Faltam muitos is para pôr os pingos

Dúvida''

Por Ronaldo Souza

Refletindo sobre a vida, como tenho hábito de fazer há muitos anos, comecei a rever algumas coisas e percebi como “deixei pra lá” muita coisa.

E me chamou a atenção como “deixei pra lá” muita coisa na Endodontia.

Há nove anos escrevi um texto chamado Pondo os pingos nos is em que esclarecia determinado episódio.

Nessa recente reflexão percebi que tenho muitos is sem pingos.

Fiz então uma pergunta a mim mesmo.

Como deixar passar em branco afirmativas como a que diz que “a nova geração dos localizadores eletrônicos foraminais nos dá uma segurança de 100% na localização do  limite CDC?”

Que prejuízos uma frase dessa pode trazer à comunidade endodôntica, particularmente para aqueles que ainda estão na faculdade ou começando a vida profissional?

O que essa afirmativa reflete, grande desconhecimento, algum interesse inconfesso, ou as duas coisas?

O que deve fazer um professor em horas como essa, “levantar” a mão para questionar e discutir ou calar?

O que significa “levantar” a mão para questionar e discutir?

Pus o “levantar” entre aspas para dizer que, não só com o gesto da mão levantada, possível quando se está presente no momento em que o palestrante diz algo que lhe inquieta, como também manifestar-se quando essa inquietação lhe chega pela internet através de textos ou vídeos, tão na moda.

Entenda-se o “questionar e discutir” não como uma agressão gratuita, mas sim como discussão de ideias e conceitos.

Entretanto, mesmo quando parece estar claro que é somente isso, ou seja, discussão de ideias e conceitos, há sempre a possibilidade de que alguém imagine que você está querendo “derrubar” o palestrante.

Desde que me tornei professor, não consigo lembrar de nenhum momento em que “levantei” a mão. Mesmo quando não havia nenhuma dúvida de que era necessário.

Simplesmente fiquei calado.

O que significa calar nessas horas?

Entre outras coisas, significa perder a oportunidade de trazer para a plateia uma discussão rica, com troca de ideias que provavelmente irão ajudar na compreensão das coisas da Endodontia.

Mas pode significar algo mais também.

“Garanto que provoquei uma reviravolta na cabecinha de vocês. Pensavam que eu ia dizer que a obturação é o fator determinante do sucesso e estou dizendo que não é”.

Lembra que há poucos dias postei um texto, Lavoisier e a Endodontia, em que falei sobre um professor que, na minha terra, “na minha cara”, assumiu a paternidade de uma nova concepção sobre o papel da obturação do canal? (Clique no título do texto acima em azul para ler).

Como pude ficar calado vendo aquele rapaz cometer tamanha desfaçatez?

Fiquei em nome do não “levantar” a mão para que as pessoas presentes não pensassem que eu estava querendo “derrubar” o palestrante.

Em primeiro lugar, ele não podia ser derrubado, pois já estava no chão.

Ainda que os holofotes pareçam resplandecer a imagem de alguém e que boa parte dos membros de uma especialidade não perceba o homem por trás da aparência, a desonestidade científica não permite que alguém se mantenha, de fato, em pé.

Não importa, a minha omissão é imperdoável.

Diante da indignidade, toda omissão é imperdoável.

E o meu não agir não me deixou mais em paz.

Viver em sociedade é se violentar todos os dias.

Entretanto, para tudo há um limite.

E após muita reflexão, tomei uma decisão.

Independentemente de qualquer coisa, os is da Ciência, e aqui estamos falando da Endodontia, não podem mais ficar sem que alguém lhes ponha os pontos.

De uma certa forma, já iniciei esse processo, mas pretendo intensifica-lo.