O preparo do canal é um ato cirúrgico e como tal gera reação inflamatória. Não existe preparo de canal atraumático. Uma das consequências diretas disso é a formação de edema. Podemos dizer que a depender da intensidade do trauma gerado pelo preparo, o edema pode ser de pequena, média ou grande intensidade e, pelo seu volume, terá ou não espaço adequado para se acomodar nos tecidos periapicais.
1. Como se forma o edema?
Com a agressão, o organismo promove uma série de eventos que funcionam como mecanismos de proteção, como enviar células de defesa para o local. Com isso também passa mais fluido dos vasos para os tecidos (edema).
2. Por que a dor?
A participação do edema é decisiva. Ele provoca a dor porque, sem espaço para se acomodar nos tecidos, fica comprimindo as células nervosas.
3. O que ocorrerá com o edema formado?
Além das reabsorções teciduais que ocorrem para a sua acomodação, ele será drenado (por mecanismos como os vasos linfáticos) e “desaparecerá” do local.
4. Quando desaparecer, o que ocorre?
Passa a dor.
5. E o gelo?
O frio promove contração vascular. Isso diminui a permeabilidade dos vasos e consequentemente a passagem de fluido dos vasos para os tecidos. Diminuindo o edema, diminui a dor.
6. Quer dizer que em alguns casos (dor de pequena intensidade) o paciente pode usar o gelo e não usar aintiinflamatórios?
Pode sim.
7. Qual a vantagem disso?
Essa resposta exige uma atenção maior.
Em grau variável, toda medicação sistêmica apresenta efeitos colaterais. Se é possível manter o pós-operatório de um paciente sem medicação sistêmica, e isso é plenamente possível, é melhor para a saúde dele, e esta é a principal razão. Além disso, representa um custo financeiro menor para ele. Há, porém, uma outra razão de grande importância.
A não prescrição sistemática de medicação sistêmica é uma boa maneira de você acompanhar a qualidade do seu trabalho. Como já disse, não existe preparo de canal atraumático, mas um pós-operatório sem dor sugere que ele induziu um mínimo de injúria aos tecidos periapicais. Ao contrário, dor pós-operatória intensa deve significar agressão maior a esses tecidos. É evidente que entre esses dois “estágios” há diferentes níveis de dor e não simplesmente ausência ou presença dela.
É possível que você não tenha tido exatamente esse tipo de orientação, mas vamos ver uma coisa. Sem dúvida, é muito mais fácil e cômodo ter um paciente medicado; há uma “certeza” de que ele não vai lhe incomodar com as ligações telefônicas que poucos profissionais conhecem como o endodontista: “doutor, o dente ‘tá doendo”. Entendo perfeitamente isso.
Em várias áreas da Medicina, e também da Odontologia, o uso abusivo de medicação sistêmica é aceito como algo absolutamente normal. Em determinados momentos é inteiramente possível atuar sem prescrição sistemática de medicação sistêmica, ou, no mínimo, fazer muito pouco uso dela. Sei que não é assim que se faz, pouco importa. Que é possível é. Posso lhe assegurar que poucas vezes é, de fato, indispensável recorrer à medicação sistêmica para combater a dor pós-operatória. Evidentemente, isso exige uma técnica endodôntica apurada (só se consegue com o tempo), um mínimo de conhecimento científico (não se tem valorizado isso), determinação (algo absolutamente individual) e bom senso.
Quando você consegue determinadas coisas, você, e talvez só você, sabe que se torna um profissional diferenciado, e essa é uma delas. Se os outros percebem ou não é outra história, já que há uma tendência para se viver em função do que os outros pensam. Mas pode ter certeza, nada é mais reconfortante do que quando você sabe.