido, não só a repórter, que parece ter fechado as portas da profissão para ela própria, ratificando o famoso ditado que diz que a corda só rompe do lado mais fraco.

Feche os olhos e ligue o rádio ou a televisão; igual a aquele você encontrará diversos programas.
 
Nesse processo, surge agora um episódio envolvendo Marcelo Lomba, goleiro do Bahia, e um desses “jornalistas”. De forma completamente irresponsável e covarde, para ficar só por aí, o tal “jornalista” ou “repórter” agride Marcelo Lomba pelo seu twitter.

A vida pessoal dos jogadores não me interessa e tem que ser respeitada. Um ser humano equilibrado, sensato, sem má-fé, entenderá perfeitamente que qualquer pessoa, onde o bom senso recomenda incluir também o jogador de futebol, pode tomar a sua cerveja, whisky, o que for. Um desequilibrado emocional ou alguém que tem outras intenções certamente verá nisso o maior pecado do mundo . O maior pecado do mundo deveria ser fazer programas de rádio/televisão que se aproveitam da condição de pouco discernimento de boa parte da nossa sociedade para manipular as mentes das pessoas.

Além de irresponsabilidade, leviandade e covardia, o “repórter” abre o seu bocão para mostrar toda a sua estupidez. Que queda de produção é essa de que fala esse “repórter”, homem de rádio e televisão (eles gostam de ser chamados assim)? Marcelo Lomba está numa fase excelente. Como diz a torcida, um paredão. Diga-se de passagem, momento mais uma vez ratificado pela imprensa esportiva nacional.

O que fará a diretoria do Bahia? Que providências tomará? Um profissional que, justamente por treinar com dedicação e seriedade, mostra a sua boa forma física. Um profissional do clube, ídolo de uma torcida tão carente de ídolos nos últimos anos, pode ser atingido assim na sua honra sem que nada seja feito?

E o órgão de imprensa, não só o local, mas o nacional, ao qual pertence esse “repórter”, o que fará?

E a torcida do Bahia, o que fará?

(Mais um) Golpe abortado

Lula abortou golpe de Demóstenes contra Dilma

10/6/2012 8:18,  Por Redação, com Vermelho.org – de Goiânia

Fonte – Diário da Manhã: http://www.dm.com.br/#!/texto?id=30281

Correio do Brasil: http://correiodobrasil.com.br/lula-abortou-golpe-de-demostenes-contra-governo-dilma/467057/

Segundo o veículo de comunicação goiano DM, Lula teria abortado um golpe, cuidadosamente articulado pelo senador Demóstenes Torres e o bicheiro Carlinhos Cachoeira, contra o governo da presidenta Dilma Rousseff. Embora o artigo não apresente provas do envolvimento do ex-presidente com a questão, vale a pena lê-lo para conhecer mais dos objetivos do ambicioso senador. Segue abaixo a íntegra do texto.

Lula aborta o golpe

Cai a mais audaz e ambiciosa conspiração política do Brasil

Lula teve visão política para evitar novo golpe da direita

Nos bastidores da Operação Monte Carlo, deflagrada pela Polícia Federal, o senador Demóstenes Torres (ex-DEM) e o empresário de jogos de azar Carlos Augusto de Almeida Ramos, o Carlinhos Cachoeira, gestavam uma estratégia que passou ao largo das investigações: pavimentar a candidatura do parlamentar para o Palácio do Planalto em 2014.

A meta de Demóstenes e Cachoeira era construir uma teia de relações políticas e uma estrutura financeira que viabilizassem a candidatura à sucessão da presidenta Dilma Rousseff. Segundo políticos e interlocutores do senador, o projeto foi a senha para o desencadeamento da operação policial e a entrada do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva nas articulações, com vistas a abortar a estratégia.

Como se viu, a articulação política de Demóstenes e Cachoeira foi marcada por tentativas como, por exemplo, a discussão sobre a troca de partidos, daí as conversas sobre a saída do senador no DEM e o ingresso no PMDB. Na prática, o próprio movimento para a entrada do ex-democrata no ninho peemedebista e, portanto, na base aliada da presidenta Dilma, naufragou quando o PT e o Planalto perceberam a relação de Demóstenes com o contraventor.

O escorregão inesperado no caminho para a rampa do Planalto

A estratégia do senador e Cachoeira, segundo esses mesmos políticos e interlocutores, fica clara em trechos das gravações em que, a despeito de exaltarem suposta proximidade com o governo de Goiás, eles criticam o governador Marconi Perillo e reclamam de planos frustrados para a administração estadual.

“O maior sonho do Demóstenes sempre foi pavimentar a candidatura nacional e subir a rampa do Planalto, por isso ele foi tão longe na defesa da bandeira da ética e encampou tantas propostas polêmicas na área de segurança pública e peitou caciques como (José) Sarney (PMDB-AP) e Renan (Calheiros, PMDB-AL)”, diz um amigo do senador.

O senador goiano foi longe em seu intento. Reeleito senador pelo Estado, o nome de Demóstenes entrou novamente, e com mais força, na bolsa de cotações para uma eventual candidatura de vice na chapa do PSDB ao Planalto. Nos momentos de estremecimento entre tucanos e democratas, o nome do senador goiano era citado até mesmo como alternativa para uma candidatura própria. Daí a profunda mágoa e a rápida reação dos líderes democratas em expulsá-lo do partido quando as denúncias contra ele e Cachoeira vieram à tona.

A princípio, a percepção era de que Demóstenes visava uma candidatura ao governo de Goiás em 2014, apresentando-se como uma alternativa ao PMDB e ao PSDB goianos. Mas o projeto, segundo interlocutores, sempre foi a Presidência da República.

“Demóstenes dizia que, para garantir a candidatura à presidência, ele precisava marcar o debate nacional com um discurso mais elaborado e convincente do que dos seus opositores. Ele encontrou no debate sobre a ética na política a ponte perfeita para encurtar esse caminho até o Planalto”, diz outra fonte, que também preferiu não se identificar. Aliás, segundo esse interlocutor, o projeto de Demóstenes para o Planalto nunca levou a aliança com o PSDB goiano em consideração. Era uma carreira solo entre Demóstenes e Cachoeira.

Na esteira do debate político estava ético, o lastro financeiro era Cachoeira e sua rede de contatos no Estado e no cenário nacional. O empresário de jogos de azar foi o primeiro, segundo interlocutores do senador, a abraçar a proposta e se apresentar como colaborador na área financeira.

“O Cachoeira ficava imaginando os negócios que poderia fechar se tivesse nas mãos a fatura de uma corrida vitoriosa para a Presidência da República”, diz outro interlocutor.

“Nascia ali um PC Farias com muito mais bala na agulha”, comenta a fonte, em referência ao pivô da crise política que levou ao impeachment do então presidente Fernando Collor de Mello.

O cenário favorável no figurino do paladino e no armário da corrupção

O cenário para a consagração de Demóstenes era perfeito. O político surgiu para o Brasil nas asas de uma carreira incontestável no Ministério Público, de onde foi catapultado para a Secretaria de Segurança Pública. Aí, o xerifão mais uma vez ganhou as manchetes da imprensa com a atuação para desvendar o sequestro de Welington Camargo, irmão da dupla sertaneja Zezé e Luciano. A fama de durão e incorruptível pavimentou o caminho para duas eleições consagradoras para o Senado.

Com o discurso de paladino da moralidade na ponta da língua na tribuna do Senado, temperado com frases espirituosas e inteligentes, Demóstenes logo virou o queridinho da imprensa nacional. Não custou muito para ganhar as páginas da Veja como o mosqueteiro da ética. Pilotando este marketing de Catão, surfou fácil nas ondas da maré anticorrupção que inunda o País.

Não poderia ser um nome melhor para enfrentar o petismo atolado até a garganta com denúncias de corrupção, entre elas o mensalão e a demissão de oito ministros do governo Dilma. Demóstenes, sem dúvida, despontava como o Dom Quixote brasileiro que lutava contra os moinhos verdadeiros da corrupção nacional, tendo como fiel escudeiro o empresário Carlinhos Cac
hoeira.

Isso deixou Lula angustiado, pois certamente colocaria fim ao domínio petista no País, que se aproxima de 16 anos e caminha tranquilo para uma hegemonia de 20 anos. O senador goiano poderia ser o homem que dispararia o tiro de misericórdia no lulismo. Lula, porém, teve a competência de enxergar a ameaça e abrir fogo contra o inimigo, agora desmascarado em todo o Brasil, depois de reveladas as estrepolias demostenianas.

A operação era ousada, mas se comprova pela rede montada pela dupla em todo o Brasil que se estendia em todo o tecido dos três poderes. Para isso, não titubearam em mexer e usar todas as peças do tabuleiro, incluindo gente do Executivo, Judiciário e do Legislativo, em todas as esferas.

Tanto é que quando o escândalo explodiu, o Senado solidarizou-se de imediato com Demóstenes. Mas, em seguida, o DEM o expulsou e agora até mesmo o PMDB de Iris Rezende, acostumado a abrigar em suas fileiras políticos com vasto currículo de malfeitos, o rejeitou.

Tudo foi pelos ares, porém, pela astúcia do ex-presidente Lula, que, mesmo abatido pelo câncer, não perdeu o faro e a visão que o tornaram o maior político do Brasil.

E o cenário dos Moinhos de Ventos de La Mancha (da corrupção) terminou com dois Sancho Pança, personificados em Demóstenes Torres e Carlos Cachoeira como as tristes figuras do épico de Cervantes.

Imprensa e democracia

Por Janio de Freitas, na Folha de S. Paulo

Assim como a imprensa pode tirar a Constituição do papel, tira também o papel da Constituição

Já que o ministro Carlos Ayres Britto é do Supremo Tribunal Federal, mas não se sente sob perseguições, e muito menos imagina que queiram "destruí-lo", acredito não haver risco em negar a ideia que faz da imprensa. E nela, sobretudo, da relação entre imprensa e democracia.

O ministro falou no 5º Congresso Brasileiro da Indústria de Comunicação, no qual também esteve o bispo Desmond Tutu. Foi o presidente da Comissão da Verdade e Reconciliação criada na África do Sul, em 1995, por Nelson Mandela.

Espera da nossa Comissão da Verdade que busque "curar as feridas de uma nação traumatizada". A idade não lhe diminuiu a percepção nem a determinação de dizer as palavras adequadas.

Em seu tema, o ministro Ayres Britto não se limitou à esperança. Tem a convicção de que "a metáfora de que a imprensa e a democracia são irmãs siamesas não é exagerada. É, de fato, um vínculo umbilical, a ponto de que, se for cortado esse cordão, é a morte das duas -da imprensa e da democracia".

A relação siamesa entre imprensa e democracia não se ajusta, no entanto, aos 21 anos brasileiros entre 1964 e 1985, por exemplo.

Não só ao decorrer do período, mas também àquilo mesmo que lhe deu origem.

Durante os 21 anos sem nem sequer os seus mínimos componentes da democracia, a imprensa brasileira (vamos englobar assim jornais, TV, revistas e rádio) teve lucros e outros enriquecimentos maiores, muito maiores, do que em qualquer fase anterior na sua história.

A par desse benefício generalizado, quanto mais próximo e a serviço do regime antidemocrático, maior a compensação.

Tanto a proporcionada diretamente ou indiretamente por ligação ao poder, como pela preferência publicitária por meios de comunicação identificados com o regime. Do qual a publicidade foi instrumento fundamental, talvez decisivo.

Mais importante jornal em todos aqueles anos, o "Jornal do Brasil", como principal órgão criador de opinião pró iniciativas do regime ("milagre brasileiro", "Brasil grande", a designação de "terroristas" para os oposicionistas, nem todos armados, e muito mais) proporcionou o exemplo definitivo da ligação ideológica-econômica dos meios de comunicação com a antidemocracia.

Habituara-se tanto aos ganhos estupendos e fáceis com sua posição, que, vinda a democracia, foi rápido para o colapso. Não o único a seguir tal percurso.

"A censura à imprensa teve duração pequena" -é uma afirmação muito repetida sob variadas formas. E inverdadeira.

Todo o período ditatorial foi atravessado por uma modalidade de censura sem evidência pública: o afastamento, impositivo sobre as direções ou proprietários, de jornalistas profissionais.

A base da convicção "siamesa" de Ayres Britto está na ideia de que, "por ser a instância que oferta à população uma alternativa, uma explicação diferente da que o governo dá aos fatos, a imprensa tira a Constituição do papel, vitaliza a Constituição".

Está na história: assim como a imprensa pode tirar a Constituição do papel, tira também o papel da Constituição, na sociedade e no país. A força agitadora para a preparação do golpe de 64 foi a imprensa. Com agitação diuturna.

Todos os demais agentes foram insignificantes em comparação com a imprensa, e dependentes dela. Quando ganharam significação, já a imprensa e o golpismo estavam muito à sua frente, vindo apenas a aproveitar, para a consumação do seu propósito, os múltiplos e estimulantes erros da chamada "esquerda".

A Constituição vigente até 64 foi rasgada, muito antes, pela imprensa. A pregação de Carlos Lacerda, de brilho incomum, afrontava a democracia e, pelas leis de então, como seria pelas atuais, era crime indiscutível contra a Constituição já desde os primeiros anos 50.

E seus seguidores, só por sê-lo, puderam multiplicar a ação agitadora em jornais, TV, rádio e Forças Armadas tão sem incômodo quanto seu líder.

Se há siameses na relação de imprensa e democracia, então são trigêmeas. A imprensa tem, de um lado, a democracia e, de outro, o regime de prepotência. O que vier estará bom. E exceção na imprensa, se houver, não passa de exceção.